Colégio Eleitoral confirma eleição de Biden e enterra queixas de Trump
Representantes dos seis estados onde o Presidente dos EUA se queixou de fraude eleitoral confirmaram a vitória de Joe Biden. No mesmo dia, o Supremo Tribunal do Wisconsin, de maioria conservadora, infligiu mais uma derrota a Trump.
As queixas de fraude lançadas pelo Presidente dos EUA, Donald Trump, contra a vitória de Joe Biden na eleição presidencial de 3 de Novembro foram enterradas, esta segunda-feira, na votação do Colégio Eleitoral, uma cerimónia tão antiga como a independência do país mas raramente tão escrutinada como este ano.
Nos seis estados em que Trump centrou uma ofensiva nos tribunais para tentar inverter o resultado das eleições, todos os eleitores do Colégio Eleitoral confirmaram, com os seus votos, que Biden foi o vencedor da eleição presidencial.
E houve até momentos em que não foi possível esconder a felicidade – e até uma sensação de vingança – com que os votos foram anunciados, ao fim de semanas de protestos e ameaças por parte de apoiantes mais extremistas de Trump, em particular no estado do Michigan.
A votação do Colégio Eleitoral é um dos passos mais importantes entre a eleição de 3 de Novembro e a tomada de posse do próximo Presidente dos EUA, marcada para 20 de Janeiro.
É o Colégio Eleitoral, composto por 538 representantes (os grandes eleitores) dos 50 estados norte-americanos mais a capital, Washington D.C., que oficializa os resultados dos votos dos eleitores que foram às urnas no dia 3 de Novembro.
A contagem de todos os votos do Colégio Eleitoral só termina depois das 2h da madrugada de terça-feira (hora em Portugal continental), com a votação no Havai, mas a certeza da vitória de Biden chegou depois das 22h, quando a Califórnia confirmou que os seus 55 votos iam para o candidato do Partido Democrata. A partir dessa altura, Biden contava já com mais do que os 270 votos necessários para que a sua eleição fosse oficializada.
Sem deserções
Mas não era na Califórnia – onde nenhum candidato do Partido Republicano ganha desde 1992 –, nem no Havai – terra natal de Barack Obama e onde o último republicano vitorioso foi Ronald Reagan –, que Trump podia ser bem-sucedido ao apresentar-se como vítima de fraude eleitoral.
Essa estratégia de pôr em causa o sistema eleitoral dos EUA passou por seis estados que foram essenciais para a eleição de Trump em 2016, mas que este ano passaram para a coluna de Biden: Wisconsin, Michigan, Pensilvânia, Georgia, Arizona e Nevada.
Foi nesses estados – e principalmente no Michigan, Pensilvânia e Georgia, onde muitos apoiantes de Trump ainda sonhavam com uma revolta dos grandes eleitores – que Trump mais apostou para evitar ser o primeiro Presidente de um só mandato em 28 anos, e apenas o 6.º em 231 anos de História.
Mas não só a revolta não aconteceu, como os grandes eleitores fizeram uma demonstração de lealdade aos seus candidatos que nem sempre acontece nas eleições presidenciais nos EUA (em 2016, por exemplo, sete eleitores não votaram nos candidatos aos quais prometeram fidelidade). Desta vez, nenhum dos 306 votos com que Biden contava foi para Trump ou para outro qualquer candidato derrotado na eleição de 3 de Novembro.
A ideia de que a vitória ainda podia fugir a Biden já tinha sido desfeita há mais de um mês, quando se tornou evidente que o candidato do Partido Democrata tinha sido o mais votado – e, em alguns casos, por margens confortáveis – nos seis estados que Hillary Clinton perdeu na eleição de 2016.
No Michigan, onde Trump venceu há quatro anos por apenas 10.704 votos, Biden teve este ano mais 154.188 votos; e na Georgia, onde um candidato do Partido Democrata não ganhava desde 1992, Biden teve mais 11.779 votos do que Trump – uma vitória confirmada por quatro vezes desde 3 de Novembro: a contagem inicial, uma auditoria, uma recontagem e a votação desta segunda-feira no Colégio Eleitoral.
"Conseguimos!"
A certeza absoluta de que a eleição não ia escapar a Biden surgiu a meio da votação desta segunda-feira, quando os grandes eleitores de estados como o Michigan, a Georgia e a Pensilvânia se reuniram para anunciar os seus votos. Um a um, os eleitores fizeram o seu juramento e votaram, sem excepção, em Biden para Presidente dos EUA e em Kamala Harris para vice-presidente.
E o mesmo aconteceu no Arizona, no Nevada e no Wisconsin, onde o governador, o democrata Tony Evers, encerrou a sessão com uma manifestação de alívio: “Conseguimos!”, disse o responsável, perante os risos e os aplausos dos grandes eleitores.
Ao lado, no estado do Michigan, onde as autoridades foram alertadas para “ameaças credíveis de violência”, e onde apoiantes de Trump prometeram manifestar-se, armados, durante a chegada dos grandes eleitores, a cerimónia do Colégio Eleitoral começou com demonstrações de diversidade: primeiro, cantou-se o hino dos EUA e a canção “Lift Every Voice and Sing”, conhecida como o “hino negro”; depois, vieram as orações feitas por um reverendo da Igreja Metodista de Detroit e um imã da mesquita de Dearborn Heights.
O único percalço aconteceu precisamente no Michigan, onde um dos grandes eleitores não compareceu à cerimónia, tendo sido substituído por uma suplente. O suspense durou pouco, e acabou quando a nova eleitora surgiu nos ecrãs com uma máscara onde se liam os nomes de Joe Biden e Kamala Harris – também não seria ela a votar contra as expectativas.
Trump insiste
Ao mesmo tempo que o Colégio Eleitoral ia desempenhando as suas funções, o Supremo Tribunal do Wisconsin dava o golpe final nas queixas de fraude apresentadas pelos advogados e apoiantes de Trump. Em nome da maioria, o juiz conservador Brian Hegedorn disse que as queixas do Presidente dos EUA “foram feitas muito depois do fim do último jogo”, referindo-se às acusações dos advogados de Trump contra a forma como vários estados adaptaram as suas regras eleitorais à pandemia – em muitos casos, a votação por correspondência foi estendida a todo o eleitorado, em alterações feitas, no caso da Pensilvânia, há mais de um ano.
Com a derrota garantida na votação do Colégio Eleitoral, o Presidente dos EUA continuou, no Twitter, a fazer acusações de fraude, e não se espera que venha a fazer o que prometeu no dia 26 de Novembro, numa conversa com jornalistas na Casa Branca. Questionado sobre se sairia da Casa Branca se perdesse a votação no Colégio Eleitoral, Trump disse que sim: “Certamente que sim, e vocês sabem isso.”
Agora, resta a Trump e aos seus aliados no Partido Republicano uma última tentativa para inverter a eleição de Biden na sessão conjunta do Congresso dos EUA, a 6 de Janeiro – o dia em que os votos do Colégio Eleitoral vão ser contados e certificados, e que antecede a tomada de posse, marcada para 20 de Janeiro.
Mas essa tentativa também será pouco mais do que uma encenação. Ainda que alguns congressistas do Partido Republicano já tenham prometido que vão contestar os votos de alguns estados, essa contestação só pode ter consequências se forem cumpridas duas exigências da lei: primeiro, que pelo menos um membro da Câmara dos Representantes e um senador apresentem uma queixa por escrito; e depois, que essa queixa seja aprovada na Câmara dos Representantes (onde o Partido Democrata está em maioria) e no Senado (onde se realizam duas eleições decisivas, a 5 de Janeiro, para se determinar quem terá a maioria).