Moradores da Penha temem perder centenas de lugares de estacionamento
Chegada da EMEL a uma parte da freguesia deve acontecer no primeiro trimestre de 2021. Alternativas em execução e em estudo são poucas e desadequadas, defende uma petição. Praça Paiva Couceiro vai ter parque subterrâneo.
A meio da manhã, no pequeno largo entre as ruas Paio Peres Correia e D. Domingos Jardo, já não cabe nem mais um carro. Todos os lugares assinalados estão ocupados, todos os restantes pedaços de asfalto também. Há viaturas nas passadeiras e outras com duas rodas em cima do passeio. Há automóveis a bloquear outros. Os peões têm de ir pelo meio da estrada.
“Este largo está sempre atafulhado de carros”, constata Sandra Campos em jeito de lamento. Continuando pela rua até à Avenida Afonso III, o cenário não muda: onde quer que apareça um espacinho, lá estará um carro para o ocupar.
Como em várias outras zonas de Lisboa, o estacionamento automóvel é um problema crónico nesta parte da freguesia da Penha de França que desce do cemitério do Alto de São João até à linha férrea. Também como outros lisboetas, um grupo de residentes está apreensivo com a anunciada chegada dos parquímetros, pois teme que isso não resolva os problemas actuais e até os venha a piorar.
Sandra Campos é uma dessas pessoas. Quando em Setembro a Câmara de Lisboa lançou a consulta pública sobre as novas zonas de estacionamento para a freguesia, a serem exploradas pela Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa (EMEL), começou a inquietar-se. “Percebi que íamos ficar sem estacionamento nenhum”, recorda. E pouco depois, quando viu serem marcados no chão os recortes dos lugares, confirmou o receio.
Segundo os cálculos feitos por alguns vizinhos que se juntaram para levar estas preocupações à assembleia municipal, o novo esquema de estacionamento poderá originar um défice de cerca de 800 lugares nas ruas Paio Peres Correia, D. Domingos Jardo, Dom Fuas Roupinho, Cruzado Osberno e parte da Av. Afonso III. Já no Bairro Lopes, que confina com a Parada do Alto de São João e onde o estacionamento foi ordenado no ano passado, o défice rondará os 700 lugares, estima este grupo de moradores.
Para estas contas, o grupo contabilizou todos os fogos em prédios sem garagem e usou os parâmetros de estacionamento mínimo que constam no Plano Director Municipal. Em algumas ruas, em função do “enquadramento socio-económico local”, aplicou uma redução de 25% ao número de lugares a que as normas obrigariam.
“Nós não nos queremos substituir à junta nem à câmara, mas temos uma série de engenheiros connosco que percebem do assunto. Por que não fazer isto como deve ser?”, questiona Sandra Campos. Tanto em reuniões com as autarquias como em audições na assembleia municipal, onde uma petição está a ser analisada, o grupo propôs a criação de várias bolsas de estacionamento para residentes em terrenos actualmente vagos, tanto em parques à superfície como em silos. Se todos fossem construídos, cerca de 2100 lugares seriam criados.
Parque subterrâneo na Paiva Couceiro
“Todas as propostas serão devidamente avaliadas”, responde ao PÚBLICO uma fonte oficial do gabinete de Miguel Gaspar, vereador da Mobilidade. Os parquímetros da EMEL deverão começar a funcionar “no primeiro trimestre de 2021” e, até lá, espera-se que fique pronto um novo parque na Rua General Themudo Barata, com 160 lugares. Prometidos estão também um parque na Rua António Gonçalves, “com capacidade para 142 viaturas”, e um parque subterrâneo por baixo da Praça Paiva Couceiro, para 240 a 300 carros.
O problema, replica Sandra Campos, é que a oferta futura será sempre inferior à actual e, além disso, todos os locais onde a câmara quer intervir ficam longe dos sítios onde vão desaparecer lugares. “Ficam a um quilómetro e a 1,5 km, são uns 20 minutos a andar.” Acresce que a zona é declivosa e o esforço é maior.
No ano passado, pouco depois de o PÚBLICO ter contado a história de um casal com duas filhas bebés que não conseguia sair de casa porque os passeios estavam cheios de carros, a Rua Sousa Viterbo e outras do Bairro Lopes passaram a ter estacionamento paralelo, o que desimpediu os passeios, levou à perda de lugares e a um alargamento da via de circulação automóvel. As segundas filas passaram a ser frequentes e as velocidades aumentaram.
Está prevista há vários anos uma obra na Parada do Alto de São João, no âmbito do programa municipal Uma Praça em Cada Bairro, que visa requalificar todo o espaço público e criar mais estacionamento. Depois de uma primeira promessa de que o concurso para a obra avançaria no início de 2020, a câmara garante agora que “o projecto está concluído e em fase de preparação de concurso”. Abandonada ficou a ideia de construir um silo automóvel na Av. Mouzinho de Albuquerque, com ligação à Parada.
A Câmara de Lisboa traçou como objectivo chegar a 2030 com menos um terço de automóveis nas ruas da cidade do que os que existem actualmente. Acomodar os 200 mil automóveis de moradores e os 370 mil que diariamente entram em Lisboa tem sido uma das maiores dores de cabeça para a autarquia, que tem previsto investir 18,5 milhões de euros em novos parques de estacionamento.