Um Fundo de Recuperação a 25?
Toda esta operação à volta do Quadro Financeiro Plurianual e do instrumento “NextGenerationEU” tem sido objeto de uma gigantesca operação de mistificação destinada a esconder os verdadeiros problemas e contradições da União Europeia.
Perante o atual impasse negocial da União Europeia relativamente ao próximo Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021-2027, incluindo o Fundo de Recuperação, António Costa avançou com esta ideia de um plano B, excluindo a Hungria e a Polónia da solução. Este último golpe de teatro revela mais uma vez a enorme hipocrisia das instituições europeias. Com efeito, o grande problema não está no mecanismo do Estado de direito ao qual se opõem aqueles dois Estados-membros. O grande problema está na ausência de soluções consensuais para pagar o empréstimo de 750 mil milhões que a Comissão Europeia pretende realizar para “disfarçar” o egoísmo dos países mais ricos que desistiram há muito de financiar de forma solidária o orçamento da União Europeia. Ainda que este Plano de Recuperação a 25 fosse aprovado, seria depois a vez dos frugais, ou da Holanda e do Luxemburgo, a boicotar qualquer solução de reembolso deste empréstimo que implique mais impostos para as empresas. E, no fim da linha, seremos todos nós a pagar este empréstimo que, de forma enganosa, tem sido anunciado por António Costa como sendo a fundo perdido.
Toda esta operação à volta do QFP e do instrumento “NextGenerationEU” (que inclui o Plano de Recuperação e Resiliência) tem sido objeto de uma gigantesca operação de mistificação destinada a esconder os verdadeiros problemas e contradições da União Europeia. Perante a recusa dos países mãos ricos, ditos frugais, a Comissão Europeia viu-se obrigada a propor a contração de um enorme empréstimo de 750 mil milhões de euros para evitar um orçamento que seria uma vergonha para a União Europeia. Para reembolsar este empréstimo, a Comissão Europeia irá apresentar propostas de criação de novas receitas próprias. Propõe alargar o sistema de quotas de emissões de carbono aos setores aéreo e marítimo. Propõe a aplicação de um mecanismo de ajuste do carbono que taxe a entrada de importações vindas de países onde os padrões ambientais são menos exigentes. Propõe a criação de imposto sobre as grandes empresas digitais e finalmente uma nova tributação das grandes empresas multinacionais que beneficiam das vantagens do mercado único para os seus esquemas de elisão fiscal.
O problema é que grande parte destas propostas tem sido apresentadas há anos. A sua aprovação é tudo menos certa. Todas elas exigem unanimidade no Conselho. Sucede que os países que têm usado o seu poder de veto para evitar a aprovação de propostas visando uma mais justa tributação das empresas e que representariam recursos fundamentais para combater a atual pandemia, são precisamente os mesmos que apontam o dedo à Hungria e à Polónia pelo facto de estes estarem a vetar o orçamento recusando receber lições da União Europeia em matéria de direitos humanos. Vejam-se as atas do conselho relativamente à taxa sobre os gigantes digitais, ou sobre o imposto sobre a massa tributável consolidada das multinacionais, sobre os paraísos fiscais ou ainda sobre tantas e tantas medidas destinadas a combater a fraude e evasão fiscal. Ai se a hipocrisia pagasse imposto...
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico