Velejador francês resgatado após estar quase 12 horas à deriva
O barco de Kevin Escoffier, um dos participantes na regata Vendée Globe, naufragou a sudoeste da Cidade do Cabo, mas o velejador foi salvo por outro participante na competição.
Foram quase 12 horas de angústia e preocupação para os organizadores da Vendée Globe e para amigos e familiares de Kevin Escoffier, mas tudo acabou bem. O velejador francês, de 40 anos, comunicou ao início da tarde de segunda-feira (13h46) que o seu barco estava a meter água e foi forçado a abandonar o PRB, um moderno IMOCA 60, refugiando-se na sua balsa de emergência. Apesar de ser conhecida a sua posição, o vento (superior a 50km/h), o mar (ondas de cinco metros) e o cair da noite tornaram a operação de busca por Escoffier muito complexa, mas à 1h18 da madrugada desta terça-feira, chegou a boa notícia: Jean Le Cam, um dos quatro participantes da Vendée Globe que divergiram para o local do naufrágio, conseguiu resgatar Escoffier.
É uma das competições mais romantizadas do desporto e já deu origem a vários livros e filmes, mas a história da Vendée Globe está repleta de incidentes, dois deles fatais nos anos 90, devido à enorme dificuldade da regata.
Acompanhada com devoção pelos franceses, a Vendée Globe é uma competição que se realiza de quatro em quatro anos desde 1989, com regras simples, mas ao alcance de poucos: com partida e chegada na pequena localidade de Les Sables-d'Olonne, no departamento francês de Vendée, os velejadores têm que dar a volta ao mundo à vela em solitário, sem direito a qualquer paragem ou assistência.
Com inscrições limitadas – os critérios de admissão na regata são muito restritos -, este ano partiram a 8 de Novembro de Les Sables-d'Olonne 33 velejadores, mas, ainda antes de saírem do Oceano Atlântico e entrarem no temido Pacífico Sul, dois dos favoritos já estão fora da luta pela vitória: três dias após a partida, o Charal de Jérémie Beyou embateu num OFNI (objecto flutuante não identificado) ao largo da costa espanhola e foi forçado a regressar a França; depois de reportar vários problemas estruturais, o favorito e sofisticado Hugo Boss de Alex Thomson abandonou a regata e dirige-se neste momento para a África do Sul.
Assim, com Beyou e Thomson fora da luta pela vitória, quatro velejadores (Louis Burton, Thomas Ruyant, Charles Dalin e Kevin Escoffier) estavam em vantagem na aproximação da frota à costa da África do Sul, mas ao início da tarde de segunda-feira chegou a mensagem fez disparar todos os alarmes no quartel-general da Vendée Globe: “Preciso de assistência. Estou a afundar-me. Isto não é uma brincadeira.”
Localizado numa zona remota do Atlântico Sul (quase 1500 quilómetros a sudoeste da Cidade do Cabo), o IMOCA 60 de Kevin Escoffier, que era 3.º classificado ao fim de 22 dias de prova, começou a meter água por motivos que ainda não são conhecidos, forçando o skipper, que participava pela quinta vez na Vendée Globe, a refugiar-se na balsa de emergência.
Após o pedido de socorro de Escoffier, a organização solicitou que Jean Le Cam, o velejador que se encontrava mais próximo de Escoffier, utilizasse o motor do seu veleiro para ir em socorro do francês.
Le Cam, um dos mais experientes velejadores em prova, chegou ao local do naufrágio cerca de três horas depois do pedido de ajuda e conseguiu avistar o bote salva-vidas com Escoffier a bordo, mas com ondas de cinco metros e vento constante superior a 50 km/h, Le Cam acabou por perder o contacto visual com Escoffier.
Com o aproximar da noite e perante condições climatéricas que tornavam a operação de resgate muito complexa - Le Cam tinha que operar o barco sozinho e conseguir ajudar Escoffier a subir -, a organização pediu a ajuda a mais três velejadores (Boris Hermann, Yannick Bestaven e Sébastien Simon), que também foram autorizados a ligar os seus motores e a divergirem para o local do incidente.
No entanto, acabou por ser mesmo Jean Le Cam a resgatar Escoffier. “Enviamos Jean de volta a uma posição recebida pelo CROSS Gris Nez, a posição enviada pelo sinalizador de emergência EPIRB a bordo. A simulação de deriva da Météo France também forneceu um rumo. Jean partiu às 00h15 a nosso pedido para chegar a esse ponto em velocidade reduzida, mas não encontrou ninguém no local informado. Então, retomou para sudeste, com vento de 20-25 nós, sob vela muito reduzida. Depois, desapareceu do ecrã e, de repente, ouvimos falar. Não vimos mais ninguém. Alguns minutos após as 1h06, Jean voltou para a mesa e vimos Kevin [Escoffier] chegar nas suas costas. Todos estão bem”, descreveu, de forma emocionada, Jacques Caraes, director de corrida da Vendée Globe.
Mais tarde, num relato feito à sua equipa de terra, Escoffier contou os momentos de drama que viveu a bordo: “É surreal o que aconteceu. O barco recuou com uma onda quando seguia a 27 nós. Ouvi um estalo e não demorou muito para perceber o que se passava. Em segundos, havia água por toda parte. A popa do barco estava submersa e a proa apontada para o céu. O barco partiu-se em dois… havia um ângulo de 90° entre a popa e a proa. Não tive tempo de fazer nada. Apenas de enviar a mensagem para minha equipa: ‘Estou-me afundando. Isto não é uma piada. Mayday’. Foi extremamente rápido.”
Curiosamente, na Vendée Globe de 2008/09, Jean Le Cam tinha sido resgatado pelo mesmo veleiro (PRB) que agora era tripulado por Escoffier. A 6 de janeiro de 2009, o barco de Le Cam virou na difícil passagem pelo Cabo Horn, no extremo sul da América do Sul, e o salvamento foi efectuado por Vincent Riou, o skipper do barco até 2019, altura em que Escoffier assumiu o leme do PRB.