Profissionais de saúde sofrem estigma por parte de vizinhos

Estudo mostra que profissionais do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra sofreram estigma “por parte dos vizinhos, tendo muitos passado a resguardar-se mais em casa, para evitar olhares inquisidores e sentimentos incómodos”.

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Tiago Petinga/LUSA

Um estudo qualitativo realizado pelo Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) a profissionais de saúde afirma que alguns sentiram estigma por parte de vizinhos, notando ainda que houve profissionais que tiveram de ser medicados para a ansiedade.

O estudo, que resulta de entrevistas a 23 profissionais de saúde do CHUC que estiveram na linha da frente, conclui que estes sentiram “pressão social”, sendo que alguns sofreram estigma “por parte dos vizinhos, tendo muitos passado a resguardar-se mais em casa, para evitar olhares inquisidores e sentimentos incómodos”, afirmou o coordenador do Núcleo de Investigação em Enfermagem (NIE) do hospital, António Marques, citado na nota de imprensa divulgada esta segunda-feira.

O estudo foi conduzido pelo NIE, em parceria com a Unidade de Psicologia Clínica do CHUC e com uma unidade de investigação da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, tendo participado nas entrevistas enfermeiros, médicos e assistentes operacionais.

Segundo o coordenador do NIE, alguns profissionais tiveram de ser medicados “para a ansiedade ou depressão”, referindo que os entrevistados salientaram ainda que a limitação inicial de recursos materiais e de equipamentos “afectou a prestação cuidados, nomeadamente o número de interacções com os doentes”.

De acordo com António Marques, os profissionais salientaram que trabalhar num ambiente de incerteza e de mudança constante “foi gerador de intensas alterações emocionais”, realçando que, depois do medo inicial, o ambiente foi “impregnado de um ‘silêncio de morte'”.

Para além de algum “desespero de não conseguir dar resposta”, os profissionais de saúde referiram também que o uso de todo o equipamento de protecção individual bloqueava uma boa comunicação e uma relação empática e de ajuda para com os doentes.

Os profissionais de saúde entrevistados recordaram que “muitas vezes era preciso gritar” para que os doentes os ouvissem, o que levava “ao esgotamento e a um sentimento de impotência de transmitir afecto pelas palavras”.

“A forma abnegada e articulada como todos os profissionais, dos mais variados serviços do CHUC – clínicos, serviços de apoio e logística, unidade de prevenção e controlo de infecção e gestão do risco – foram fundamentais para dar a melhor resposta aos profissionais da primeira linha”, salienta a enfermeira diretora do CHUC, Áurea Andrade.

De acordo com a responsável, citada também na nota de imprensa do hospital, o estudo frisa ainda “a existência de um sentimento globalmente positivo e de ‘dever cumprido’, contrastando com uma elevada carga emocional, familiar, com mudanças de comportamento (saúde mental) dignos de registo e a merecer ainda a nossa atenção”.