Nas vacinas para a covid-19 temos um pelotão e não um só vencedor – e isso é bom
Deveremos ter várias opções de imunização contra o novo coronavírus, o que pode fazer baixar os preços, e tornar as vacinas mais acessíveis.
Sem se conhecerem sequer as avaliações da eficácia das vacinas – apenas os comunicados de imprensa, que louvam as suas qualidades – mais avançadas, nenhum líder político se atreve a dizer se estaria disposto a abdicar de alguns milhões ou milhares de doses de vacinas para ajudar países mais pobres. Mas neste cenário em que a narrativa dominante tem sido a da guerra e da competição, pode estar a brotar uma folhinha verde de esperança: tudo indica que não haverá um vencedor claro nem um monopólio.
“O nacionalismo das vacinas baseia-se no princípio de que haveria apenas um vencedor e claro que ninguém sabia quem seria, por isso é que governos apostaram em diferentes empresas, para tentar aumentar as hipóteses de terem na sua carteira a vacina vencedora”, diz Els Torreele, do Institute for Innovation and Public Purpose do University College de Londres, formada em bioengenharia e biomedicina mas que faz investigação sobre direitos humanos, inovação e acesso aos medicamentos. É por isso que o Canadá comprou tantas vacinas que poderia imunizar seis vezes a sua população.
“Mas o bom da situação que se está a desenhar é que não há uma única vacina e um monopólio. Isso torna mais provável que as vacinas se venham a tornar mais acessíveis e baratas”, disse Krishna Udayakumar, director adjunto do Centro de Inovação para a Saúde Global da Universidade de Duke, na Carolina do Norte (EUA).
Torreele concorda com esta ideia. “Tivemos imensa sorte, as três primeiras vacinas parecem todas funcionar mais ou menos, induzem imunidade. Provavelmente vamos acabar não com um vencedor, mas com vários. Julgo que nos próximos três meses vamos ter mais umas cinco ou seis vacinas - as chinesas, as russas, provavelmente – e teremos um leque de vencedores. Isto vai mudar um bocado o jogo, porque vamos ter mais vacinas do que antecipávamos, embora não saibamos quão eficazes serão”, sublinha.
Só que, em vez de uma corrida para a vitória, poderá haver um pelotão. “Os países em desenvolvimento poderão, talvez, contar com as vacinas chinesas, talvez alguma das russas – talvez todas estejam mais ou menos acessíveis ao mesmo tempo. É difícil prever, porque há tantas incertezas, mas talvez não haja uma situação de ‘o vencedor fica com tudo’”.