Mike Tyson, 54 anos, pugilista em 2020
“Iron” Mike regressa ao ringue para um combate/exibição com outro cinquentão, Roy Jones Jr.
É um daqueles eventos que capta de imediato a atenção do mundo. Mike Tyson, com 54 anos de idade vai regressar aos ringues, década e meia depois do seu último combate, e frente a um adversário também cinquentão, Roy Jones Jr, que foi igualmente um pugilista de enormes méritos, mas sem a projecção de “Iron” Mike.
É uma proposta irresistível ver se Tyson ainda bate com a mesma velocidade e violência dos seus tempos de glória, reencontrá-lo como um vegetariano fumador de marijuana (em vez de um presidiário aspirador de cocaína), ainda com os músculos bem definidos e a inconfundível tatuagem tribal no lado esquerdo do rosto. Mas há um detalhe nesta história. É que o Tyson vs Jones deste sábado no Staples Center de Los Angeles não será bem um combate. Ou melhor, não será um combate como os outros.
Não se espere muito sangue, lábios inchados ou sobrolhos rebentados. Este é um “combate de exibição” entre dois homens de 50 anos que será suspenso assim que um dos pugilistas tiver um corte na cara, que não terá um painel de juízes a atribuir pontuação em cada assalto (serão três celebridades a designar o vencedor) e este combate não irá entrar no registo oficial de nenhum deles. Não será usada protecção para a cabeça, os pugilistas terão luvas maiores (para minimizar o dano provocado) e os oito assaltos terão dois minutos cada (em vez de três).
Pode haver KOs, mas organizadores não os querem
São estas as regras da Comissão Estadual da Califórnia para autorizar esta exibição. Pode haver “knock-outs”, diz o organismo, mas os pugilistas devem retrair-se de esmurrar o adversário até à inconsciência e encarar isto como um treino mais intenso. “Podem exibir as suas capacidades, mas não quero que se esforcem para causar dano no adversário. Vai ser intenso, mas não quero KOs. Isto não é boxe para decidir um título. É uma exibição entre dois antigos campeões”, diz Andy Foster, director-executivo do organismo que sanciona os combates na Califórnia.
Seja qual for a natureza do combate, este será um reencontro com “Iron” Mike Tyson, o mais novo de sempre a ganhar o título de super-pesados, em 1986, com 20 anos, quatro meses e 22 dias. E isso é o suficiente para que haja muita gente no mundo disposta as pagar 50 dólares (em rigor 49,99, sendo que o preço parece ter baixado nos últimos dias para 19,99 dólares) apenas para o ver de volta ao ringue em “pay-per-view”, à boa maneira dos desportos de combate – os organizadores não divulgaram números, mas dizem que a audiência será superior a qualquer evento de MMA ou de boxe dos últimos cinco anos. Será possível ver o combate em Portugal, desde que se faça a subscrição através do site fite.tv. O evento, que inclui números musicais e outros combates preliminares, começa à 1h da manhã, e o “main evento” está previsto para as 4h.
O que se pode esperar de um combate (perdão, exibição) entre Tyson e Jones, um antigo medalha de prata olímpico (em Seul 1988) que foi campeão em quatro categorias de peso diferentes? Ambos parecem em forma, de facto, e os vídeos de treino de Tyson (que se tornaram virais) mostram que ele ainda sabe dar murros com toda a fúria, tal como fazia nos tempos em que deixava os adversários KO no primeiro assalto. Mas não será o mesmo “Iron” Mike, dizem os especialistas. “Percebo o apelo, mas não se espere grande coisa. Podem treinar o corpo o melhor possível, mas não deixam de ser corpos de 50 anos”, diz Steve Farhood, comentador de boxe, citado pelo New York Times.
Promessa de socos
O interesse desportivo de Tyson vs Jones será, sobretudo, alimentado pela nostalgia e pelo interesse de ver mais um capítulo da história de redenção de Tyson, um homem violento por sua própria admissão, condenado a seis anos de prisão (cumpriu três) por violação, acusado de violência doméstica pela sua primeira mulher, alcoólico e consumidor compulsivo de cocaína. Mas que também é considerado um dos melhores pugilistas de todos os tempos, com um registo de 50 vitórias (44 por KO) e seis derrotas e múltiplos títulos conquistados, numa carreira que terminou em 2005 – e uma dose extra de infâmia por ter arrancado à dentada um pedaço da orelha direita de Evander Holyfield durante um combate em 1997.
Em 2020, Mike Tyson parece ser um homem diferente. Alguém que assumiu uma dieta vegetariana, que tem um espectáculo itinerante em que fala da sua vida, que ganha fortunas a vender produtos feitos à base de cannabis, que entra em filmes como “A Ressaca” (a ouvir Phil Collins em alto volume). Alguém que vai ganhar dez milhões de dólares e que vai doar o prémio as instituições de caridade. “Sei que pareço diferente do homem que era, no que me estou a transformar e no que quero fazer com a minha vida. Nunca quis ser humilde, mas a vida obrigou-me a ser humilde”, são as palavras de Tyson, serenas e, de facto, nada de acordo com o que pensávamos dele. Mas continua com vontade de dar socos e deixa uma promessa para o combate do seu regresso: “Quanto a isso, ninguém vai ficar desiludido. Será que ainda bato com a mesma força? Vamos ver.”