Necessidade de camas de cuidados intensivos para doentes covid pode aumentar 45,5% na próxima semana
Estimativas da ferramenta criada pela Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares estimam, no pior cenário, 700 doentes internados em cuidados intensivos para o dia 27 de Novembro.
Dentro de uma semana Portugal poderá precisar de 700 camas de cuidados intensivos para tratar doentes com covid-19, segundo as estimativas da ferramenta criada pela Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH) para avaliar a necessidade de camas e recursos humanos. A previsão do pior cenário, de dois estimados, para o dia 27 de Novembro faz aproximar as necessidades do máximo de camas de cuidados intensivos que a ministra da Saúde disse existirem para a covid – 704 –, embora salientando que existe uma capacidade de expansão que ultrapassa as 900.
Segundo o relatório da Direcção-Geral da Saúde (DGS) desta sexta-feira, o país tinha internados em unidades cuidados intensivos (UCI) 481 doentes com covid, o número mais alto registado até agora. Pela segunda vez, em poucos dias, em 24 horas entraram mais de duas dezenas de doentes nestas unidades diferenciadas. A estes doentes, juntam-se os internados em enfermaria, dando um total de 3079 pacientes covid hospitalizados.
Se o pior cenário estimado para dia 27 – a previsão tem por base os dados do relatório desta quinta-feira da DGS, aplicando uma redução ou um aumento de 2% do índice de transmissão (R) – se confirmar, as 700 camas de UCI representam um crescimento de 45,5% em relação aos últimos dados da DGS. Já o melhor cenário aponta para a utilização de 481 camas de UCI. Ou seja, uma ocupação semelhante à divulgada esta sexta-feira.
Quanto à necessidade de total de camas (onde se incluem UCI e enfermaria), no pior cenário poderão vir a ser necessárias 4583 camas, um acréscimo de 1,8% em relação ao cenário anterior. Já no melhor cenário, poderão ser precisas 3192 camas, mais 3,1% que na estimativa anterior. O aumento de necessidades mantém-se, mas há uma desaceleração. “Há uma menor dinâmica da pandemia, mas ainda a está crescer. Está em linha com o que foi falado ontem na reunião no Infarmed”, diz o presidente da APAH Alexandre Lourenço, referindo-se à aproximação do R a 1.
No que diz respeito a regiões, as previsões continuam a mostrar um aumento de necessidades de camas em todas elas, à excepção de Lisboa em Vale do Tejo, quando comparado com a previsão anterior. Já no que diz respeito aos recursos humanos, também crescem as necessidades, mas de formas menos acentuada do que na anterior estimativa. Assim, na próxima sexta-feira poderão ser precisos, no pior cenário, entre enfermaria e UCI 1202 médicos, 8421 enfermeiros e 3310 técnicos auxiliares de saúde.
Esforço tem de ser repartido
O presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, que deu parecer técnico a esta ferramenta com dados clínicos e percentagens de doentes a precisar de internamento – cerca de 15% precisa de internamento e destes, 25% em enfermaria, cerca de 60% a precisar de oxigenoterapia e 16% de UCI – , salienta “a semelhança com a realidade” que a ferramenta tem conseguido estimar. No que toca aos novos cenários, João Araújo Correia refere que no melhor cenário “ainda conseguimos funcionar”. Já no pior cenário, “seria francamente complicado”.
O especialista fala numa diferença de doentes da primeira vaga para esta. São agora mais jovens – dados recentes da DGS referiam que cerca de 35% dos doentes internados estavam entre os 40 e os 65 anos –, o que “felizmente fez reduzir a mortalidade, mas a demora média de internamento prolonga-se até à recuperação”. O que significa menor rotatividade de doentes. No caso dos cuidados intensivos, a estadia pode ultrapassar os 20 dias.
“O horizonte máximo de camas de UCI pode ultrapassar as 900, mas isso é tudo. Temos sempre de dar resposta a trauma a cirurgias complicadas. Não podemos chegar a este ponto”, refere João Araújo Correia. “Temos aqui uma base de trabalho que vale a pena seguir, que tem batido com a realidade e que nos leva a pensar que nem todas as regiões têm as mesmas necessidades. Tem de haver uma gestão centralizada destas necessidades, fazendo com que o esforço seja repartido”, defende.
Até porque uma das suas preocupações são os doentes não covid. “Não podemos ter hospitais a suspender toda a actividade programada e outros a fazerem a actividade normal. Isso não é aceitável e cria desigualdade. Exige que haja uma liderança que tem de ser do Ministério da Saúde”, afirma, considerando que “tem de se avançar mais depressa com a acordos com o privado para que não haja um prejuízo maior”.
Também em relação aos recursos humanos, João Araújo Correia considera que é preciso chamar médicos de outras especialidades a apoiar na resposta à covid. “Os intensivistas, internistas e infecciologistas são as especialidades que apanham a esmagadora maioria dos doentes. A resposta nas enfermarias tem de ser mista. Um núcleo que tem de ser de internistas, mas na mesma unidade podem existir cirurgiões, ortopedistas, outras especialidades. O mesmo nas UCI, com recurso a anestesistas. A situação é muito grave, mas tem solução”, diz.