Frente Polisário anuncia “regresso à luta armada” depois de acção militar marroquina no Sara Ocidental

Exército de Marrocos entrou no território disputado para acabar com um protesto do movimento independentista sarauí, que bloqueava uma estrada de acesso à Mauritânia para pedir à ONU que organize o referendo da autodeterminação prometido. “A grande batalha começou”, diz a Frente Polisário.

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Refugiados sarauí assistem a uma parada militar em Tifarati MOHAMED MESSARA/EPA

Uma intervenção militar das Forças Armadas de Marrocos na zona desmilitarizada de Guerguerat, no Sara Ocidental, levou o movimento independentista da Frente Polisário a denunciar a violação de décadas de cessar-fogo no território disputado e a proclamar o início da “guerra de libertação de todo o povo” sarauí.

Soldados marroquinos entraram em Guerguerat na noite de quinta-feira, com a missão de pôr fim ao bloqueio da principal via rodoviária de acesso à Mauritânia e que fazia parte de um protesto da Frente Polisário para exigir às Nações Unidas o cumprimento da promessa de viabilizar a realização de um referendo à autodeterminação do território.

Num comunicado, o grupo sarauí, apoiado pela Argélia – principal rival de Marrocos no Norte de África –, denunciou a “marcha hostil” marroquina na região fronteiriça, disse que foi forçado a “responder ao fogo inimigo para proteger civis e salvaguardar o território sarauí” e anunciou o “regresso à luta armada”. “A grande batalha começou”, proclamou.​

“[A intervenção] não foi ofensiva nem teve uma intenção bélica”, garantiu, no entanto, o Exército marroquino, também em comunicado, afiançando que “continua comprometido” com a acordo de cessar-fogo de 1991.

Ao El País, fontes do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Marrocos reforçaram esta última versão: “Tratou-se de uma operação responsável, na qual o nosso Exército não entrou em contacto com civis. Quisemos apenas assegurar um corredor de segurança para garantir a passagem de bens e pessoas”.

O chefe da diplomacia marroquina, Nasser Bourita, revelou ainda à Reuters que Marrocos está construir uma barreira física para impedir que se bloqueie novamente a estrada que liga o Sara Ocidental ao restante continente africano.

Promessa por cumprir

Encravada entre o Oceano Atlântico, o vasto deserto do Sara e a Mauritânia, e ocupada por Marrocos desde 1975, a antiga colónia espanhola continua à espera que a ONU cumpra o prometido para poder escolher livremente o futuro de autonomia que Rabat lhe nega.

Rico em fosfato e com uma vasta área piscatória, o Sara Ocidental é estrategicamente importante para Marrocos também por causa dos acessos terrestres à Mauritânia, fundamentais para as trocas comerciais com os seus vizinhos.

A Frente Polisário – reconhecida pela ONU como representante legítimo do povo sarauí – ocupava a referida estrada há mais de 20 dias, para chamar atenção da comunidade internacional para o facto de a Missão das Nações Unidas para o Referendo do Sara Ocidental (Minurso), criada em 1991 e acompanhada por um cessar-fogo, estar próxima de terminar o seu mandato e não ter cumprido a sua promessa e objectivo.

O Conselho de Segurança da ONU acabou por renovar o mandato da missão no dia 30 de Outubro, mas o texto da sua resolução não fez qualquer menção à palavra “referendo”. Por isso mesmo, o bloqueio continuou.

Dispersado o protesto nesta sexta-feira, a Frente Polisário decidiu enviar uma carta ao secretário-geral da ONU, António Guterres, exigindo uma “intervenção urgente das Nações Unidas para pôr fim à agressão” de Marrocos contra “o povo e o território” sarauí.

“Ao lançar esta operação militar, o Estado marroquino ocupante comprometeu gravemente não apenas o cessar-fogo e os acordos militares associados, mas também quaisquer possibilidades de alcançarmos uma solução pacífica e duradoura para a questão da descolonização do Sara Ocidental”, lê-se na missiva.

“A operação militar das forças marroquinas contra civis sarauís é um acto de agressão e uma violação flagrante do cessar-fogo, que as Nações Unidas e o Conselho de Segurança devem condenar nos termos mais fortes possíveis”, pede o movimento independentista.

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