A prioridade de Joe Biden vai ser a covid-19, mas como?
Joe Biden vai anunciar esta segunda-feira uma task force para o combate à pandemia. Especialistas antecipam o que poderá acontecer.
A gestão da covid-19 foi o que motivou mais ataques da campanha de Joe Biden à Administração Trump, e a abordagem do Presidente-eleito dos Estados Unidos será radicalmente diferente. Esta segunda-feira, Biden vai anunciar uma task force para lidar com a pandemia, cimentando o lugar prioritário do coronavírus na actuação do seu futuro governo.
A sua acção será radicalmente diferente da feita pela Administração cessante — as afirmações anti-ciência do Presidente Donald Trump, mesmo após ter ele próprio ter contraído a doença, levou a revista Scientific American a dar um inédito apoio a Biden.
Biden vai voltar a trazer peritos para a comunicação da pandemia, mas restaurar os danos criados à credibilidade dos cientistas não será tarefa fácil, alertam especialistas.
Um grupo composto por vários peritos está já a analisar o que será preciso para a rápida distribuição de uma vacina, quando esta existir, e há especialistas que antecipam que os EUA se possam juntar ao programa Covax (em que os países reúnem recursos para poder apostar numa maior diversidade de vacinas, doando ainda uma parte a países que não consigam pagar os custos).
Eric Toner, da Universidade Johns Hopkins, é um desses especialistas, e disse ainda ao jornal USA Today que espera também que os EUA voltem à Organização Mundial de Saúde: “Penso que podem pôr na agenda que os EUA vão voltar a integrar a OMS no dia 21 de Janeiro” — a tomada de posse de Biden é a 20.
Biden disse já que irá manter no cargo Anthony Fauci, o reconhecido especialista em doenças infecciosas que Trump ameaçou despedir algumas vezes. E aguarda-se também um programa de testes rápidos.
O New York Times antecipa que a task force que vai começar a trabalhar já no período da transição seja chefiada por um trio: Vivek Murthy, antigo surgeon general (cargo equivalente ao ministro da Saúde), David Kessler, antigo comissário na FDA (Food and Drug Admnistration, responsável pela aprovação de medicamentos e equipamentos médicos) e Marcella Nunez-Smith, professora na Universidade de Yale.
O anúncio das medidas será feito quando os Estados Unidos estão a quebrar recorde após recorde na doença — no sábado registaram-se mais de 100 mil novos casos pelo quarto dia seguido, e foi ainda o quinto dia seguido com mais de mil mortes. No total, morreram mais de 237 mil pessoas de covid-19 nos Estados Unidos.
No USA Today, especialistas de saúde fizeram cenários sobre que abordagem irá ter Biden. Ezekiel Emanuel, chefe do Departamento de Ética Médica e Política de Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade da Pensilvânia diz que espera que Biden tenha uma abordagem semelhante à que teriam tido presidentes como Franklin Roosevelt ou Lyndon Johnson — “Criar uma enxurrada e um furacão de task forces”. “Ou seja, trazer os peritos e deixá-los atirar-se ao problema”.
Essa não será “a abordagem mais eficaz”, acautelou. “Mas resultará? Absolutamente”, garantiu. “Esses presidentes sabiam como juntar toda a força do governo federal, coordenar-se com a indústria privada onde fosse possível, agarrar as rédeas dos problemas com as próprias mãos onde fosse preciso. É o que tem que se fazer”.
Lori Post, directora do Centro para Política e Economia de Saúde na Faculdade de Medicina da Northwestern University, no Illinois, também cita o exemplo de Roosevelt, mas é mais concreta: espera que Biden siga o modelo que este criou para o controlo da malária, mesmo estando a II Guerra Mundial a decorrer.
A agência, lembra, teve sede na cidade de Atlanta, onde a doença estava a ter um grande impacto. Essa agência foi o embrião do que são hoje os Centros para Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) e foi responsável por pôr os Estados Unidos na vanguarda da informação de saúde pública no mundo.
Outra parte substancial da especulação é sobre um eventual uso obrigatório de máscaras. Uma questão que será mais difícil de abordar agora porque se tornou um tema político, dizem os especialistas.
As medidas da Administração Biden, que só poderão ser tomadas a partir de 20 de Janeiro, vão chegar “numa altura em que infelizmente o vírus já está demasiado incorporado nas comunidades em todo o país”, lamenta Lawrence Gostin, director do Instituto de Direito de Saúde Nacional e Global da Universidade de Georgetown. “E comportamentos seguros já se tornaram demasiado fracturantes politicamente para se conseguir que sejam adoptados em larga escala”.