Estado de emergência entra em vigor na segunda-feira

A declaração do Presidente da República é mais restrita do que a de Março e não prevê confinamento geral, como lhe pediu o primeiro-ministro. Debate e votação na Assembleia da República realizam-se às 16h de sexta-feira. Estado de emergência vigora entre 9 e 23 de Novembro.

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Marcelo vai declarar o estado de emergência pela quarta vez LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

O decreto presidencial do estado de emergência “de âmbito limitado” e “efeitos largamente preventivos”, tal como foi pedido pelo primeiro-ministro na segunda-feira, já teve luz verde do Governo e foi enviado para a Assembleia da República, onde será debatido e aprovado na sexta-feira, em plenário marcado para as 16h. Depois de aprovado, o Presidente da República fará uma declaração ao país a explicar a decisão. O estado de emergência entra em vigor na segunda-feira e vigorará por 15 dias.

Cumprindo o que exige a Constituição, os três órgãos máximos do Estado português vão, por via da declaração do estado de emergência, permitir a restrição de alguns direitos fundamentais. Cabe agora ao Governo definir as medidas necessárias para a contenção da pandemia de covid-19 ao abrigo do decreto presidencial, estando já marcado para sábado um Conselho de Ministros extraordinário com esse objectivo.

“Depois de ouvido o Governo, que o tinha proposto e se pronunciou ao fim da manhã em sentido favorável, o Presidente da República acabou de enviar à Assembleia da República, para autorização desta, o projecto de diploma decretando o estado de emergência por 15 dias, de 9 a 23 de Novembro, permitindo ao Governo tomar certas medidas de combate à pandemia [de] covid-19”,  lê-se em mensagem publicada no site da Presidência.

Os quatro pilares são os que o primeiro-ministro solicitou: “A possibilidade de o Governo impor restrições à circulação em certos locais em períodos determinados, em particular nos municípios de maior risco; a utilização, se necessário e preferencialmente por acordo, de meios de saúde dos sectores privado, social e cooperativo, com a devida compensação; a mobilização de trabalhadores, bem como das Forças Armadas e de Segurança, para o reforço das autoridades de saúde nos inquéritos epidemiológicos e de rastreio; e a possibilidade de medição de temperatura corporal, por meios não invasivos, e de imposição de testes no acesso a certos serviços e equipamentos.”

Na nota justificativa enviada ao Parlamento, Marcelo Rebelo de Sousa escreve que “a evolução da pandemia [de] covid-19, assim como as lições dela retiradas, justifica as garantias reforçadas da segurança jurídica de medidas adoptadas ou a adoptar pelas autoridades competentes para a correspondente prevenção e resposta, em domínios como os da convocação de recursos humanos para rastreio, do controlo do estado de saúde das pessoas, da liberdade de deslocação e da utilização de meios dos sectores privado e social ou cooperativo”.

“Essa garantia reforçada exige a declaração de um estado de emergência de âmbito muito limitado e de efeitos largamente preventivos”, sublinha ainda, deixando claro que esta situação de excepção constitucional se fundamenta “na verificação de uma situação de calamidade pública”.

São quatro as áreas de direitos condicionados ou restringidos por esta proposta presidencial: os direitos à liberdade e de deslocação, o direito à iniciativa privada, social e cooperativa, os direitos dos trabalhadores e o “direito ao livre desenvolvimento da personalidade e vertente negativa do direito à saúde”.

Direito de deslocação restringido

No caso dos direitos à liberdade e de deslocação, prevê-se que “podem ser impostas pelas autoridades públicas competentes as restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, designadamente nos municípios com nível mais elevado de risco, assim como, na medida do estritamente necessário e de forma proporcional, a proibição de circulação na via pública durante determinados períodos do dia ou determinados dias da semana” – ou seja, fica aberta a porta ao recolher obrigatório e também aos confinamentos regionais ou localizados.

Será também possível a proibição das deslocações que não sejam justificadas, ficando previstas desde já várias excepções: “o desempenho de actividades profissionais”, a obtenção de cuidados de saúde ou assistência a terceiros, a frequência de estabelecimentos de ensino, a produção e o abastecimento de bens e serviços.

Estão também previstas “outras razões ponderosas”, cabendo ao Governo “especificar as situações e finalidades em que a liberdade de circulação individual, preferencialmente desacompanhada, se mantém”.

“Justa compensação” para os privados 

O decreto prevê também que “podem ser utilizados pelas autoridades públicas competentes os recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde integrados nos sectores privado, social e cooperativo”. Mas o Presidente determina que isso deve acontecer “preferencialmente por acordo” e “mediante justa compensação, em função do necessário para assegurar o tratamento de doentes com covid-19 ou a manutenção da actividade assistencial relativamente a outras patologias”.

Trata-se, assim, de uma espécie de requisição civil mitigada, pois não atribui ao Governo o poder absoluto de requisitar serviços, nem de determinar o preço a pagar por eles. Vai ao encontro das preocupações das entidades do sector da saúde que o Presidente ouviu nas duas últimas semanas.

Mobilização de trabalhadores

O decreto prevê também que podem ser mobilizados pelas autoridades públicas competentes “quaisquer colaboradores de entidades públicas, privadas, do sector social ou cooperativo, independentemente do respectivo tipo de vínculo ou conteúdo funcional, e mesmo não sendo profissionais de saúde”.

Essa mobilização destina-se em particular a “servidores públicos em isolamento profiláctico ou abrangidos pelo regime excepcional de protecção de imunodeprimidos e doentes crónicos, para apoiar as autoridades e serviços de saúde, nomeadamente na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância activa”.

Controlo de temperatura e rastreio obrigatórios

No quarto nível de direitos restringidos, os direitos de personalidade e de saúde, admite-se que “pode ser imposta a realização de controlos de temperatura corporal, por meios não invasivos, assim como a realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2”.

Esta limitação é aplicável em casos predefinidos: para o “acesso e permanência no local de trabalho ou como condição de acesso a serviços ou instituições públicas, estabelecimentos educativos e espaços comerciais, culturais ou desportivos, na utilização de meios de transporte ou relativamente a pessoas institucionalizadas ou acolhidas em estruturas residenciais, estabelecimentos de saúde, estabelecimentos prisionais ou centros educativos e respectivos trabalhadores”. 

Fica assim garantida a obrigatoriedade de sujeição a testes de vários tipos, incluindo os testes rápidos, que vão começar a ser distribuídos a partir da próxima semana.

O decreto presidencial determina ainda que as Forças Armadas e de segurança irão apoiar as autoridades e serviços de saúde na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância activa. 

Com a declaração do estado de emergência, o Governo perde o poder de determinar, sozinho, as medidas a tomar para combater a pandemia. Todas as medidas que restrinjam direitos, liberdades e garantias devem ser comunicadas ao Parlamento e ao Presidente da República, como também fica claro no decreto.

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