Na ilha Terceira, Rui Caria celebra os “heróis anónimos da pandemia”

Catarina é enfermeira na unidade de obstetrícia do Hospital de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, nos Açores ©Rui Caria
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Catarina é enfermeira na unidade de obstetrícia do Hospital de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, nos Açores ©Rui Caria

Rui Caria, fotógrafo, repórter e editor de imagem correspondente nos Açores para a SIC, acompanha a pandemia "por dentro" a partir de Angra do Heroísmo, na Terceira. Conhece bem a azáfama nos cuidados intensivos do hospital local, o burburinho nas salas de urgência e zonas de infecciologia e observa de perto, desde o início da pandemia na ilha, a acção de outros organismos, como a dos bombeiros, dos laboratórios de referência da região, dos lares de idosos e casas de repouso que albergam os mais vulneráveis. Apontou a objectiva a doentes e cuidadores, mas foram as dos últimos que lhe valeram uma distinção no concurso The Other 100, dedicado aos "heróis anónimos da pandemia".

"[Os cuidadores e profissionais de saúde] sobressaem agora por se posicionarem na linha da frente no combate à pandemia", diz ao P3, por Whatsapp. "Eles pertencem a uma franja menos vista ou mostrada pela imprensa, mas eles sempre lá estiveram e vão estar – mesmo quando o caos der, por fim, lugar à ordem. Nessa altura, voltarão, eventualmente e infelizmente, a ser esquecidos." Com o trabalho que dedicou aos profissionais, Rui Caria deseja contribuir para a criação de "uma nova consciência colectiva" relativamente à sua importância.

As imagens que submeteu a concurso abrangem várias reportagens que realizou em Abril de 2020 para a rubrica Histórias de 28mm. Protagonista de uma dessas histórias é o casal de enfermeiros Catarina e Renato, que trabalham no Hospital de Angra do Heroísmo. Para eles, conciliar a vida profissional com a pessoal é um desafio. Cuidar da filha Alice, de dois anos, e cuidar de pessoas infectadas pela covid-19 obriga ao desdobramento do casal em turnos desfasados. "Mesmo com o receio que tenho agora, por causa dos riscos de contaminação desta nova doença, não me vejo a fazer outra coisa", explicou-lhe Catarina, que trabalha na unidade de obstetrícia do hospital. Mesmo conhecendo os riscos, mesmo estando "assustados" com a pandemia, nem Renato nem Catarina conseguem evitar as demonstrações de afecto para com a filha. Porque a família é importante.

"Os cuidadores, sem saberem, são, em muitos casos a família próxima de quem precisa dos cuidados", explica Caria. "Talvez por isso tenha virado mais a lente para eles numa tentativa de perceber melhor quem são." Essa é uma realidade bastante evidente nos lares de terceira idade, refere, onde o acesso dos familiares é restrito. Foram esses lugares que mais marcaram o repórter. "Aquelas pessoas vivem numa certa realidade paralela, como se fosse uma zona de esquecimento social." Relembra a festa de aniversário de Filomena, que cumpria 97 anos, que também documentou. "Acenava, em lágrimas, aos familiares que estavam do outro lado de um vidro. Uma espécie de ironia da fragilidade humana."

Também distinguido no concurso The Other 100 foi o fotógrafo português radicado em Macau Gonçalo Lobo Pinheiro, que acompanhou o quotidiano da freira e cuidadora Madre Louis Mary Sesu Ratnam durante o período de confinamento na Casa Caritas Santa Maria, que se dedica ao cuidado de cidadãos na terceira idade.

Renato é natural da ilha do Pico, tem 31 anos. Tem, com Catarina, uma filha de dois anos.
Renato é natural da ilha do Pico, tem 31 anos. Tem, com Catarina, uma filha de dois anos. ©Rui Caria
Quotidiano de Catarina no Hospital de Angra do Heroísmo
Quotidiano de Catarina no Hospital de Angra do Heroísmo ©Rui Caria
Alice tem dois anos. Os pais fazem turnos desfasados de 12 horas para poderem cuidar dela.
Alice tem dois anos. Os pais fazem turnos desfasados de 12 horas para poderem cuidar dela. ©Rui Caria
No interior da habitação da família
No interior da habitação da família ©Rui Caria
No interior da habitação da família
No interior da habitação da família ©Rui Caria
No interior da habitação da família
No interior da habitação da família ©Rui Caria
Filomena, de 97 anos, acena aos familiares, que se encontram no exterior do lar sénior onde reside.
Filomena, de 97 anos, acena aos familiares, que se encontram no exterior do lar sénior onde reside. ©Rui Caria
Laura, de 25 anos, trabalha como ajudante familiar domiciliária, há cinco. Joana entrou na equipa do Lar Dom Pedro V, na Praia da Vitória, ilha Terceira, há apenas um ano. Mas diz estar já certa do que quer continuar a fazer.
Laura, de 25 anos, trabalha como ajudante familiar domiciliária, há cinco. Joana entrou na equipa do Lar Dom Pedro V, na Praia da Vitória, ilha Terceira, há apenas um ano. Mas diz estar já certa do que quer continuar a fazer. ©Rui Caria
Todos os dias, Laura Lima e a Joana Rodrigues cuidam de pessoas que precisam de ajuda, na Ilha Terceira
Todos os dias, Laura Lima e a Joana Rodrigues cuidam de pessoas que precisam de ajuda, na Ilha Terceira ©Rui Caria
Laura Lima e Joana Rodrigues dão apoio ao domicílio, na Ilha Terceira.
Laura Lima e Joana Rodrigues dão apoio ao domicílio, na Ilha Terceira. ©Rui Caria