“Este foi o voto mais importante da minha vida”
Após uma campanha crispada, com ameaças de violência a pairar no ar, milhões de americanos votam, ansiosos pela imprevisibilidade de um resultado que pode demorar dias ou semanas até ser conhecido. Trump exige um resultado imediato. Biden responde que os votos vão ser todos contados.
Num ambiente de grande incerteza e ansiedade quanto ao desfecho de uma noite eleitoral que poderá não produzir resultados finais, milhões de norte-americanos aguardam pacientemente nas filas das assembleias de voto, numa demonstração de civismo que contrasta com o tom áspero e de tensão que marcou a campanha eleitoral.
Ao contrário do que se temia, tendo em conta os últimos dias de campanha em que se verificaram episódios de tentativas de intimidação por parte de eleitores de Donald Trump, e as ameaças de que grupos paramilitares de extrema-direita pudessem sair às ruas, as eleições nos Estados Unidos decorrem de forma ordeira, e os americanos escolhem tranquilamente a América que querem nos próximos quatro anos.
Até ao momento, registaram-se apenas alguns incidentes, rapidamente resolvidos. Em Charlotte, na Carolina do Norte, um homem armado, que tinha um boné de apoio ao Presidente Donald Trump, foi detido pela polícia, depois de se recusar a sair das proximidades de uma assembleia de voto. Em Chicago, Illinois, um homem disse que o seu carro foi atacado por um grupo quando foi votar, e num museu em Kansas City, no Missouri, uma parede foi vandalizada com uma mensagem a dizer “não votem”.
Além disso, o FBI abriu uma investigação a um esquema de chamadas e mensagens falsas, que chegaram a pelo menos dez milhões de pessoas, com o objectivo de desencorajar os eleitores de irem voar. “Filas longas, vote amanhã” ou “fique seguro, fique em casa”, foram algumas das mensagens enviadas.
Por precaução, muitos comerciantes optaram por fechar os seus estabelecimentos durante o dia, temendo que após a divulgação dos primeiros resultados começassem motins nas ruas. Em Washington, foram postas placas de madeira nas montras das lojas, e na Casa Branca foram erguidas grades de protecção.
Devido a uma pandemia que já causou mais de 231 mil mortos nos Estados Unidos e que levou a que milhões de pessoas perdessem os seus empregos, mais de 102 milhões de eleitores optaram por votar antecipadamente – presencialmente ou por correspondência –, números históricos que fazem antever a maior afluência às urnas desde 1908, prova da importância daquela que é considerada a eleição mais importante do século.
“Tenho 70 anos e, para mim, este foi o voto mais importante da minha vida”, disse ao The Washington Post Susan Kaplan, residente em Tucson, no Arizona, um dos estados decisivos nestas eleições. “Senti que estava a fazer a diferença quando votei por correspondência”, acrescentou.
Milhões de votos por correspondência começaram a ser contados nesta terça-feira, dia das eleições, e outros tantos só chegarão daqui a uns dias, um tema que promete agitar os próximos dias, enquanto se aguardam os resultados definitivos.
Para aumentar ainda mais a incerteza, a principal agência de correios norte-americana, a USPS, disse que não conseguiu fazer uma última ronda por várias estações nos swing states, como a Florida, Pensilvânia ou Wisconsin, o que fazer com que milhares de boletins de votos não sejam processados e enviados a tempo para as secções de voto.
Muitos eleitores, no entanto, decidiram deslocar-se às assembleias de voto, com filas mais pequenas do que o habitual quando comparado com eleições anteriores.
“Deixei passar a oportunidade de votar por correspondência, mas não vou perder a oportunidade de votar”, disse à Reuters, Ginnie House, actriz e estudante de 22, que voou de propósito de Nova Iorque para Atlanta, na Georgia, para votar em Joe Biden, por Trump “estar a dividir o país”.
Na Pensilvânia, 0 estado em que todas as atenções estão centradas, mais de 2,5 milhões de votos por correspondência chegaram às assembleias de voto durante a manhã, e durante o dia foram constantes as filas para votar, reflexo do entusiasmo dos eleitores do estado que pode decidir estas eleições.
Antes de se recolher na sua casa no estado Delaware, onde vai acompanhar a noite eleitoral, Joe Biden passou por Scranton e por Filadélfia, na Pensilvânia, e reforçou a ideia de que é preciso esperar pelos resultados finais para tirar conclusões, garantindo que, no final, “não haverá estados azuis ou vermelhos, só haverá Estados Unidos da América”.
Já Donald Trump, numa passagem pela Virgínia, voltou a insistir na tese de que o vencedor deveria ser anunciado na noite das eleições, repetindo que os norte-americanos não devem ficar dias à espera que os votos por correspondência sejam contados.
O Presidente chegou mesmo a atacar o Supremo Tribunal dos EUA, que decidiu em Outubro que os votos por correspondência que cheguem à Pensilvânia devem ser contados até à próxima sexta-feira, afirmando que está em causa “uma decisão muito perigosa para o país”, insinuando que esta pode “induzir violência nas ruas”.
“Os Presidentes não decidem que votos são contados e que votos não são contados. Os eleitores determinam quem é o Presidente”, respondeu Biden. “Não interessa o que ele faça ou o que diga, os votos vão ser contados”, assegurou Joe Biden.