Vice-presidente do Chega-Açores demite-se em rota de colisão com Ventura

Orlando Lima acusa o líder nacional do partido de ter descurado “os interesses dos açorianos” na noite das eleições, ao negar acordo com o PSD, com uma “postura centralista”.

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André Ventura LUSA/ANTÓNIO COTRIM

O vice-presidente do Chega-Açores, Orlando Lima, demitiu-se nesta segunda-feira do cargo, por considerar que o líder nacional do partido, André Ventura, descurou “os interesses dos açorianos” na noite das eleições regionais e assumiu uma “postura centralista”.

O também cabeça de lista do Chega pela ilha Terceira nas eleições de 25 de Outubro revelou na sua página do Facebook que enviou uma carta ao líder regional do partido, Carlos Furtado, lembrando que recomendou que na noite eleitoral André Ventura “fosse afastado da comunicação social”, devendo ser o presidente regional a assumir a comunicação à imprensa.

“Por ser esta a sua e nossa vitória e por ser seu dever e responsabilidade conduzir o Chega regional pelo difícil mas desafiante caminho de assegurar, mediante cuidada negociação com os parceiros políticos à direita, uma alternativa de governação”, sublinha o dirigente demissionário, numa carta na qual explica os vários motivos da sua demissão.

Orlando Lima considera que “este era um cenário político previsto, sobre o qual o presidente regional, Carlos Furtado, já se havia manifestado ao eleitorado, que já tinha sido discutido pela sua direcção”.

Na altura, o dirigente diz que defendeu a “não-participação em soluções governativas como por ele [Carlos Furtado] inicialmente apontado, mas sim de incidência parlamentar”.

“Esta foi uma promessa eleitoral e uma solicitação diária do nosso eleitorado. O PS, na governação com os 300 milhões da Europa, faz uma festa, deixa-nos a todos na miséria, mas compra votos para mais oito anos. Negar uma alternativa de direita na governação regional será traição. Este seria o papel de outro, nunca do Chega”, declara o dirigente.

Para Orlando Lima, André Ventura fez um “eloquente discurso de vitória, assumiu uma lamentável postura centralista e, descurando os interesses dos açorianos, extrapolou as decisões que deveriam ser locais, para a defesa infantil de interesses dos ‘cheganos’ nacionais, que, por muito legítimos e necessários que o sejam, o povo açoriano não tem para com eles a mais pequena identificação”.

“A governação açoriana faz-se para a defesa do povo açoriano, não para resolver as questiúnculas dos senhores de Lisboa nem para ganhar uns pontos junto do eleitorado continental. Tal significa para mim uma atitude no mínimo centralista que em nada dignifica o imperioso respeito pelo povo açoriano e pela autonomia da Região Autónoma dos Açores”, declarou.

Na noite eleitoral, André Ventura rejeitou qualquer acordo de coligação que permita à direita governar os Açores e acusou o PSD de se ter afastado do Chega.

Na carta dirigida ao líder regional do Chega, Orlando Lima refere, por outro lado, que os “critérios de selecção dos elementos constantes da lista de compensação” foram, apesar da sua contestação interna, “o de um clube de amigos, não de um partido político, com responsabilidade de correcção e equidade perante o seu eleitorado”.

O critério que recomendou o demissionário do Chega-Açores “foi o de o cabeça de lista de São Miguel ser o primeiro da compensação, o cabeça de lista da Terceira ser segundo da compensação e sucessivamente, tendo por base a representatividade eleitoral de cada uma das ilhas”.

Segundo o vice-presidente demissionário, o deputado eleito, José Pacheco, “não foi votado nem eleito por ninguém, a não ser pela direcção regional do partido, que anuiu a seu favor”.

O conselho regional dos Açores do PSD mandatou no sábado o presidente do partido na região, José Manuel Bolieiro, para “negociar” com o CDS-PP e o PPM, indicou fonte da estrutura social-democrata açoriana.

Mesmo sem concretizar o teor das negociações, é sabido que o PSD está à procura de parceiros para constituir um governo na região, apesar de o PS ter vencido – em minoria relativa – o sufrágio de dia 25.

O PS venceu as eleições regionais nos Açores, elegendo 25 dos 57 deputados da Assembleia Legislativa Regional, mas um bloco de direita, numa eventual aliança (no executivo ou com acordos parlamentares) entre PSD, CDS-PP, Chega, PPM e Iniciativa Liberal poderá funcionar como alternativa de governação na região, visto que uma junção de todos os parlamentares eleitos por estes partidos dar 29 deputados (o necessário para a maioria absoluta).

O PAN, que também elegeu um deputado, pode também viabilizar parlamentarmente um eventual governo mais à direita.

Diversas fontes contactadas pela Lusa reconhecem a existência de conversações entre o PSD e outros partidos com vista a uma eventual viabilização de um executivo de direita.

A lei indica que o representante da República nomeará o novo presidente do governo regional, “ouvidos os partidos políticos” representados no novo parlamento açoriano.

Segundo indicação dada à Lusa por fonte do gabinete do representante da República, Pedro Catarino só poderá ouvir os representantes dos partidos políticos eleitos no domingo, uma vez publicados os resultados oficiais em Diário da República, o que ainda poderá demorar alguns dias.

Depois da tomada de posse do próximo Governo dos Açores, haverá um prazo máximo de dez dias para o programa do executivo ser entregue à assembleia legislativa.