Covid-19: Santo António no Porto está quase a esgotar capacidade de cuidados intensivos
Director clínico do hospital do Porto diz que unidade pode ir até às 34 camas de cuidados intensivos mas que isso implica sacrificar blocos operatórios. Primeiro-ministro sublinha, porém, que o médico o “tranquilizou”, ao garantir que a capacidade de internamento pode ser alargada.
O Hospital de Santo António, no Porto, esgotou a capacidade de internamento em cuidados intensivos para doentes com covid-19 destinada inicialmente para estes pacientes em estado grave mas está já a preparar a abertura de outras camas, apesar de isso implicar “sacrifício” de blocos operatórios, revelou o director clínico, José Barros.
A nível nacional, adiantou o primeiro-ministro na conferência de imprensa no final do Conselho de Ministros extraordinário, há actualmente 356 camas de cuidados intensivos, das quais 286 estavam ocupadas na sexta-feira, mais já do que na primeira vaga da epidemia. António Costa acrescentou que este número pode ser alargado até um total de 505 camas de cuidados intensivos e sublinhou que contactou o director clínico do hospital do Santo António e que este “o tranquilizou”, garantindo que é possível aumentar a capacidade de internamento para doentes em estado crítico.
José Barros tinha dito à Lusa que é nos cuidados intensivos que se faz sentir a maior pressão no Centro Hospitalar Universitário do Porto (CHUP), a que pertence o Santo António. “Já esgotamos a nossa capacidade. Temos 28 camas [dedicadas à covid-19] e 24 para não covid que temos de manter. Nessas não tocamos. Para covid podemos ir às 32, mas isto já é com sacrifício de um bloco operatório”.
No total, segundo precisou mais tarde ao PÚBLICO, o CHUP dispõe actualmente de 34 camas de cuidados intensivos para doentes com covid - dez numa unidade polivalente que funcionou como unidade de cuidados intensivos na primeira vaga mas que ultimamente era usada como bloco operatório de oftalmologia e otorrinolaringologia, especialidades que “transferiram as marcações para ambulatório”. Esta unidade voltou agora a receber doentes em estado grave e tinha aí internados este sábado dois pacientes, mas possui oito vagas. No total, o centro hospitalar tinha 26 doentes em cuidados intensivos, alguns dos quais foram transferidos de outros hospitais, explicou José Barros.
Entretanto, na quarta-feira começou a ser montada no exterior uma estrutura modular para 36 camas de enfermaria destinadas a doentes não covid, com ar condicionado e casas-de-banho. A estrutura já estava prevista antes da pandemia para dar apoio ao serviço de urgência que ia entrar em obras e abrirá quando for necessário. Neste sábado, estavam internadas com covid-19 em enfermarias 115 pessoas, incluindo três crianças no Centro Materno Infantil do Norte, unidade que faz parte do CHUP.
Na região Norte, o centro hospitalar mais pressionado continua a ser o do Tâmega e Sousa (Penafiel e Amarante), que já teve que transferir doentes com covid-19 para outros hospitais públicos (como o de Braga, Viana do Castelo e Vila Real) e pacientes com outras patologias para o Hospital Escola Fernando Pessoa (20) e para o Hospital Militar do Porto (10), segundo adiantou a assessoria da Administração Regional de Saúde do Norte. Além deste centro hospitalar, estão também sob pressão o Centro Hospitalar do Médio Ave (Famalicão e Santo Tirso) e o Hospital de Guimarães, disse.
O Centro Hospitalar São João indicou que continua no nível 3, o penúltimo do plano de contingência, tem cerca de três dezenas de doentes com covid-19 em unidades de cuidados intensivos, mas possui ainda uma “significativa” capacidade para receber pacientes (na primeira vaga chegou a ter 60 nestas unidades de elevada complexidade).
"Progressão rápida"
Quanto à situação no Hospital de Santo António, José Barros admitiu à Lusa que “é preocupante”, uma vez que se está a assistir a “uma progressão rápida” dos internamentos. "Todos os dias temos mais doentes do que no dia anterior e a nossa angústia é não sabermos onde isto vai parar. Estamos muito perto de atingir a capacidade [máxima em enfermaria]”, disse José Barros à Lusa. Com a “reconfiguração de espaços”, a capacidade de internamento em enfermarias poderá “chegar a 125 [camas] este fim-de-semana e a 163 segunda ou terça-feira”, precisou.
Especialidades como infecciologia, pneumologia, medicina interna, gastroenterologia e cirurgia geral “já tiveram de sacrificar camas”, mas o médico sublinhou que “os hospitais não estão apenas a cuidar [de doentes com] covid”. “Às vezes passa a ideia de que os hospitais só estão dedicados à covid. Isso não é verdade. Os cirurgiões estão disponíveis. Mas podemos não ter anestesistas. E os blocos operatórios podem estar convertidos em unidades de cuidados intensivos. Isso é que limita a actividade cirúrgica”, explicou.
O director clínico alertou ainda que “o perfil de doente que o hospital está agora a receber é diferente [face à primeira vaga]”, dado que antes foram internados doentes “praticamente assintomáticos” e “agora só são internados doentes com insuficiência respiratória”. “O número de doentes é agora muito maior. Se fossemos a internar com os critérios da primeira vaga, teríamos centenas internados”, sublinhou, aproveitando para “desmistificar algumas mensagens que podem estar a criar confusões”.
“Ao contrário do que se diz, temos [internados] de todas as faixas etárias. Admito que se possam encontrar mais jovens porque se testa mais (...). Nesta segunda vaga, neste hospital, a mortalidade é inferior à que foi na primeira. E os doentes têm alta mais rapidamente também porque os critérios de alta foram aligeirados”, observou.
De igual forma, acrescentou, o “serviço de urgência está reconfigurado de uma forma que nunca esteve antes”, o que “gasta muitos mais recursos”. Em causa está a existência de três áreas: para admissões de doentes com teste positivo à covid-19, área respiratória ala para doentes não covid ou que não têm sintomatologia respiratória. “Portanto, um especialista que antes se movimentava em todas as áreas e dava uma opinião aqui e outra ali, agora não pode. Para o fazer tem de equipar, desequipar. Obriga a mais pessoas e mais recursos”, descreveu.