Provedora de Justiça censura abusos nas execuções da Segurança Social
Inspecções detectaram graves “atropelos” aos direitos dos cidadãos por falta de funcionários e de meios e por processos mal estruturados. Ou se investe na correcção ou as execuções devem voltar ao fisco, avisa Lúcia Amaral.
As execuções fiscais a cargo das Secções de Processo Executivo (SPE) da Segurança Social estão recheadas de abusos que lesam os direitos dos cidadãos, afirma a Provedora de Justiça, após uma inspecção que detectou diversos casos de “práticas lesivas”.
Visitas a metade das 22 SPE no país e inquéritos a todas permitiram detectar os abusos que, segundo a provedora, têm justificado um número crescente de queixas. Como não tem havido resposta atempada, Lúcia Amaral deixa uma série de recomendações e ainda um alerta: ou há um real investimento em meios humanos e físicos e na melhoria do atendimento e dos processos ou o melhor é fazer regressar esta incumbência às mãos da Autoridade Tributária, segundo o modelo que vigorou até 2001.
A lista de problemas é numerosa. A fiscalização encontrou "situações de cobrança de dívida inexistente, de penhoras de contas bancárias acima do valor legalmente permitido, de demora injustificada na restituição de valores indevidamente cobrados ou ainda de não notificação atempada e correcta dos prazos de pagamento das dívidas”, lê-se na síntese do relatório de mais de 200 páginas, divulgado esta quarta-feira, 28 de Outubro.
“São exemplos de práticas que ferem particularmente os direitos dos cidadãos e que em muitos casos agravam as situações de precariedade dos agregados familiares dos executados”, salienta. “O mínimo”, diz a provedora, que se esperaria de um “Estado social” que paga pensões com base em contribuições da população activa e com um sistema que enfrenta “risco de colapso”, seria “acautelar a eficiência da cobrança" para que esta “seja optimizada tanto quanto possível”.
Porém, a realidade encontrada com estas fiscalizações feitas em 2019 é bem diferente. “Com perplexidade, constata-se a exiguidade de investimentos em recursos humanos (...) e em sistemas informáticos onde os prejuízos tanto abrangem a sustentabilidade das prestações sociais, em geral, como os direitos e garantias dos executados, objecto de sistemático (e até institucionalizado) atropelo, no que, afinal, também deveria ser um Estado de Direito”, anota o documento disponibilizado online.
“A dimensão da realidade que carece de melhoria é de tal ordem que apenas duas alternativas parecem viáveis”, conclui a provedora: “ou se retoma o sistema que vigorou até 2001, previamente à criação das SPE, voltando-se a atribuir à AT competência para a cobrança coerciva de dívidas à SS"; ou se investe intensivamente na criação de condições" para “uma cobrança eficiente e consentânea com os direitos dos cidadãos”.
As inspecções identificaram problemas no atendimento ao público, no sistema informático e nas condições de trabalho. E na lista de recomendações há variadas sugestões de melhoria da gestão dos processos.