França quer plataformas de streaming a investirem até 25% dos seus proveitos em cinema e audiovisual
Ministra francesa da Cultura afirma que a aplicação desta medida pode ser “tão revolucionária e estrutural” para o cinema e audiovisual como o foi, no seu sector, a lei do livro nos anos 80.
As plataformas de streaming terão de investir entre 20% e 25% dos proveitos que têm em França na criação de cinema e audiovisual francês ou europeu, afirmou esta quarta-feira a ministra francesa da Cultura, Roselyne Bachelot.
Em entrevista ao diário económico Les Échos, a ministra considera que a aplicação desta medida a empresas como a Netflix, a HBO, a Amazon Prime ou a Disney + pode ser “tão revolucionária e estrutural” para o cinema e audiovisual, como o foi, no seu sector, a lei do livro em França, na década de 1980.
A medida a que Roselyne Bachelot se refere diz respeito à proposta legislativa de transposição para a lei francesa de uma directiva europeia de 2018, que actualiza e harmoniza legislação sobre serviços de audiovisual entre os Estados-membros da União Europeia.
Segundo a ministra, em troca daquela percentagem de obrigação de investimento, as plataformas de streaming – designadas como “operadores de serviço audiovisual a pedido” ou “video on demand" – poderão beneficiar de um regime mais flexível do prazo de exibição de filmes estreados anteriormente em sala, actualmente fixado em 36 meses.
O governo francês tem o anteprojecto do decreto com estas medidas em consulta até 10 de Novembro. O processo, que estava em curso desde 2019, foi atrasado por causa da pandemia, refere a imprensa francesa.
“Se não houver um acordo, o Estado assumirá as suas responsabilidades. Queremos que haja um tratamento justo entre as plataformas e as cadeias de televisão tradicionais”, afirmou a ministra, prevendo a aplicação das medidas a partir do verão de 2021.
Enquanto a França está ainda em negociações, o parlamento português aprovou na semana passada a legislação que transpõe a mesma directiva europeia sobre o audiovisual e que causou polémica entre representantes do sector precisamente por causa do tipo de participação que aquelas plataformas devem ter no investimento em cinema e audiovisual, e ainda pelo tempo de negociação e de discussão pública sobre a matéria.
A legislação aprovada na semana passada é abrangente em matéria de audiovisual, mas no que toca especificamente às plataformas de streaming não há ainda qualquer percentagem definida sobre obrigações mínimas de investimento no sector, tal como a França defende.
O que o texto final da lei afirma é que aqueles operadores “destinam obrigatoriamente uma parte das suas despesas de investimento, nos termos previstos na presente lei e nos diplomas que a regulamentam, ao desenvolvimento, produção e promoção de obras europeias e em língua portuguesa, bem como de obras de produção independente”.
“A obrigação de investimento é exercida com total liberdade de escolha” e os montantes a investir “são definidos em função dos proveitos relevantes desses operadores”. E caso não seja possível apurar o valor desses proveitos relevantes, é fixado um valor anual de quatro milhões de euros de investimento.
Para estes operadores, plataformas de streaming, a legislação portuguesa inclui ainda uma nova taxa, de 1% do montante dos proveitos relevantes, que reverte para o orçamento do Instituto do Cinema e Audiovisual. Se também aqui não for possível saber o montante dos proveitos relevantes, fixa-se a cobrança dessa taxa em um milhão de euros anual.
É ainda definido que os catálogos dos serviços audiovisuais a pedido devem ter “uma quota mínima de 30% de obras europeias” e pelo menos metade dessa percentagem deve ser de “obras criativas de produção independente, europeias, originariamente em língua portuguesa, e produzidas há menos de cinco anos”.
Em Portugal, existem já vários operadores daquela tipologia, como a Netflix, a HBO, a Disney +, a Mubi ou a Filmin.
Em Novembro, a estação de televisão SIC também lançará o seu próprio serviço de streaming, intitulado Opto.
A Marktest divulgou em Abril um barómetro sobre consumos que indicava que “mais de dois milhões de portugueses subscrevem plataformas de conteúdos de entretenimento em streaming”.