Candidato escolhido por Morales vence eleições presidenciais na Bolívia

Luis Arce alcançou uma vitória assinalável ao garantir a eleição logo à primeira volta, de acordo com as projecções. Presidente interina e principal candidato da oposição saudaram o vencedor. Evo Morales congratulou-se com a vitória, mas desvalorizou “rumores” sobre o seu regresso à Bolívia.

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Luis Arce, no centro, festeja a divulgação das projecções que lhe atribuem a vitória UESLEI MARCELINO/Reuters

O candidato do Movimento para o Socialismo (MAS), Luis Arce, conseguiu ser eleito Presidente da Bolívia à primeira volta nas eleições deste domingo, de acordo com as projecções. A esquerda regressa ao poder quase um ano depois da demissão forçada do ex-Presidente Evo Morales e de um período de enorme instabilidade política e social.

Arce, um economista e ex-ministro escolhido por Morales, conseguiu mais de 53% dos votos, os mesmos que Morales obteve quando foi eleito pela primeira vez, em 2005, ficando a uma distância muito confortável de 20 pontos acima do seu principal adversário, o conservador Carlos Mesa. A vitória de Arce supera as expectativas até do próprio partido. As sondagens mostravam, nas últimas semanas, uma subida das intenções de voto em Mesa, que obrigaria a uma segunda volta.

Os resultados oficiais apenas serão conhecidos dentro de alguns dias, de acordo com o El País, mas a solidez da vantagem de Arce evidenciada pelas projecções tornam bastante improvável outro desfecho que não a vitória do candidato do MAS. De acordo com as projecções, Carlos Mesa não deverá passar dos 30% dos votos, enquanto Luis Fernando Camacho, candidato da direita radical, deve ficar-se pelos 14%.

O período de contagem dos votos está a ser escrutinado de perto. Nas eleições do ano passado, a detecção de uma alegada fraude eleitoral para beneficiar Morales desencadeou fortes protestos que culminaram com o afastamento do Presidente.

 

Num sinal de que, desta vez, há uma tentativa clara para desanuviar o ambiente político, a Presidente interina, Jeanine Añez, saudou a vitória de Arce. “Felicito os vencedores e peço-lhes que governem a pensar na Bolívia e na democracia”, afirmou Añez, que chegou a apresentar uma candidatura presidencial, mas acabou por recuar.

A primeira reacção de Arce também apontou no sentido da pacificação do país, prometendo um “Governo de unidade nacional”. “Vamos trabalhar e reconduzir o nosso processo de mudança, sem ódio, aprendendo e superando os nossos erros como Movimento para o Socialismo”, declarou o Presidente eleito. “Recuperámos a democracia e recuperámos a esperança. O nosso compromisso é trabalhar e levar adiante o nosso programa. Vamos construir um Governo de unidade nacional, vamos construir a unidade deste país”, prometeu Arce.

Em La Paz, reporta o The Guardian, houve fogo-de-artifício para celebrar a vitória do candidato do MAS, apesar de uma porta-voz do partido apelar aos apoiantes de Arce para terem calma e aguardarem pelos resultados oficiais. “Sabemos que as expectativas são elevadas, mas devemos cumprir as regras para celebrarmos devidamente”, disse Marianela Paco.

Carlos Mesa, o principal adversário de Arce, reconheceu a derrota. “O resultado da contagem rápida é bastante forte e claro”, disse Mesa, em conferência de imprensa. “A diferença entre o primeiro classificado e a Comunidade Cidadã é grande e cabe-nos a nós, que acreditamos na democracia, reconhecer que houve um vencedor nestas eleições”, reiterou.​

Numa mensagem publicado no Twitter, em que agradeceu aos seus apoiantes, Mesa garantiu que vai “honrar a Bolívia” e prometeu fazer oposição ao MAS. 

Regresso de Morales?

A partir de Buenos Aires, onde está exilado, Morales saudou a vitória do MAS, embora tenha manifestado desconfiança por causa da demora na publicação das projecções – as empresas justificaram com dificuldades técnicas em apresentar resultados sólidos. “A Bolívia irá regressar ao caminho da estabilidade económica, política e social”, afirmou o homem que governou a Bolívia durante 13 anos. 

“A Bolívia é um exemplo para o mundo. Muito em breve, o nosso país vai começar uma fase de enormes desafios. Devemos pôr de lado as diferenças e os interesses sectoriais e regionais para alcançarmos um grande acordo nacional”, defendeu Morales, citado pelo Washington Post.

Uma das principais interrogações é o eventual regresso de Morales à Bolívia, caso se confirme o regresso do MAS ao poder. O ex-Presidente desvalorizou o que disse serem “rumores” sobre o seu futuro e afirmou que “a prioridade é exclusivamente a recuperação da democracia”.

A vitória de Arce e do MAS foi celebrada na Venezuela, com o Presidente Nicolás Maduro a realçar uma “grande vitória”. “Unido e consciente, o povo boliviano usou os votos para derrubar o golpe levado a cabo contra o nosso irmão Evo [Morales]”, escreveu Maduro no Twitter.

A Organização de Estados Americanos (OEA), que teve uma missão de observadores eleitorais no terreno, deixou um apelo à população e aos actores políticos para que “aguardem com paciência” a divulgação dos resultados oficiais. “Os próximos dias serão cruciais para o futuro da Bolívia e todos devem estar à altura deste momento histórico”, acrescentou a organização.

As conclusões da OEA são aguardadas com grande expectativa. Foi esta organização que divulgou um controverso estudo que confirmou as suspeitas de fraude na contagem dos votos nas eleições de 2019 – posteriormente, um grande número de especialistas veio contestar as afirmações da OEA.

O dia das eleições decorreu de forma tranquila e sem grandes incidentes, apesar das medidas sanitárias para prevenir os contágios pela covid-19. “Queremos destacar a tranquilidade da cidadania. Os cidadãos tiveram paciência, porque o processo eleitoral teve características singulares devido à necessidade que tivemos para nos adaptarmos aos desafios do coronavírus. A votação foi mais lenta, mas fluiu. O saldo é positivo”, resumiu Salvador Romero, presidente do Supremo Tribunal Eleitoral.

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