João Ferreira: “Precisamos de um orçamento. Mas não de um orçamento qualquer”

João Ferreira, 41 anos, eurodeputado desde 2014 e membro do Comité Central do PCP, defende que não é através do Chega que se faz a “representação dos descontentamentos”.

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João Ferreira (PCP) Nuno Ferreira Santos

O candidato presidencial do PCP, João Ferreira, reconhece que o país precisa de um Orçamento de Estado (OE), mas defende que não pode ser um qualquer. “Precisamos de um que esteja à altura da gravidade da situação que o país enfrenta, que responda aos problemas resultantes da pandemia mas que não esqueça que muitos desses problemas eram pré-existentes e foram só agravados”, defende o comunista em entrevista do Diário de Notícias e à TSF.

João Ferreira recusa responder se o OE para 2021 mereceria o seu veto, se fosse Presidente da República, e sublinha que há respostas que têm de ser dadas noutra sede que não essa. “Não vou fazer esse pronunciamento por uma razão simples: há um processo em curso. O OE que será votado não será a proposta que é conhecida hoje e é importante que não seja. E atenção: não podemos esperar de um OE todas as respostas. Há respostas que têm de ser dadas fora do OE2021”, garante.

Para o comunista, membro do comité central, o OE2021 será “tão mais facilmente aprovado quanto mais ele responder aos problemas do país”. Essa é a questão essencial para o PCP. "Demasiadas vezes perdemo-nos em cálculos que não nos levam ao essencial”, critica.

“A necessidade de defender apoios sociais aos que caíram numa situação de desemprego ou de falta de rendimentos; a necessidade de suster o mercado interno; a necessidade de valorizar os salários; a necessidade de fortalecer os serviços públicos. Isto são necessidades nas quais só o PCP é que se revê? Não considero isso. Se o Orçamento responder a estas questões - e outras, como o fortalecimento da capacidade produtiva nacional, algo que a pandemia fez perceber essa importância - ele será mais facilmente aprovado”, reconhece.

Questionado sobre a subida das intenções de voto no Chega, o candidato a Belém explica que “a ascensão de forças de cariz anti-democrático e até fascizante (...) tem as suas causas fundamentais na ausência de respostas concretas a problemas concretos sentidos pela esmagadora maioria das pessoas”. Mas João Ferreira recusa acreditar que é o Chega que está a capitalizar o descontentamento, em detrimento do PCP, por exemplo.

"Não foi esse o caso, de maneira nenhuma. Houve quem tivesse tentado ir por esse caminho mas acho que foi facilmente demonstrado que não era o caso. Temos sobretudo neste momento um processo de reorganização em curso no campo da direita e na representação da direita. Não creio que estas forças sejam sede substantiva de representação do descontentamento. Pretendem sê-lo - é verdade. Mas são forças que neste momento têm sobretudo a adesão de sectores da direita e num processo que é o da reorganização da direita”, explica, acrescentando que não menospreza o fenónemo.

Um elogio discreto e várias críticas 

É quase um clássico das entrevistas aos candidatos presidenciais deixar um cumprimento elogioso ao actual inquilino de Belém, seguido de críticas. Depois de Ana Gomes, que fez um “balanço positivo” do mandato de Marcelo Rebelo de Sousa (sobretudo na questão da coabitação), e de Marisa Matias, que o considerou “exemplar” e “incomparável”, João Ferreira, do PCP, opta por um elogio tímido. Na entrevista do Diário de Notícias e à TSF, o comunista diz que Marcelo “marcou uma certa diferença do ponto de vista de uma certa distensão”. E também não o poupa a críticas.

“Foi claro na intervenção do actual Presidente da República, em vários domínios, a forma como, em questão fundamentais, esteve sempre do lado dos interesses mais poderosos, que dominam a sociedade portuguesa, por exemplo do ponto de vista económico”, defende João Ferreira. “Faltou uma certa presença e uma certa intervenção em defesa dos interesses da generalidade das pessoas”, continua. E refere as opções em matéria de legislação laboral, transportes públicos, habitação ou saúde, criticando a “intenção assumida de um envolvimento para abrir a Saúde aos privados, ou seja, ao negócio da doença”.

Sobre a sua candidatura, diz que se dirige muito para lá das fronteiras do eleitorado do PCP e descreve-a como única por defender princípios não delegáveis em qualquer outra. “Estou a pensar em valores e princípios como o papel e a importância do trabalho, dos direitos laborais, sociais e cívicos como componente inalienável da democracia; na defesa dos serviços públicos como componente também fundamental do regime democráticos; a afirmação da soberania nacional.”

 João Ferreira ainda se detém na questão do envelhecimento dos militantes do PCP — o partido assume que 49% têm mais de 64 anos — para referir que a bancada mais jovem do Parlamento é a comunista e que é à juventude que se dirige a sua candidatura. "É algo que não deixa de preocupar, de resto como é assinalado nas “Teses”. Mas na história do PCP renovar é viver. No PCP, a juventude sempre teve, tem hoje, e não deixará de ter no futuro, um papel determinante.”

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