A praia do Portinho da Arrábida está a desaparecer. Restam as pedras
Antigo paraíso da Arrábida está transformado em praia de calhaus. Último temporal voltou a provocar derrocada do enrocamento da arriba. Ambientalistas pedem acção.
“Salvem o Portinho da Arrábida!” é o apelo que os ambientalistas do Clube da Arrábida lançaram nesta segunda-feira, em carta aberta ao ministro do Ambiente, à presidente da Câmara de Setúbal, à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
A mais emblemática praia da Arrábida, que no final do século passado atraía milhares de visitantes da Área Metropolitana de Lisboa, está transformada numa praia de pedras e calhaus após o progressivo desaparecimento do areal ao longo de décadas.
De acordo com os ambientalistas, o desassoreamento é “crescente” e o problema agrava-se a cada temporal.
“O temporal marítimo de 18 de Setembro passado provocou no Portinho da Arrábida a derrocada de várias secções de enrocamento da arriba por debaixo do caminho de acesso pedonal à praia, colocando-o novamente em risco de desabamento”, refere a carta do Clube da Arrábida.
Há cerca de 12 anos, o acesso à praia esteve cortado, após desmoronamento da mesma arriba e só foi reposto em 2010, com trabalhos de enrocamento promovidos pela Administração da Região Hidrográfica (ARH). Um outro temporal marítimo, em 2018, obrigou a nova intervenção de urgência, desta vez pela Protecção Civil Municipal de Setúbal, também com enrocamento, junto ao restaurante Farol.
A secção da arriba que abateu agora, junto à praia, além de ameaçar o acesso, pode, segundo os ambientalistas “potenciar o avanço do mar sobre a duna primária do Creiro”. De ano para ano o areal é cada vez mais pequeno e está já de tal forma reduzido que, nesta época balnear, a colocação de sombras passou a ocupar exclusivamente zonas ambientalmente sensíveis.
“Os concessionários continuaram a escavar a duna primária para montarem os chapéus-de-sol, por falta de área com areia na frente do mar. Uma das concessões colocou a última fileira de chapéus-de-sol dentro dos campos de voleibol de praia por já não ter mais espaço no que resta do areal”, denuncia a missiva.
Pedro Vieira, presidente do Clube da Arrábida, disse ao PÚBLICO que, apesar de urgentes para contenção primária, as novas obras de enrocamento não resolvem o problema de fundo. “Quanto mais pedra se mete no local mais se agrava a falta de areia, porque a pedra cobre a areia. A duna primária, que é o último reduto ainda existente, já começa a desaparecer e depois desta se perder vai tudo o resto”, afirma.
Dez anos à espera de um plano
Os ambientalistas defendem que a salvação do Portinho da Arrábida depende de um plano que ajude a mitigar o desassoreamento e pedem às entidades da administração central do Estado que se entendam com o Município de Setúbal para passarem à acção.
“Ao fim de dez anos de diversas conversas, não se chegou um acordo, de forma a que se possa avançar com um projecto de recuperação do Portinho da Arrábida, porque houve sempre a questão de quem tem realmente a tutela para poder tomar a decisão”, queixa-se Pedro Vieira.
O responsável explica que “parte da matéria é tutelada pelo ICNF, outra parte pela APA e algumas das competências passaram recentemente para a Câmara Municipal de Setúbal”, pelo que “não há uma entidade que encomende o necessário Estudo de Impacte Ambiental e que assuma o compromisso de o concretizar”.
Na prática, acrescenta, “há uma tutela triangular e enquanto não houver um acordo não haverá solução e continuaremos a assistir à erosão do Portinho da Arrábida”.
O PÚBLICO questionou o ICNF, mas não obteve respostas até ao fecho desta edição.
Por parte da Câmara de Setúbal, fonte do Gabinete de Apoio à presidência disse que a autarquia está em contacto com o ICNF e a APA e a “avançar com soluções”. “Há conversações, e proximamente vai haver mais uma reunião, não só sobre esse assunto, mas também das outras praias”, informou.
A mesma fonte afirmou ainda que o desabamento da arriba provocado pelo último temporal “está a ser avaliado” por parte da Protecção Civil Municipal, mas, pelo que já foi observado, “não há risco”.