Reclamações relativas a moratórias foram 10% do total de queixas bancárias

A iniciativa para proteger os clientes bancários da crise económica provocada pela pandemia gerou cerca de um milhar de queixas. Os processos de regularização de créditos aos consumo voltaram a aumentar.

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LUSA/MARIO CRUZ

O Banco de Portugal recebeu 1022 reclamações sobre as moratórias de crédito entre Março e Agosto, correspondente a 10% do total de reclamações recebidas nesse período, segundo a Sinopse de Actividades de Supervisão Comportamental hoje divulgada.

Segundo o regulador e supervisor bancário, quase metade das reclamações aconteceu em Abril e Maio, logo após a entrada em vigor das moratórias de crédito. Já nos meses seguintes, houve um “decréscimo gradual das reclamações recebidas sobre as moratórias de crédito”, informou ainda.

Das reclamações feitas, 45,8% são referentes à moratória pública para crédito à habitação, 36,4% sobre a moratória privada para crédito aos consumidores e 14% sobre a moratória pública para crédito a empresas.

As reclamações não significam que os clientes tenham razão na matéria reclamada, sendo que essa informação só constará no relatório anual do Banco de Portugal sobre supervisão comportamental.

Ainda entre Março e Agosto, o Banco de Portugal recebeu 312 pedidos de informação de clientes bancários sobre moratórias de crédito (42% sobre crédito à habitação), o equivalente a 14,8% de todos os pedidos de informação recebidos nesse período.

Segundo o relatório, entre 27 de Março e final de Agosto, os bancos receberam pedidos para moratórias relativas a 787.807 contratos de crédito, tendo sido aplicada esta medida a 726.996 contratos.

A diferença entre o número de pedidos e o número de moratórias concedidas diz respeito a casos em que o pedido de moratória não foi aceite (por não cumprimento de condições de acesso) ou em que ainda estavam em análise no momento em que os bancos reportaram os dados ao regulador e supervisor bancário.

Dos contratos de crédito abrangidos pelas moratórias, cerca de 42,9% são contratos de empréstimos para habitação própria permanente e outros créditos hipotecários, 28,8% crédito a empresas e empresários em nome individual e 28,2% crédito aos consumidores.

Quanto ao tipo de beneficiário das moratórias de crédito, as famílias representavam 71,2% dos mutuários dos contratos abrangidos pelas medidas de apoio aplicadas, sendo as empresas, empresários em nome individual e ‘outros’ 28,8%.

Nas moratórias públicas, a suspensão do pagamento de capital e juros foi a medida mais aplicada (90,8%), seguida apenas da suspensão do pagamento de capital (9,2%).

O Banco de Portugal avaliou ainda o cumprimento pelas instituições financeiras dos deveres face aos clientes sobre as moratórias (prestação de informações, disponibilização de formulário, dever de assistência), através de inspecções aos ‘sites’ de 99 instituições, tendo exigido a correcção das irregularidades a 97. Ou seja, apenas duas instituições não apresentavam qualquer irregularidade.

Desde Abril que milhares de clientes não estão a pagar os créditos aos bancos, fazendo uso do decreto-lei do Governo que permite moratórias nos empréstimos (que suspendem o pagamento das prestações dos empréstimos bancários, capital e/ou juros), criadas como uma ajuda a famílias e empresas penalizadas pela crise económica desencadeada pela pandemia de covid-19.

O Governo estendeu recentemente as moratórias de crédito até Setembro de 2021.

Reclamações de clientes bancários aumentaram 27%

O Banco de Portugal recebeu 10.184 reclamações até Junho, mais 27% do que no primeiro semestre de 2019, sendo depósitos, crédito aos consumidores e crédito hipotecário as matérias mais reclamadas, segundo o mesmo relatório de supervisão comportamental.

Em média, por mês, foram recebidas 1697 reclamações, o que representa mais 12,5% face à média mensal de 2019.

Segundo o regulador e supervisor bancário, excluindo as reclamações sobre as matérias relacionadas com a crise da covid-19 (sobretudo sobre as moratórias dos créditos), o aumento mensal das reclamações teria sido de apenas 2,6% face à média mensal de 2019.

Quanto às matérias mais reclamadas, continuam a figurar os depósitos bancários, o crédito aos consumidores e o crédito à habitação e hipotecário por serem também dos produtos bancários mais comuns.

Do total de reclamações do primeiro semestre, 32% foram relativas a depósitos bancários, 25% crédito aos consumidores e 12,2% sobre crédito à habitação e hipotecário.

Nos depósitos, as instituições mais reclamadas foram Novo Banco, Abanca e BBVA (todos com 0,39 reclamações por cada mil contas de depósito à ordem).

No crédito ao consumo, as instituições mais reclamadas foram Volkswagen Bank (1,71 reclamações por cada mil contas de crédito), Caixa Leasing e Factory (do grupo Caixa Geral de Depósitos, com 1,60) e BNI (1,41).

No crédito à habitação e hipotecário, as entidades mais reclamadas foram Banco CTT (2,53 reclamações por 1000 contratos), BBVA (0,99) e Banco Montepio (0,77).

Ainda segundo o Banco de Portugal, nas reclamações encerradas no primeiro semestre de 2020, não se observaram indícios de infracção por parte do banco em 60,5% dos casos (abaixo dos 61% em 2019) e em 39,5% dos casos houve resolução da situação reclamada (39% em 2019).

No primeiro semestre de 2020, o prazo médio de encerramento das reclamações foi de 48 dias, abaixo dos 58 dias de 2019.

Regularização de créditos ao consumo subiu 13% até Junho

Os processos PERSI de regularização de incumprimento de créditos ao consumo iniciados no primeiro semestre cresceram 13% face a período homólogo de 2019, para 359.731, segundo a mesma Sinopse de Actividade Comportamental

Os processos relativos a contratos de crédito aos consumidores envolvem um total de 302.076 contratos de crédito no montante em dívida de 785,8 milhões de euros.

O Banco de Portugal não atribui razões para este aumento dos processos PERSI nos contratos de crédito aos consumidores.

Contudo, deverá estar relacionado com mais incumprimento no crédito ao consumo na actual crise e pelo facto de a maioria destes contratos não estar abrangida pelas moratórias públicas (que permitem suspensão do pagamento, com excepção do crédito com finalidade educação desde Junho), mas apenas pelas moratórias privadas, e de os clientes não cumprirem as condições de acesso a essas moratórias.

Ainda entre Janeiro e Junho, os processos PERSI de contrato aos consumidores concluídos foram 340.091, mais 8,9% do que no primeiro semestre de 2019.

Todavia, o número de processos concluídos com regularização do incumprimento desceu para 41,1% (abaixo dos 44,8% do primeiro semestre de 2019 e dos 42,7% do segundo semestre de 2019).

Refere ainda o Banco de Portugal que, entre os processos concluídos, em mais de metade (56,7%) a situação de incumprimento não se resolveu devido a falta de acordo entre as partes (acima dos 55% do segundo semestre de 2019).

Dos processos concluídos com regularização do incumprimento, em 37,7% houve pagamento dos montantes em mora por parte do cliente (abaixo dos 39,2% do semestre anterior).

O número de processos PERSI de crédito ao consumo em que as instituições e os clientes chegaram a um acordo para a regularização das situações de incumprimento aumentou 7% face ao semestre anterior.

A solução mais frequentemente acordada foi a renegociação do contrato (9905 processos PERSI levaram envolvendo um montante renegociado de 18,6 milhões de euros).

A segunda solução mais frequente foi o refinanciamento da dívida (784 processos), seguido da consolidação de créditos (476 processos).

Ainda no primeiro semestre de 2020, foram concluídos 35.411 processos PERSI que envolveram 26.708 contratos de crédito à habitação e hipotecário num montante total em dívida de 1271,7 milhões de euros. Estavam ainda em fase de análise ou de negociação 23.422 processos.

O PERSI - Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de incumprimento é um mecanismo que existe desde 2012 e que tem de ser obrigatoriamente activado pelos bancos (também pode ser pedido pelo cliente) se houver atraso no pagamento do crédito. O objectivo é que haja um acordo, prevenindo a ida do caso para tribunal.