Economistas dão prioridade ao reforço da competitividade e à atração de investimento
Para 47% dos membros da Ordem dos Economistas que responderam ao último barómetro, o aumento do salário mínimo é importante, porém deverá aguardar por uma conjuntura económica mais favorável.
O terceiro barómetro de 2020 da Ordem dos Economistas visou fazer uma antevisão do Orçamento do Estado para 2021 (OE21), nomeadamente em matéria fiscal, antevendo o cenário macroeconómico futuro e perspetivando as prioridades em termos de reformas estruturais, investimento e medidas de recuperação da economia. Adicionalmente, foi realizada uma análise setorial ao impacto causado pela pandemia covid-19. O barómetro teve como base a opinião de 457 membros.
O momento atual que a economia nacional (e mundial) atravessa é de enorme incerteza, sendo uma das principais variáveis em aberto a imprevisibilidade da persistência dos impactos causados pela covid-19. É neste cenário, de extrema exigência e de poucas certezas, que surge o novo Orçamento do Estado cujos principais instrumentos político-económicos terão um papel essencial na recuperação e estabilização dos impactos da covid-19 e no relançamento do investimento, assente na nova visão estratégica para 2030.
De acordo com as opiniões expressas neste barómetro, o cenário macroeconómico futuro em que se baseará o OE21 não é consensual. A maior parcela de inquiridos (44%) considera que a economia irá piorar; 24%, mais pessimistas, acreditam que irá piorar bastante; contrastando com 23% que antecipam uma melhoria; 1% uma melhoria substancial; e os restantes 8% que permanecerá igual.
Nos dados mais recentes, divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística, o défice ficou nos 5,4% do PIB no primeiro semestre, englobando dois trimestres muito diferentes: 1,1% no primeiro, mas 10,5% no segundo. Ainda assim, de acordo com o Ministério das Finanças é esperado um défice anual de cerca de 7% (ficando abaixo das previsões do CFP, do FMI ou da OCDE). Relativamente à taxa de desemprego, esta subiu para 8,1% em agosto, face aos 7,9% registados em julho, ainda que tenha havido criação de emprego pelo terceiro mês consecutivo.
Numa análise setorial, o indicador apontado como o que sofreu o maior impacto negativo foi o precisamente o desemprego, resultante do ajustamento da oferta em resposta à súbita quebra da procura. As medidas de “lay-off” certamente evitaram um cenário mais danoso, mas poderão ainda encobrir um horizonte negativo. Com um grau de negatividade bastante acentuado e semelhante ao do desemprego, surgem os efeitos na dívida pública, no saldo orçamental e no PIB, indicadores com uma significante correlação. Seguem-se os impactos no tecido empresarial, no investimento e no rendimento disponível das famílias.
Ainda com uma nota negativa, mas já mais distante dos indicadores anteriores, surge o impacto no sistema financeiro, atenuado pelos esforços de capitalização dos últimos anos e pelo auxílio de liquidez do BCE. Porém, embora as moratórias ainda em vigor não representem uma ameaça de liquidez, o seu fim poderá contribuir para o aumento do crédito malparado. Por fim, surge o impacto na produtividade e, com o efeito menos negativo, a poupança, que em momentos de grande incerteza tem tendência para aumentar devido ao adiamento de decisões de investimento e de consumo.
Em termos das medidas mais importantes de caráter estrutural a adotar em 2021, as políticas referentes à recuperação económica foram selecionadas por 76% dos membros, seguidas pelo apoio à contratação e ao emprego (52%), pelos incentivos ao aumento do investimento (49%) e pelo alívio da carga fiscal (46%). Com menos representatividade, não revelando uma prioridade tão imediata face ao cenário atual, surgem as reformas ao nível da melhoria dos serviços públicos (23%), a redução do peso do Estado na economia (21%), espelhando a necessidade de uma ação mais intervencionista, a diminuição da dívida pública (15%) e a reforma da segurança social (15%).
Relativamente a alterações à carga fiscal, 45% das respostas apontam para que os impostos se mantenham em níveis idênticos aos atuais. Cerca de um quarto dos membros (24%) antecipam um aumento, mas 31% esperam uma diminuição.
Ainda em matéria fiscal, relativamente a alterações específicas aos principais impostos e contribuições, as perspetivas são para uma manutenção das taxas da TSU, IVA, IRC, IRS e Património (IMI, IMT) – apresentadas por ordem decrescente de nível de confiança. Com uma perspetiva de aumento surgem os impostos especiais de consumo, relativos a bebidas alcoólicas, tabaco e combustíveis.
Na ótica da recuperação da económica, a atual crise deverá ser a oportunidade para a reestruturação e realinhamento estratégico da economia portuguesa, transformando os atuais problemas em oportunidades e definindo o foco e as áreas prioritárias de alocação do investimento. De acordo com os resultados, a prioridade máxima deverá ser o reforço da competitividade e das medidas de atração de investimento. A reindustrialização e a aposta na inovação surgem em segundo lugar, seguidas pela aposta na tecnologia e digitalização e pela qualificação e formação.
Já num nível de prioridade inferior, é salientada a importância da redução dos custos de contexto, o investimento em infraestruturas (portos e ferrovia), a sustentabilidade/ ecologia e a coesão territorial.
No que concerne à recente discussão em torno do aumento do salário mínimo, para 47% dos membros o aumento é importante, porém deverá aguardar por uma conjuntura económica mais favorável. Cerca de 28% das respostas são favoráveis ao aumento imediato, pois consideram que apesar das circunstâncias atuais é necessário melhorar as condições dos trabalhadores. Contrariamente, 21% discordam deste aumento, pois consideram-no incomportável para as empresas, podendo inclusive contribuir para o aumento do desemprego.
Por último, assumindo a iminência de um cenário pandémico drasticamente mais negativo até ao final do ano, relativamente ao “trade-off” impacto económico vs contenção da pandemia, 72% das respostas elegem como melhor resposta um mix intermédio de medidas que não condicionem a 100% a retoma económica, mas que consigam minimamente controlar os focos de transmissão. Uma menor fração de 22% acredita que economia não tem capacidade para acomodar mais medidas de contenção / confinamento, pelo que teremos de viver com as consequências causadas pela covid-19 e, por fim, apenas uma minoria mais cautelosa (4%) imporia medidas mais profundas de confinamento, mesmo tendo em conta os prejuízos económicos que daí advirão.
Os autores escrevem segundo o novo Acordo Ortográfico