EUA endurecem posição no 5G: Huawei deve ser 100% proibida

Enviado de Washington a Lisboa frisa que Portugal é livre de escolher qualquer caminho, mas defende que a decisão certa é afastar os chineses de todos os componentes da rede.

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Keith Krach transformou a startup DocuSign numa tecnológica milionária; agora é o responsável de Trump para a estratégia global de segurança económica

Washington diz que Portugal não precisa de esperar por uma resposta europeia para tomar decisões sobre a participação chinesa na futura rede móvel de quinta geração (5G). Num encontro em Lisboa, nesta quinta-feira, o braço direito do chefe da diplomacia dos EUA, Keith Krach, endureceu o discurso contra a Huawei e sublinhou que Portugal “não tem de esperar" por decisões europeias.

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O encontro foi na casa do embaixador dos EUA em Lisboa

As empresas podem escolher fornecedores confiáveis ​​por conta própria. Os países podem escolher fornecedores confiáveis ​​por conta própria”, disse o homem mandatado pela Administração Trump para liderar a estratégia de segurança económica dos EUA.

Uma coisa é certa: para Washington, afastar os chineses do núcleo das redes 5G já não chega. É preciso proibir a Huawei a 100%, afastando-a de toda a rede. E isso inclui a componentes de rádio, acessórios e toda a infra-estrutura.

Krach é o quarto representante dos EUA a aterrar em Lisboa, no espaço de um ano, para falar dos “perigos” de entregar o 5G a empresas chinesas. A retórica anti-China tem vindo em crescendo até ao ponto de, dias antes desta visita, o embaixador dos EUA em Lisboa ter defendido numa entrevista que Portugal teria de escolher se queria fazer negócio com países aliados (como os EUA no quadro da NATO) ou com a China

Falando na residência do embaixador em Lisboa, Krach não ousou repetir essa ideia. Mas insistiu que há uma escolha a fazer e que a ligação histórica entre Portugal e a China não pode interferir numa questão que já “não é técnica”, mas sim de “confiança”.

“Seja quem for o fornecedor, é melhor que confiem nele. Não é uma questão técnica, é uma questão de confiança. Um sistema 5G é como um colar de pérolas, terá a força do elo mais fraco. Não faz diferença se é um componente ou no núcleo”, afirma Krach, que entrou para o governo pela mão do vice-presidente Mike Pence.

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Para Washington, toda a tecnologia chinesa deve ser excluída, seja no chamado core ou no edge da rede 5G. O que traduz um endurecimento da posição dos EUA contra as pretensões da Huawei, que conquistou nos últimos anos a liderança mundial no fornecimento de infra-estruturas de telecomunicações e que, neste momento, “luta pela sobrevivência”, como admitiu a 23 de Setembro o chairman Guo Ping, que também passou por Lisboa no fim de 2019.

As sanções económicas dos EUA, que já duram há dois anos, atingem a Huawei onde mais dói: desde 15 de Setembro, o fabricante chinês está sem acesso ao maior mercado de processadores. Na Casa Branca acredita-se que sem chips a Huawei está condenada. Mas enquanto isso não acontece, continua apostada numa mensagem assente na desconfiança face ao regime chinês.

“Tudo se resume a uma coisa: em quem vão confiar? Em dois fornecedores escandinavos [Nokia e Ericsson] e um coreano [Samsung]? Ou dois [Huawei e ZTE] de um país [China] onde existe uma lei nacional de inteligência que exige que toda a empresa e todo o cidadão entregue toda e qualquer informação ao Partido Comunista Chinês, ou ao Exército, sob pena de sofrer consequências? ”

Ainda que diga que os EUA “respeitam o direito de cada país de tomar as suas próprias decisões”, Krach deixou nas entrelinhas de que haverá consequências para quem comprar tecnologia chinesa. “A NATO e a UE não querem uma aliança fragmentada”, assegurou, mas também lembrou que os EUA estão empenhados em promover a Clean Network Initiative, para promover uma “rede limpa” de “perigos”. E, para aqueles que pensavam resolver a questão tirando a Huawei do core, esta aliança que tem 30 países neste momento, muitos deles da NATO, quer “limpar” todo o sistema.

“A Clean Network foi expandida para incluir [não apenas o núcleo da rede mas também] a nuvem, cabos subaquáticos, aplicações, operadoras”, sublinhou Krach, como que destacando que o melhor é mesmo o afastamento total da China.

Numa conversa limitada pela equipa de Krach, que só autorizou gravações vídeo após uma conversa inicial e que exigiu ter conhecimento prévio das citações que os jornalistas pretendiam fazer, Krach disse que os EUA aceitam a autonomia nacional. “Respeitamos o direito de cada país a tomar as suas próprias decisões”, prosseguiu, acrescentando: “Gostaria de encorajar os países a falarem com o comissário da UE Thierry Breton ou com o secretário-Geral Adjunto da NATO, Mircea Geoana. Pensem na segurança nacional de Portugal, essa é a questão central.”

Krach passou ainda ao de leve sobre os restantes interesses chineses em Portugal, como a EDP (que tem negócios nos EUA) e o porto de Sines. Nunca se referiu a eles - e durante o encontro inicial, que não pôde ser gravado pelas câmaras de TV, a conversa ficou-se pelo 5G (outros temas só em entrevistas de cinco minutos para a RTP e a Lusa).

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Ainda assim, disse que os EUA entendem certos receios. “Países e empresas estão apavorados com um elefante pesado que está sentado à mesa. Chama-se retaliação da China. Eles fizeram-no à Noruega, à Coreia do Sul, à nossa Liga Profissional de basquetebol (NBA). Mas há força na unidade e na solidariedade. O Partido Comunista Chinês não pode retaliar contra todos. É aí que entra a UE, entra a aliança transatlântica, entra a NATO. ”

Krach faz um périplo por oito países e o próximo destino é Espanha. Mostrou-se satisfeito com os resultados, enumerando reuniões com responsáveis governamentais e das empresas de telecomunicações. Lembrou que as administrações destas últimas serão “pessoalmente responsáveis”, de acordo com a proposta europeia, se escolherem a Huawei e “alguma coisa correr mal”. Sobre o investimento dos EUA em Portugal, disse, no fim do encontro, à Lusa, que não vê obstáculos a que esse investimento exista. 

“Portugal tem sido um grande parceiro, amigo, aliado e como ex-CEO global fiz um óptimo negócio no país. Portanto, é fácil fazer negócios com Portugal e o que eu sei é que quando se faz negócio com um empresário português, é integridade. Essas foram as minhas experiências. Não tive mais do que óptimas experiências.”

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