Restaurante forçado a fechar por causa de obras da EMEL não é indemnizado
A proprietária diz que a empresa afirmou que não indemniza por considerar que a loja será “altamente beneficiada” pela obra, apesar de ter o negócio fechado durante pelo menos um ano sem qualquer tipo de rendimento.
Maria do Carmo Vieira tem 70 anos e é dona de um pequeno restaurante de comida típica portuguesa próximo da Casa dos Bicos. O estabelecimento está fechado desde Janeiro devido às obras para a construção de um elevador nas Escadinhas das Portas do Mar, que têm sido devastadoras para o negócio. “A única pergunta que eu faço, e faço-a a toda a gente, é se viriam ao meu restaurante. Toda a gente diz ‘não, eu não viria cá'”, lamenta. O estaleiro e o buraco em frente da porta desencoraja qualquer cliente.
A obra está a cargo da Empresa Municipal de Estacionamento de Lisboa (EMEL), que também foi responsável por outros elevadores da capital, como o do Chão do Loureiro. De acordo com Carmo Vieira, a empresa apontou o final do ano como prazo de conclusão dos trabalhos.
“Eles dizem que é no fim do ano, mas não acredito pelo estado em que isto está. Mesmo que seja já no final do ano, é praticamente um ano sem negócio. Adoro a restauração, também porque, como costumo dizer, os meus clientes dão-me todo o amor de que preciso”, conta. As paredes estão cobertas de elogios e desenhos feitos a caneta, em idiomas que vão do hebraico ao mandarim - muitos dos seus clientes são estrangeiros. O restaurante abriu há três anos, quando Carmo Vieira decidiu investir tudo o que tinha para abrir o seu próprio negócio.
As coisas mudaram em Janeiro. A rua sempre foi estreita, mas agora o único ponto de passagem é umas pequenas escadas que passam por cima da fossa com cerca de três metros de profundidade onde decorrem as obras. O trabalho é lento e difícil, uma vez que não é possível utilizar máquinas pesadas. E houve visitas regulares de arqueólogos devido à possibilidade de haver algo com interesse histórico nas escavações.
O barulho constante, o difícil acesso e a retirada da sinalética do restaurante impossibilitam o negócio. A maior parte dos clientes preferia a esplanada mas essa não passará de uma lembrança do passado porque, depois de a construção terminar, já não haverá espaço para mesas no passeio. A acrescer a estes percalços, como esteve fechado tanto tempo, o restaurante sofreu uma tentativa de assalto.
Segundo a proprietária, a Polícia Municipal fez uma visita ao local e disseram-lhe que pusesse “uma queixa cível contra a EMEL. “Você não tem cá clientes, e é impossível funcionar nestas condições. As pessoas não vêm cá”, disseram-lhe, comprovando o evidente. Carmo Vieira vai mesmo avançar com a queixa, até porque realça que contactou a EMEL com o objectivo de obter uma indemnização, mas o pedido foi recusado. A proprietária diz que a empresa justificou a decisão por considerar que o restaurante será “altamente beneficiado por causa do elevador”, apesar de ter tido o negócio fechado durante pelo menos um ano sem qualquer tipo de rendimento. “Uma coisa é a covid-19, em que as pessoas facturam muito menos. Eu seria capaz de facturar um terço do que facturava. Mas o problema é que não facturo nada, nem sequer abro”, lamenta.
Ao PÚBLICO, a EMEL apenas disse que “está ciente dos transtornos que as obras na via pública têm causado, em particular quando se inserem em meios urbanos tão sensíveis como é o caso dos bairros históricos, e irá analisar o assunto com a devida atenção, tal como referiu na carta de resposta que enviou à interessada”. Vieira afirma que quando contactou a empresa pela primeira vez, lhe disseram que tinha todas as condições para funcionar. Mas os próprios funcionários da EMEL, que por vezes visitam o local, contradizem-se. “Pergunto-lhes se viriam ao meu restaurante. Eles calam-se, é evidente que ninguém vinha cá. No outro dia, houve um que admitiu mesmo: ‘sim, era difícil cá vir'”.
O caso ganhou notoriedade quando o CDS Lisboa publicou um vídeo nas redes sociais. Nele, o deputado e vereador João Gonçalves Pereira insiste que “a Câmara de Lisboa e a própria EMEL, que é quem está a executar a obra, têm obrigação de indemnizar aqueles que estão a ser prejudicados pela intervenção.” O vereador critica o que entende ser uma situação de “desrespeito” da autarquia e da empresa, considerando que estão a ignorar “o prejuízo no estabelecimento causado por uma obra municipal”.
Texto editado por Ana Fernandes