Viseu: Inês, Nuno e os sabores guardados nos livros das avós

Pratos tradicionais, receitas antigas, actualizadas aqui e ali, delicadamente, para preservarem a alma. O DeRaiz, perto de Viseu, tem aquele espírito de casa que nos deixa muita vontade de voltar. E uma excelente relação qualidade/preço.

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Fernando Donasci

Os pastéis de massa tenra chegam à mesa pequenos, estaladiços, o sabor da carne cozinhada lentamente a fazer-nos sentir de regresso a casa e aos cuidados de uma avó.

Quando era pequena, Inês Beja andava à volta da avó Nazaré a vê-la fazer estes pastéis e muitos outros cozinhados deliciosos. As receitas estavam guardadas num pequeno caderno, com uma letra de aluna aplicada. Quando começou a estudar cozinha, Inês decidiu copiar o caderno à mão; a avó, ao ver tanto trabalho, ofereceu-lhe o livro. “Leva, que eu já não cozinho assim tanto.”

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Os pastéis de massa tenra feitos a partir da receita da avó de Inês Fernando Donasci

Hoje o caderno está em lugar de destaque, em cima de uma cómoda, à entrada do DeRaiz, o restaurante que Inês abriu com Nuno Fonte em Rebordinho, a dez minutos do centro de Viseu. A avó Nazaré aparece às vezes e ainda lhe “diz que a massa dos pastéis está muito grossa”, ri-se Inês.

Nuno e Inês, que trabalharam juntos no Mesa de Lemos (uma estrela Michelin), procuraram vários sítios até encontrarem esta casa de pedra com dois andares, um antigo restaurante que, com muitas peças vindas de uma antiga casa de família, decoraram ao gosto de ambos, transformando-o num espaço acolhedor, à imagem da comida que aqui fazem – toda ela “de raiz”, no duplo sentido de ser feita do zero e de ter a ver com as raízes dos dois.

Tal como os pastéis de massa tenra da avó Nazaré se transformaram num dos ícones do restaurante, o mesmo aconteceu com os ovos verdes, inspirados numa receita da avó de Nuno, Raquel, e que são servidos dentro de uma gaiola. No DeRaiz tudo é tradicional, mas os pratos têm sempre alguma coisa que mostra que estamos na presença de dois cozinheiros seguros, que sabem usar as técnicas que aprenderam para fazer pequenos ajustes que dão uma nova vida às receitas, respeitando integralmente os sabores.

Só ficamos com pena de numa refeição não ser possível provar tudo, mas a ideia do atum (dos Açores) à Bulhão Pato com batata-doce resulta num prato excelente; a açorda de bacalhau é irresistível; e o borrego grelhado e fumado encerra de forma perfeita a sucessão de pratos que conseguimos experimentar. E a garfada que ainda damos no “bacalhau à Brás das avós” é suficiente para nos convencer que é mesmo preciso regressar ao DeRaiz.

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A sala do DeRaiz Fernando Donasci

Os livros das avós ainda guardam muitas receitas, por isso vai sempre haver pratos novos a entrar na carta. Mas os dois cozinheiros aceitam também pedidos especiais dos clientes que tenham muita saudade de um sabor da sua infância. Para já, e por encomenda, com dois ou três dias de antecedência, é possível pedir arroz de pato, robalo ao sal, arroz de cabidela, filetes de polvo com arroz, cabrito assado, bacalhau no forno, ou algum prato de temporada – “na altura dos míscaros, fazemos arroz de míscaros, por exemplo”, lembra Inês.

O pão, caseiro e com massa mãe, é também muito bom – Inês e Nuno têm vindo a aperfeiçoá-lo e aproveitaram o período de confinamento devido à pandemia de covid-19 para testar novas receitas. Os resultados animaram-nos tanto que estão cada vez mais entusiasmados com a ideia de vir a abrir uma padaria.

Quanto à carta de vinhos, que é acompanhada de um mapa de Portugal localizando as regiões, e da indicação das castas de cada um, reflecte os gostos de Inês e Nuno, com a preocupação de mostrar projectos e produtores mais pequenos ou menos conhecidos, com destaque, claro, para a região do Dão. Assim, por escolha dos anfitriões, a nossa refeição foi toda acompanhada por vinhos do projecto Chão de São Francisco, da belíssima Quinta de São Francisco.

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