A justiça tem “muita matéria para apreciar” sobre Reguengos, diz Marcelo

Ao contrário da ministra da Solidariedade, o Presidente da República leu o inquérito da Ordem dos Médicos e recomenda a sua leitura, até para se tirarem “lições para o futuro”. CDS pede já demissão da ministra e CDS chama-a ao parlamento.

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LUSA/LUÍS FORRA

O Presidente da República já leu o inquérito da Ordem dos Médicos (OM) sobre o surto de covid-19 num lar de Reguengos de Monsaraz e também os outros três já conhecidos e considera que a justiça tem “muita matéria para apreciar”. Uma posição que contrasta com a da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, que em entrevista ao Expresso desvaloriza as conclusões do relatório da OM, apesar de ainda não o ter lido.

“É preciso ler todos os relatórios”, defendeu Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas no Alvor,  referindo-se aos quatro relatórios já conhecidos sobre o lar de Reguengos, onde morreram 18 pessoas: além do da OM, há um primeiro, elaborado pelo presidente da câmara municipal, outro da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva, proprietária do lar e ainda o da Administração Regional de Saúde.

Os documentos “não têm exactamente as mesmas conclusões”, sublinha Marcelo, sublinhando a “complexidade” do problema mas considerando que é preciso retirar deles “lições para o futuro”.

“Quem acompanhou o processo de protecção dos lares para esta pandemia - e eu acompanhei - sabe que foi uma tarefa brutal”, disse ainda o Presidente da República, pedindo “serenidade” na análise do caso de Reguengos e lembrando que o Ministério Público já está a investigar o caso.

Na entrevista, a ministra da Segurança Social admite que faltam funcionários nos lares, lembrando que há um programa para colmatar essa falha, mas considerou que a dimensão dos surtos de covid-19 “não é demasiado grande em termos de proporção”.

Ana Mendes Godinho defendeu que não faz sentido falar de casos concretos de surtos de covid-19 em lares e sobre a situação ocorrida em Reguengos de Monsaraz disse que está a decorrer um inquérito por parte do Ministério Público e que é preciso esperar pelas conclusões.

CDS pede demissão da ministra,
PSD chama-a ao parlamento

Para o CDS, a reacção da ministra é de uma “negligência arrepiante” e por isso os centristas pedem “que se mantenha em férias e dê lugar a outro”.

“Para além de exporem a sua total inabilidade para o cargo e espelharem uma negligência arrepiante, as suas afirmações parecem retiradas de um filme de terror. Portugal não tem uma ministra da Solidariedade Social. Tem uma Ministra da Insensibilidade Social”, escreve o presidente do partido, Francisco Rodrigues dos Santos, em comunicado à comunicação social.

Lembrando que “40% das mortes por covid-19 em Portugal ocorreram em lares” e que continuam surtos activos em 73 lares, num total de 545 idosos infectados, o líder do CDS considera que a ministra “não só faz vista grossa das estatísticas, como prova que não aprendeu nada com gestão da pandemia”.

“Nos lares, continua a faltar o básico, que o CDS exigiu ao Governo há cinco meses atrás: planos de contingência, com regras claras, procedimentos de actuação definidos, e fiscalização por parte da tutela”, sublinha. Sobre a estratégia para os proteger os idosos, “cuidando dos que estão doentes e impedindo novos focos no futuro, não se ouviu uma palavra”, acrescenta.

Para o CDS-PP, a protecção dos idosos “é uma linha vermelha que não pode ser ultrapassada por nenhum Governo”. “O vírus é uma ameaça preocupante. Mas incompetência da Ministra também. A sua continuidade em funções é uma questão de saúde pública. Pedimos que se mantenha em férias e dê lugar a outro”, remata.

Por seu lado, o PSD anunciou a meio da tarde que vai chamar Ana Mendes Godinho, “com carácter de urgência”, à Assembleia da República, para explicar o que aconteceu no Lar de Reguengos de Monsaraz e também a questionar sobre as declarações ao Expresso em que “desvaloriza a situação dos lares e a sua fiscalização”, considerando que “a ministra se está a demitir das suas funções”.

Mas no parlamento o PSD quer também ouvir a ministra da Saúde, “para saber qual o plano do Governo para prevenir e combater, de forma articulada, os focos de contágio relacionados com a Covid-19”, lê-se no comunicado enviado à comunicação social.

Logo de manhã, o deputado social-democrata Ricardo Baptista Leite, membro da Comissão Parlamentar de Saúde e coordenador científico do Centro de Investigação em Saúde Pública da Universidade Católica Portuguesa, escreveu no Twitter uma crítica dura à ministra da Saúde.

“Desvaloriza o problema, diz que não leu o relatório da auditoria (devastadora) sobre as mortes no lar de Reguengos e afirma que não é nada com o seu Ministério. Como é possível?! Os mas velhos não podem ser vítimas dos jogos e irresponsabilidade do Governo”, comenta o deputado.

Enquanto o PSD opta pelo silêncio, o deputado social-democrata Ricardo Baptista Leite, membro da Comissão Parlamentar de Saúde e coordenador científico do Centro de Investigação em Saúde Pública da Universidade Católica Portuguesa, escreveu no Twitter uma crítica dura à ministra da Saúde.

“Desvaloriza o problema, diz que não leu o relatório da auditoria (devastadora) sobre as mortes no lar de Reguengos e afirma que não é nada com o seu Ministério. Como é possível?! Os mas velhos não podem ser vítimas dos jogos e irresponsabilidade do Governo”, comenta o deputado.

IL exige responsabilidades técnicas e políticas

Ainda antes de ser publicada a entrevista de Ana Mendes Godinho ao Expresso, a Iniciativa Liberal (IL) enviou na sexta-feira um conjunto de perguntas sobre o caso de Reguengos para os ministérios da Saúde e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social considerando que houve uma “sucessão de erros, omissões e incompetência generalizada conduziu a um total de 162 infectados e custou a vida a 18 portugueses”.

“Um caso desta gravidade não pode passar sem um cabal esclarecimento e sem a assunção de responsabilidades técnicas e políticas”, lê-se no texto da responsabilidade do líder do partido e deputado único, João Cotrim Figueiredo. Por isso pergunta: “Vai o Governo assumir alguma responsabilidade política? Ou, à semelhança de outros casos de gritantes falhas do Estado (incêndios, Tancos ou caso das golas, só para citar alguns), vai tentar que o assunto caia no esquecimento ou tentar encerrá-lo arranjado um bode expiatório?”

Lembrando que o primeiro caso foi detectado a 18 de Junho, a IL sublinha que “não se sabe, mais uma vez, quais as responsabilidades e as falhas das várias entidades envolvidas a nível da direcção e equipa técnica do Lar, da administração da FMIVPS, da Câmara Municipal de Monsaraz, da ARS Alentejo, do Centro Regional de Segurança Social do Alentejo, da Direcção-geral de Saúde, dos serviços da Segurança Social e, obviamente, do Governo, nomeadamente dos Ministérios da Saúde e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social”.

A IL receia que este não seja um caso isolado e pergunta que medidas foram tomadas para garantir que a situação não se repita.

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