Ser árvore em Braga

A resposta da câmara recai invariavelmente em: “Plantamos muito mais árvores do que aquelas que abatemos.” Para o executivo municipal, a ecologia é uma folha de Excel – o que se tira aqui, coloca-se acolá.

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Pedro Fazeres

Árvores há muitas. Há-as frondosas, despidas, autóctones, exóticas, históricas, monumentais, comuns. A diversidade arbórea é infinita, as suas qualidades também. Quando o Sol queima no Verão, abrigamo-nos nelas. Nas cidades, as folhas filtram a poluição do ar. A vida multiplica-se no arvoredo urbano: nele habitam aves, insectos, fungos, líquenes. O que seria do combate à crise climática sem a captura de carbono pela vegetação arbórea? As árvores em espaço público são democráticas, todos beneficiamos delas. São paisagem, beleza, vida.

Apesar de tudo o que nos oferecem, muitos municípios desprezam-nas, maltratam-nas, abatem-nas sem explicação. São muitos os casos de dendroclastia espalhados pelo país. É o caso de Braga, cidade onde se acumulam episódios de massacre arbóreo.

Em 2019, a Câmara Municipal de Braga pediu à Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) uma avaliação do estado do arvoredo em várias zonas da cidade. Finda a análise, os especialistas concluíram que das 288 árvores avaliadas, 151 não precisavam de qualquer intervenção, 98 careciam de podas e apenas 39 deviam ser abatidas. De forma arbitrária e contrariando as recomendações dos técnicos da UTAD que a própria Câmara havia contratado, o vereador do Ambiente ordenou o abate de 130 árvores.

Mas há mais. No passado mês de Julho, o município iniciou a construção de um troço de ciclovia com 700 metros até à Universidade do Minho, obra necessária numa cidade com graves carências na mobilidade. Inexplicavelmente, o projecto prevê o abate de 56 árvores, mesmo quando existe espaço suficiente para ciclovias, passeios, estrada e, claro está, árvores. O presidente da câmara vê os abates com “desconforto”. Mas desconfortável ou não, nada fez para impedir o derrube de 12 árvores sãs, de grande porte, que embaraçavam o projecto municipal. As restantes 44 terão o mesmo destino?

Desconhece-se a razão para os abates reiterados em Braga. A resposta da câmara recai invariavelmente em: “Plantamos muito mais árvores do que aquelas que abatemos.” Para o executivo municipal, a ecologia é uma folha de Excel – o que se tira aqui, coloca-se acolá. Ignoram que muitas plantas nunca atingem a idade adulta. A vegetação arbórea demora décadas e por vezes séculos a estabelecer equilíbrios ecológicos com outras espécies e o meio. Os benefícios do arvoredo maduro para a qualidade de vida das pessoas são desproporcionalmente superiores aos das pequenas plantas. A plantação deve continuar, mas não em substituição do que já está de pé.

O abate é por vezes necessário. Existem situações específicas em que há riscos para a segurança das pessoas, justificando-se o derrube. Muitas espécies são inadequadas para o meio urbano, danificando infra-estruturas e bens. Por vezes, adoecem irremediavelmente devido a podas negligentes, representando perigo de queda. A avaliação da necessidade de abate deve ser rigorosa, feita caso a caso.

A intervenção no parque arbóreo é complexa, exige conhecimento técnico e científico. Para o executar, os serviços municipais devem contar com técnicos especializados em arboricultura, devidamente credenciados. Estes técnicos devem reger-se por um regulamento municipal do arvoredo, no qual constam boas práticas de intervenção, validadas cientificamente.

Ser árvore em Braga não é fácil. Mas poderá vir a ser. A cada dia que passa cresce o escrutínio cidadão das intervenções municipais no arvoredo, tal como a mobilização das pessoas em defesa das árvores. Os municípios, acompanham?

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