Duterte cede e reintroduz medidas de confinamento para conter covid-19 nas Filipinas
País tem batido recordes diários de novas infecções desde o levantamento de uma rígida quarentena que durou três meses. Presidente criticou profissionais de saúde. “Querem uma revolução? Então digam-no”
Depois de os profissionais de saúde das Filipinas terem escrito ao Governo a pedir medidas para conter a disseminação da SARS-CoV-2, o Presidente filipino, Rodrigo Duterte, anunciou um confinamento obrigatório para Manila e para as províncias em redor da capital.
As medidas de quarentena vão afectar 25 milhões de pessoas, um quinto da população, e entram em vigor na terça-feira, prolongando-se durante duas semanas, até 18 de Agosto. Segundo a Reuters, vários negócios vão ser encerrados temporariamente e os transportes públicos vão parar. A ordem é para ficar em casa e, para circular na área de Manila, os cidadãos precisam de apresentar um documento emitido pela entidade patronal.
“Eu ouvi-vos. Não percam a esperança. Nós sabemos que vocês estão cansados”, afirmou Duterte, num discurso televisivo na noite de domingo, em resposta a uma carta enviada por médicos e enfermeiros filipinos ao chefe de Estado. O porta-voz do Presidente, Harry Roque, anunciou ainda que o Governo vai contratar dez mil profissionais de saúde.
Nessa carta, 80 grupos que representam 80 mil médicos e um milhão de enfermeiros afirmaram que as Filipinas estão a “perder a batalha” contra a covid-19. Disseram estar “exaustos” e alertaram para a situação nos hospitais, que estão no limite.
No domingo, as Filipinas bateram um novo recorde em termos de infecções diárias com 5032 novos casos e 20 mortes. Esta segunda-feira, o Governo confirmou 3226 novos casos e 46 mortes. Desde o início da pandemia, segundo os números da Universidade Johns Hopkins, as Filipinas têm 106.330 infectados por SARS-CoV-2, tendo 2104 morrido devido à covid-19.
Apesar do aumento substancial de casos das últimas semanas, que quintuplicaram desde que as medidas de confinamento foram levantadas a meio de Junho, o Governo de Duterte tentou evitar ao máximo a reintrodução da quarentena, que vigorou no país durante três meses, sob medidas bastante rígidas, em que as ordens eram para a polícia disparar contra quem causasse distúrbios.
Conselheiros próximos do Presidente têm defendido que a economia filipina não aguentaria um novo confinamento. Com as infecções a baterem recordes diários, Duterte recuou, não sem antes fazer ataques aos profissionais de saúde que fizeram soar o alarme quanto à situação epidemiológica no país.
“Vocês não me conhecem. Querem uma revolução? Então digam-no. Força, tentem. Vamos arruinar tudo. Vamos matar todos os que têm covid-19”, afirmou o chefe de Estado das Filipinas, citado pela Al-Jazeera, depois de anunciar a reintrodução das medidas de quarentena. “É isso que vocês querem? Podemos sempre acabar com a nossa existência dessa maneira”, acrescentou.
Com a reintrodução da quarentena, críticos do Presidente temem que que o Governo a utilize para aumentar a perseguição à oposição, utilizando o vírus como pretexto para levar a cabo detenções, tornando definitivas medidas apresentadas como temporárias. Acresce que, no início de Julho, Duterte ratificou uma polémica lei antiterrorismo, que dá mais poder à polícia para deter, sem mandado, suspeitos de terrorismo.
“O Presidente Duterte gosta de dizer que governa utilizando a violência e o medo, e isso certamente que foi exacerbado pela covid-19”, afirmou à CNN Maria Ressa, jornalista que foi condenada, em Junho, por ciberdifamação. “O Governo tira-nos o poder e depois não recuperamos os nossos direitos. Foi isso que aprendemos nos últimos quatro anos”, rematou.