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Costa: “Procurar o bloco central é o mesmo que andar à procura de gambozinos”

Em entrevista à Visão, o primeiro-ministro reconhece que Portugal recebeu uma “bazuca” de fundos comunitários e que agora não pode deixar de “acertar o tiro”.

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O primeiro-ministro diz concordar com o fim dos debates quinzenais no Parlamento Reuters/POOL

O primeiro-ministro volta a defender um compromisso de legislatura com os partidos à esquerda do PS, assume que se entende com o PSD em questões de “fundo”, mas rejeita uma reedição do bloco central dos anos 80.

“O bloco central foi uma realidade que aconteceu numa circunstância muito própria e específica e seria um erro proceder à sua reedição. Esta discussão sobre o bloco central é desnecessária: procurar o bloco central é a mesma coisa que andar à procura de gambozinos. É um mito urbano, mas que não está aí para se concretizar”, afirmou António Costa em entrevista à revista Visão.

O chefe de Governo pronunciou-se sobre os entendimentos com o PSD no Parlamento (sobre nomes para órgãos externos à Assembleia da República, por exemplo) como uma necessidade “aritmética” e apenas admitiu convergência com os sociais-democratas em questões “de fundo” como as da Europa e as da “descentralização de competências” para as autarquias.

Depois do debate do estado da nação, em que desafiou BE, PCP e PAN para um novo entendimento, o chefe de Governo insiste na solução mesmo que não haja um acordo escrito. “Uma vez que não há maioria absoluta do PS, é para manter a ‘geringonça’, ainda que não seja de papel passado, tenha outros formatos e tenha de responder hoje a novas realidades com as quais estamos confrontados. Mas acho que ninguém compreenderia que, sendo claro para todos que a resposta a esta crise não é a austeridade, não fosse com aqueles com quem virámos a página da austeridade que fizéssemos agora este caminho”, afirmou.

Já ao início desta tarde, o líder do PSD comentou as referências ao bloco central, afastando também essa solução. “O primeiro-ministro já disse que o Orçamento de Estado de 2021 vai ser preparado com o PCP e Bloco de Esquerda e, por isso, não sei porque estão sempre a falar do bloco central. É porque não haverá outros assuntos, o que também é bom, antes isso que coisa pior”, disse Rui Rio aos jornalistas, à margem de uma reunião com profissionais de saúde, em Portimão, no Algarve.

O líder do PSD considerou que o facto de o PSD se ter abstido na votação para deixar passar o orçamento suplementar do Governo e posição idêntica ter tido o PS para viabilizar a proposta do PSD de apoio aos sócios-gerentes no quadro da pandemia da covid-19, “não é um bloco central, como foi automaticamente classificado por doutos comentadores”.

“Se o conceito for esse, então temos bloco bentral à direita, à esquerda. Temos blocos todos os dias”, sublinhou.

Na entrevista à Visão, assumindo que o contexto da crise e da incerteza exige um “compromisso sólido para o horizonte da legislatura”, António Costa reconhece que os fundos aprovados pela Europa são uma “bazuca” e que Portugal tem de acertar o tiro. “Não podemos queixar-nos da falta de poder de fogo, só podemos queixar-nos, se não formos capazes de definir um bom plano de batalha e se não acertarmos bem agora a nossa pontaria. A parte da Europa a Europa fê-la. Agora cumpre a nós aproveitar bem aquilo que a Europa disponibilizou”, afirmou, referindo que, em média, Portugal vai ter até 2029 6,7 mil milhões de euros para executar por ano, o que duplica o máximo recebido até agora.

Relativamente à sua sucessão no PS, o secretário-geral do partido não restringe as hipóteses aos dois nomes mais falados como potenciais candidatos à liderança dos socialistas, Pedro Nuno Santos e Fernando Medina. “Eu convivo muito bem com eventuais ambições ou com alguém que queira concorrer comigo à liderança. Não é nada que me tire o sono ou que me angustie. O PS tem, felizmente, muitas soluções nas novas gerações. Quem lhe diz que não pode ser uma mulher”, questionou, recusando a intenção de designar sucessor.

O primeiro-ministro assume concordar com o fim dos debates quinzenais aprovado por PS e PSD no Parlamento. “A existência alternada de debates com o primeiro-ministro e debates temáticos por diferentes áreas de governação permite aprofundar muito mais os temas. Porque um debate com o primeiro-ministro, por mais bem informado que esteja, sobre Educação ou sobre Saúde, nunca será tão aprofundado como se for com um dos seus ministros da Educação ou da Saúde”, argumentou.

Mas António Costa contrariou Rui Rio na ideia de que os debates quinzenais era um obstáculo ao trabalho como primeiro-ministro: “A minha presença na AR faz parte do meu trabalho. O escrutínio democrático faz parte do meu trabalho”.

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