Cientistas descobrem primeiro derrame activo de metano no fundo do mar na Antárctida

O gás, um dos mais eficazes no aquecimento da atmosfera, poderá começar a escapar-se através destes derrames à medida que a crise climática provoca o aquecimento dos oceanos. Isto, aliado ao facto de os micróbios que o consome terem demorado anos a aparecer no local “não são boas notícias”.

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Fundo do mar de Ross, na Antárctida. As manchas brancas indicam a presença de micróbios que se alimentam do metano Universidade do Estado do Oregon
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Um grupo de cientistas da Universidade do Estado do Oregon, nos Estados Unidos, identificou o primeiro derrame activo de metano no fundo do mar da Antárctida. Esta descoberta está a possibilitar que o grupo obtenha, por um lado, novas informações sobre o ciclo do metano e, por outro, compreenda melhor o papel que este gás, encontrado nesta região em particular, pode estar a desempenhar no aquecimento do planeta. As descobertas dos investigadores norte-americanos foram esta quarta-feira publicadas na revista académica Proceedings of the Royal Society B, uma das publicações científicas da instituição britânica Royal Society.

De acordo com o comunicado da instituição de ensino superior, divulgado também esta quarta-feira, uma infiltração ou derrame de metano é um local onde o gás escapa de um reservatório subterrâneo e entra no oceano. Dizem os investigadores que não é a primeira vez que estes fenómenos são detectados nos oceanos do planeta, mas a descoberta no mar de Ross foi a primeira infiltração activa encontrada na Antárctida.

E porque é que esta descoberta é importante? Como explica Andrew Thurber, ecologista marinho e docente da Universidade do Estado do Oregon, o metano é “o segundo gás mais eficaz no aquecimento da nossa atmosfera” e muito mais poderoso do que o dióxido de carbono.

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As manchas brancas indicam a presença de micróbios que se alimentam do metano Universidade do Estado do Oregon

Além disso, a Antárctica tem “vastos reservatórios” de metano — acredita-se que contenha até 25% do metano marinho da Terra — que “provavelmente se abrirão” à medida que as camadas de gelo diminuem por causa das mudanças climáticas”. “Esta é uma descoberta significativa que pode ajudar a preencher um grande buraco na nossa compreensão do ciclo do metano”, refere o docente.

O derrame no mar de Ross foi descoberto numa área que os cientistas estudam há mais de 60 anos, mas só em 2011 é que a infiltração se tornou activa. A equipa pôde voltar, já em 2016, ao local para recolher dados, antes de iniciar os trabalhos em laboratório.

Um extenso tapete microbiano”, com cerca de 70 metros de comprimento e um de largura, formou-se no fundo do mar, a cerca de dez metros abaixo da superfície congelada do oceano. Estes “tapetes”, que são produzidos por bactérias, são uma indicação reveladora da presença de um derrame. Não sabemos o que causou estas infiltrações. Precisávamos de um pouco de sorte para encontrar um activo, e conseguimos”, afirma o docente, citado no comunicado.

A maior parte do metano presente na água e nos sedimentos oceânicos é mantida fora da atmosfera pelos micróbios que o consomem, mas Thurber e a restante equipa descobriram que os organismos ao redor da infiltração da Antárctica são diferentes dos encontrados noutras partes dos oceanos do mundo, algo que ajuda a compreender se o metano chegará à atmosfera e contribuirá, ainda mais, para o aquecimento global.

Os investigadores descobriram ainda que o tipo de micróbio mais comum que consome metano demorou cinco anos a aparecer no local do derrame e que, mesmo assim, estes organismos, que chegaram em pouca quantidade, não estavam a consumir todo o metano, o que significa que parte está a ser libertado e “provavelmente está a entrar na atmosfera”, algo que, para o docente, “não são boas notícias”.

Thurber refere ainda que a equipa nunca tinha tido uma oportunidade de estudar uma infiltração, enquanto esta se estava a formar — e nenhuma na Antárctica — e que agora podem perceber se estes fenómenos funcionam de maneira diferente neste continente ou se pode demorar anos até que as comunidades microbianas se adaptem.

“Os animais na Antárctica são muito diferentes dos de outras partes do mundo, uma vez que o continente está separado do resto do mundo há mais de 30 milhões de anos, um longo período de tempo para que a evolução aconteça”, afirma. “Isto resultou numa notável diversidade da fauna que só encontramos lá e pode contribuir também para as diferenças nos micróbios.”

Diz a equipa que é importante entender como o metano se infiltra neste ambiente para que os cientistas possam começar a ter em conta estas diferenças nos modelos de previsão das mudanças climáticas. A equipa espera voltar brevemente ao local da descoberta para monitorizar a sua evolução e realizar mais pesquisas. No entanto, é pouco provável que possam regressar à Antárctica nos próximos tempos. Ainda que o continente não tenha casos de covid-19, o risco de infecção interrompeu os planos de expedição.

Há vários anos que a comunidade científica alerta que o metano pode ser a nova ameaça para o aquecimento global. Em 2008, uma equipa de cientistas já alertava para o facto de o fenómeno de libertação do gás no fundo do mar poder estar relacionado com o rápido aquecimento que já se verificava na região do Árctico.

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