A banhos com a realidade
Muitos pais acham que o risco é aceitável perante o dano que é ficar em casa. Será que os professores não conseguem o mesmo?
A sondagem que hoje publicamos, realizada pela Universidade Católica Portuguesa para a RTP e para o PÚBLICO, mostra que os portugueses estão com os pés bem mergulhados na realidade e que, por contraste, há muitos outros a quem não faria nada mal banharem-se nas mesmas águas.
A começar pelo Governo e pelo primeiro-ministro, que continua a afirmar que não haverá “austeridade”. Se a ideia é trabalhar a confiança do país, já que o aprofundar da crise económica ninguém nega, o resultado não parece estar a ser muito frutuoso, porque, mesmo salvaguardando toda a abrangência da palavra, 66% dos portugueses acham mesmo que vão ter de enfrentar mais austeridade. Se a ideia é afirmar uma opção política – não haverá corte nas despesas do Estado, nem aumento de impostos – então tardam as boas notícias de Bruxelas porque, para os portugueses, pelo lado da economia, não vamos lá: 67% acham que a economia vai estar pior e 71% acham que haverá menos emprego.
Esta contracção da confiança, a par dos naturais receios da pandemia, contribui para o aprofundar da crise num sector crucial, o turismo, já que 60% dos inquiridos já decidiram que este ano não há quem os tire de casa. O sector precisa de trabalhar muito mais para inspirar confiança aos portugueses e fazê-los seguir o “#TuPodes” da campanha de incentivo ao turismo interno.
Mas o dado mais relevante desta sondagem é talvez o facto de a maioria dos pais, 61%, responder que, se, em Setembro, a pandemia estiver no ponto em que se encontra hoje, enviariam os seus filhos para a escola. Se recordarmos que tirar os filhos das escolas foi uma das primeiras reacções no arranque desta crise sanitária, conseguimos perceber que, apesar da incerteza, há uma capacidade crescente para encaixar o vírus numa nova realidade. Um indicador indirecto da forma como os portugueses avaliam o momento actual, reflectido também no facto de haver cada vez menos portugueses em teletrabalho (13%).
Os portugueses percebem bem a realidade dos problemas que enfrentam os alunos, com 41% a considerarem que os seus filhos pioraram o seu rendimento com o ensino à distância, uma percentagem que aumenta entre os pais menos escolarizados, um claro indicador do aprofundar da desigualdade social que representa a falta de ensino presencial. Isto faz de Mário Nogueira, o líder da Fenprof, um natural candidato a um banho na realidade que os pais enfrentam, em vez de insistir nas inqualificáveis ameaças de responsabilizar o Ministério da Educação se algum professor for contaminado. Muitos pais acham que o risco é aceitável perante o dano que é ficar em casa, será que os professores não conseguem o mesmo?