José Sarmento Matos vence Prémio Estação Imagem com reportagem sobre a Venezuela
Fotografia do Ano é de Leonel de Castro, também distinguido na categoria Assuntos Contemporâneos. Exposição dos premiados realiza-se em Loulé, em Agosto.
Um trabalho sobre o fim do sonho venezuelano de uma família luso-venezuelana valeu ao fotojornalista free lancer José Sarmento Matos (n. Lisboa, 1988) o Prémio Estação Imagem 2020, anunciado na tarde deste sábado em Coimbra, no Convento de São Francisco. A Fotografia do Ano foi de Leonel de Castro, Voo de esperança, retrato de uma menina na cidade da Beira no rescaldo da passagem do ciclone Idai. Já a Bolsa Estação Imagem coube ao projecto Interior, de Ricardo Lopes (n. Lisboa, 1990), que lhe valerá um prémio de 4 mil euros destinados ao desenvolvimento de um trabalho documental no distrito de Coimbra, cidade que acolhe o concurso pela terceira vez.
Estes foram os principais prémios da 11.ª edição desta que é a única iniciativa do género na Península Ibérica, que anteriormente passou já também por Mora e Viana do Castelo, e que é destinada a fotojornalistas de Portugal, dos PALOP e da Galiza, além de estrangeiros que trabalhem nestes territórios.
Abandonando o sonho venezuelano é o título do trabalho vencedor, com que José Sarmento Matos, colaborador de publicações como o PÚBLICO, The New York Times e Le Monde ou o canal Aljazeera, acompanha a aventura de uma família de emigrantes luso-venezuelanos que se vê obrigada a abandonar a América e regressar à ilha da Madeira, na sequência da crise humanitária que se vive no país governado por Nicolás Maduro. O fotojornalista acompanhou a vida desta família nos dois países, documentando os dois lados da sua aventura.
Com o seu projecto, Leonel de Castro, nascido na Alemanha, repete a conquista da Fotografia do Ano na edição passada, em que tinha também ganho o principal Prémio Estação Imagem. Voo de esperança resulta da reportagem feita pelo fotojornalista da Global Imagens na cidade da Beira, captando as marcas, físicas e humanas, da destruição provocada pelo furacão Idai. Leonel de Castro conquistou ainda o prémio na categoria Assuntos Contemporâneos, com Os continuadores, sobre a destruição de um orfanato pela mesma intempérie que o ano passado se abateu sobre Moçambique. E recebeu ainda uma menção honrosa, na categoria Vida Quotidiana, com imagens actuais do Grande Hotel da Beira, que nos tempos coloniais foi o maior hotel de luxo de África.
Rui Rio derrotado
Nas diferentes categorias que completam o palmarés do Estação Imagem 2020, o fotojornalista do Expresso Rui Duarte Silva (n. Porto, 1976) venceu na de Notícias, com Derrotado, um retrato do actual presidente do PSD, Rui Rio, quando perdeu as eleições legislativas de 2019; em Vida Quotidiana, o distinguido foi Gonçalo Fonseca (n. 1993), com Nova Lisboa, um trabalho sobre a capital portuguesa tornada “o mercado imobiliário mais popular da Europa”; na de Ambiente, foi distinguido A terra brilhante, trabalho do documentarista galego Carlos Folgoso Sueiro (n. Verin, 1982) sobre duas cidades da Sibéria onde se produzem cerca de 28% dos diamantes de todo o mundo; na Série de Retratos, António Pedro Santos (n. Lisboa, 1974) venceu com O amor de mãe não é cego, retrato de Andrea, uma mãe jovem e quase cega; o ónus da cegueira é também o tema do trabalho que valeu ao free lancer Rodrigo Antunes (n. Lisboa, 1994) o prémio na secção Desporto, Cegueira olímpica, sobre Miguel Vieira, judoca português que participou nos jogos Paralímpicos de 2016, no Rio de Janeiro; e a reportagem sobre a difícil arte de aprender a tourear em tempos de combate contra as touradas, Touros, valeu a Ana Brígida (n. 1986) o prémio Arte e Espectáculos.
Esta fotógrafa e criadora multimédia, que na edição do ano passado foi a vencedora da Bolsa Estação Imagem, viu agora o seu trabalho Sem luz referenciado com uma menção honrosa como Fotografia do Ano. Receberam também menções João Porfírio, por O fogo voltou a incendiar a angústia no centro de Portugal (Notícias); e Sebastião Almeida, por Nacionalidade N/A (Assuntos Contemporâneos).
E o vencedor, este ano, da Bolsa Estação Imagem foi Ricardo Lopes, com Interior, um projecto sobre o fenómeno do despovoamento da Região Centro do país e as histórias de vida dos habitantes das zonas rurais.
Ao PÚBLICO, Luís Vasconcelos, presidente do Estação Imagem, realçou, na edição deste ano, o aumento dos projectos candidatados a esta bolsa, com mais de uma centena de trabalhos, enquanto para as outras categorias foram recebidas cerca de 400 reportagens, um número idêntico ao das edições anteriores. Já sobre a qualidade dos trabalhos, Vasconcelos diz que ela se “manteve constante, o que é de louvar”.
Efeitos da pandemia
A maior dificuldade na montagem da edição deste ano, que também não escapou aos condicionamentos da pandemia, foi encontrar espaços e datas para as várias exposições – as oito mostras do Estação Imagem, que normalmente deveriam ter sido inauguradas em Abril e que só abriram três meses depois e vão manter-se nos diferentes espaços de Coimbra, até 27 de Setembro.
“Na situação em que todos nós vivemos, e que tem impedido que muitas coisas sejam feitas, foi bom termos encontrado, com a ajuda dos responsáveis em Coimbra, uma solução para o prémio deste ano”, diz o responsável pelo Estação Imagem, adiantando que a exposição com as obras vendedoras da presente edição se vai realizar, primeiro, na Galeria de Arte do Convento do Espírito Santo, em Loulé, de 7 de Agosto a 12 de Setembro. Mas com a expectativa de que, no próximo ano, possa ser também mostrada em Coimbra a concluir o ciclo do Estação Imagem 2020.
A pandemia condicionou também, naturalmente, o trabalho do júri, que só pôde reunir-se online, e só o seu presidente, o francês Patrick Chauvel, o mais antigo repórter de guerra em exercício, conseguiu deslocar-se agora a Coimbra. “Ele, desde o início, fez questão em vir à apresentação dos prémios, fosse como fosse”, realça Luís Vasconcelos.
Os outros membros do júri foram o sul-africano Brent Stirton (vencedor de sete prémios World Press Photo, numa carreira representada na edição deste ano pela exposição Guardiões da Vida Selvagem), Felipe Dana, fotojornalista da Associated Press (que mostra em Coimbra a sua reportagem Hong Kong: A luta pela liberdade), e João Silva, repórter do New York Times, que também documentou o fim do apartheid.