Mário Centeno nomeado governador do Banco de Portugal
O ex-ministro das Finanças, que anunciou a sua saída do Governo no início de Junho, assume as suas novas funções já na próxima segunda-feira.
Decorreram exactamente 37 dias desde a data em que o então ministro das Finanças, Mário Centeno, anunciou que iria abandonar o cargo de governante até ao dia em que foi formalizada a sua nomeação para o lugar de novo governador do Banco de Portugal. A aprovação da nomeação de Mário Centeno aconteceu esta quinta-feira, no final do Conselho de Ministros, um dia depois de ter sido aprovado o relatório da audição ao ex-ministro das Finanças no âmbito da proposta de designação para governador do Banco de Portugal, que enfrentou os votos contra do CDS, do BE, do PAN, da Iniciativa Liberal (IL) e do deputado social-democrata Álvaro Almeida.
O relatório, considerado meramente “descritivo”, foi aprovado pela Comissão de Orçamentos e Finanças, com os votos a favor do PS e com a abstenção do PCP e do PSD (que apresentarão uma declaração de voto para que não se confunda a posição sobre o relatório com a posição sobre a nomeação).
O anúncio da saída de Mário Centeno da tutela do ministério das Finanças aconteceu a 9 de Junho, data em que foi também conhecido o seu sucessor, João Leão, que tomou posse a 15 de Junho (e que dias depois formalmente apontou o seu antecessor como sucessor de Carlos Costa). A saída de Centeno do cargo de ministro das Finanças afastou-o também da presidência do Eurogrupo. O ex-ministro deixou a liderança do Eurogrupo a 12 de Julho, oito dias antes de se estrear como governador.
Mário Centeno irá assumir o seu novo cargo já na próxima segunda-feira, sucedendo assim a Carlos Costa que, depois de dez anos como governador da instituição, terminou o seu mandato a 8 de Julho. Em Maio, Carlos Costa, que reconheceu ao seu sucessor “todas as condições para ser um grande governador do Banco de Portugal”, destacou que a instituição que o economista e ex-ministro irá agora liderar é muito diferente daquela que deixou para integrar o executivo de António Costa em 2015. “Vai receber uma máquina que está rejuvenescida, com muitas maiores competências, com uma estruturação muito forte, com um sentido de missão e um foco muito claro”, declarou Carlos Costa.
Ainda que não surpreenda, a nomeação de Mário Centeno foi bastante criticada por vários partidos. A IL e o deputado João Cotrim Figueiredo, deste partido, chegaram a apresentar uma providência cautelar no Supremo Tribunal Administrativo para travar o processo de nomeação por considerarem ilegal o acto que o Conselho de Ministros se preparava para fazer (e que agora consumou).
O tribunal, porém, rejeitou a acção popular por considerar que, com a nomeação, o Governo estaria a praticar um “acto político” e que, nessa medida, a jurisdição administrativa e fiscal não tem competência para apreciar litígios que tenham por objecto a impugnação desse acto. “Ainda que se pudesse censurar eticamente toda a situação” invocada pelo partido da oposição, notou a juíza que assina a decisão, Ana Paula Portela.
A IL sustentou que o Conselho de Ministros iria tomar uma decisão ilegal por considerar que Centeno não cumpre o critério da “comprovada idoneidade” exigido na lei. Alegou que Centeno não tem distanciamento relativamente ao Conselho de Ministros que o designa e alertou que, no exercício da função, o ex-ministro “estará irremediavelmente confrontado no dia-a-dia com múltiplas situações em que terá de invocar ou ponderar conflitos de interesse, sendo que, das duas, uma: ou toma as decisões e pratica os actos mesmo perante um risco de avaliação, percepção e recepção negativa dos mesmos, pondo assim em causa a sua independência de acção e a do próprio BdP; ou terá de se declarar impedido de actuar ou decidir, pondo assim em causa a sua eficácia de acção e a do próprio BdP”. Situações que, dizia, correspondem à “definição objectiva de ‘falta de idoneidade’”.
Para o demonstrar, apresentou cinco exemplos de dossiers da área bancária e financeira com que Centeno teve de lidar como ministro: “no reconhecimento de créditos por impostos diferidos ao Montepio”; “na recapitalização da Caixa Geral de Depósitos”; “no processo do Novo Banco”; “na intervenção no Banif” e “nos empréstimos do Estado ao Fundo de Resolução”.
Quando foi ouvido no Parlamento, Centeno foi confrontado com algumas destas questões e rejeitou que elas pudessem ser impeditivas de exercer a função de supervisor.
Em abstracto — e não se referindo a estes casos concretos —, Centeno disse que “por essa Europa fora” e “por esse mundo fora”, bastaria “pegar no caso de meia dúzia de países” para identificar “mais de 18 governadores, actuais e passados, mas muito recentes na Alemanha, Noruega, Suécia, Grécia, Espanha” que desempenharam funções políticas anteriores.
O PAN propôs — e foi aprovada antes na generalidade no Parlamento, mas não ainda em votação final global — uma lei que prevê um período de nojo de cinco anos entre o exercício de funções governativas na área das Finanças e o desempenho do cargo de liderança do supervisor bancário. Do lado do CDS, houve mesmo um pedido para o processo que levou à nomeação de Centeno deveria ter esperado pelo desfecho do projecto do PAN sobre as regras de nomeação. Esta quarta-feira, a deputada centrista reiterou que o ex-ministro “não vai ter condições”.