FC Porto campeão: Sérgio Conceição, o treinador ideal para situações difíceis

Foi o segundo título em três temporadas para o treinador beirão de 45 anos.

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Sérgio Conceição LUSA/JOSE COELHO

Um campeonato que começa com uma derrota não é um bom presságio para ninguém e nunca o tinha sido para o FC Porto – nunca tinha sido campeão quando perdeu o primeiro jogo do campeonato. Em 2019-20, perdeu o primeiro jogo do campeonato (Gil Vicente) e, logo de seguida ficou fora da fase de grupos da Liga dos Campeões, eliminado pelo Krasnodar. Estávamos a meio de Agosto do ano passado e Sérgio Conceição dizia que nunca seria “um problema para o FC Porto”. Em Janeiro de 2020, após a dupla derrota com o Sp. Braga (para o campeonato e na final da Taça de Liga), Conceição deixou o seu lugar “à disposição do presidente”, ao mesmo tempo que mandava recados para dentro – “difícil trabalhar em determinadas condições”, “sem união dentro do clube”.

Afinal, houve união, as condições não eram assim tão más, Jorge Nuno Pinto da Costa deixou o lugar nas mãos do seu treinador e ele foi mais solução que problema. Sérgio Paulo Marceneiro Conceição, beirão de 45 anos, “inventou” mais uma equipa campeã, sem fazer concessões ao seu estilo. Frontal, sem medo do choque, sem deixar nada por dizer, para dentro e para fora. Com a pele dura para ir seguindo em frente e uma personalidade mais de quebrar que de torcer. Não é imune às críticas e estas não lhe passam ao lado, mas há um objectivo maior que um homem como Sérgio Conceição ao serviço de um clube como o FC Porto tem sempre na mira e acima de tudo.

“Sou treinador de futebol. Tenho de levar com o aplauso, assobio, lenço ou lençol”, dizia Conceição a meio da época, depois de ter vencido o “clássico” no Dragão frente ao Benfica. Sofreu contestação dos adeptos portistas a cada derrota, empate, ou exibição menos brilhante, foi celebrado por esses mesmos adeptos a cada vitória e a cada exibição brilhante – como acontece com todos os treinadores em todos os clubes. Não precisou de gerir expectativas, porque a expectativa era apenas uma – ganhar – e tudo o que fosse abaixo do título seria um fracasso. Que ele próprio seria o primeiro a admitir.

Sérgio Conceição tem sido o treinador ideal para situações difíceis. Quando assumiu o cargo de treinador em 2017, o FC Porto nunca tinha passado tanto tempo sem ser campeão desde que Pinto da Costa assumira a presidência – foram os anos do “tetra” do Benfica. E a aposta não deixava de ser arriscada, um treinador com passado brilhante como jogador, mas sem grande currículo no banco. Não tinha muitos recursos à sua disposição, não havia dinheiro para reforços e teve de se orientar com o que tinha, repescando jogadores que andavam longe das primeiras opções como Marega, Ricardo Pereira ou Aboubakar.

Nessa primeira época, Conceição fez um trabalho de reconstrução e recauchutagem que deu um título de campeão. As expectativas para a época seguinte eram altas e, durante metade da época, o título parecia bem encaminhado, mas não aguentou a voracidade do Benfica de Bruno Lage alimentado pelo talento de João Félix que apenas perdeu dois pontos na segunda volta. Ainda levou a luta pelo título até à última jornada, mas não chegou ao “bi”.

Em muitos clubes, isto seria motivo para uma dança de treinador. E de certeza que, no final dessa época, Sérgio Conceição colocou o seu destino nas mãos de Pinto da Costa. Mas havia outra reconstrução para fazer e o presidente portista, com quase quatro décadas de experiência, sabia que o antigo extremo-direito voltaria a ser o homem certo no lugar certo. Deu-lhe condições (dinheiro para contratar), tempo e confiança total durante toda a época, o que é diferente dos votos de confiança que geralmente são a antecâmara do despedimento.

Foi uma época cheia de sobressaltos para Conceição, que perdeu meia-equipa entre vendas (Militão, Filipe), saídas a custo zero (Herrera, Brahimi) e finais de carreira (Casillas, Maxi Pereira). O fracasso europeu, o arranque em falso no campeonato, mais um falhanço na Taça da Liga, reforços que não renderam o esperado e o sub-rendimento dos que já lá estavam antes. Conceição foi gerindo as várias crises até ao momento em que a maior crise de todas atingiu toda a gente: a pandemia da covid-19 confinou o futebol português durante três meses e recuou todas as equipas até a um momento de forma equivalente a uma pré-época. No desconfinamento, o FC Porto voltou a ter uma falsa partida (derrota com o Famalicão), mas Conceição manteve-se senhor das suas convicções – tal como Pinto da Costa, que, no momento da sua reeleição, garantiu a segurança laboral do seu treinador enquanto fosse presidente.

E essa foi a grande força de Conceição, ser fiel a si próprio. Sempre foi assim, para o bem e para o mal, como jogador e treinador. Desde os castigos de Jorge Jesus nos tempos do Felgueiras, até aos conflitos abertos com António Salvador no Sp. Braga, Sérgio Conceição é “o mesmo gajo de sempre”, como dizia ao PÚBLICO em 2019 Djalmir, um antigo avançado brasileiro que o apanhou, no início de carreira como treinador, no Olhanense.

Olha-se para Sérgio Conceição, o treinador de 45 anos bicampeão pelo FC Porto, e reconhece-se o jogador apaixonado e apaixonante que foi uma das referências de uma grande geração do futebol português. Bem dizia Fernando Santos há uns anos que ele nunca se poderia descaracterizar quando passasse para o banco, que nunca poderia perder esse feitio especial que lhe valeu alguns dissabores, mas também muitas conquistas. “Ele nunca perderá esse feitio”, dizia há uns anos o seleccionador nacional que apenas o apanhou em final de carreira, no PAOK Salónica. “Aliás, não pode perder, até para o futuro dele como treinador. É muito importante a paixão que o Sérgio tem pelo jogo.”

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