A pensar no pior, autoridades sul-africanas abrem mais de 1,5 milhões de covas

O ministro da Saúde sul-africano já avisou que vem aí uma “tempestade” de infecções e que os serviços de saúde entrarão em ruptura nas próximas quatro semanas nas províncias de Cabo Oriental e Gauteng, onde já se começaram a abrir as covas.

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Milhões de sul-africanos vivem em bairros de lata sobrelotados e sem quaisquer condições sanitárias NIC BOTHMA/EPA

A pandemia de covid-19 está a ganhar “grande velocidade” no continente africano e as autoridades da África do Sul já se estão a preparar para o pior. Os responsáveis da província de Gauteng começaram a arranjar espaço para abrir 1,5 milhões de covas por se esperar a ruptura dos serviços de saúde nas próximas quatro semanas. 

“A tempestade sobre a qual temos constantemente avisado os sul-africanos está prestes a chegar. Como nação, temos todas as razões para permanecer unidos nesta luta contra a covid-19”, disse na quarta-feira o ministro da Saúde sul-africano, Zweli Mkhize. “Neste momento, prevê-se que as camas hospitalares planeadas em Cabo Oriental e Gauteng sejam insuficientes”, continuou, salientando que se espera que a capacidade seja ultrapassada nas “próximas quatro semanas”. 

Essa previsão já está a ser levada em conta pelas autoridades da província de Gauteng, a mais pequena na África do Sul, e um responsável admitiu estarem a ser abertas 1,5 milhões de covas para quem não sobreviva à doença. “É uma realidade com a qual teremos de lidar”, disse o responsável sanitário Bandile Masuku.

As palavras do responsável de saúde criaram medo na província densamente povoada e, para acalmar os seus residentes, as autoridades emitiram um comunicado a dizer que ainda “não têm mais de um milhão de covas abertas” e que os números se referem ao total da sua capacidade futura, prometendo ainda estar a melhorar a capacidade dos cuidados de saúde. Mas os números não permitem aos sul-africanos sentir qualquer tranquilidade. 

A África do Sul, com 58 milhões de habitantes, tem até esta quinta-feira mais de 220 mil casos de infecção e 3602 vítimas mortais, de acordo com a contagem da americana Universidade Johns Hopkins. Em meados de Maio, as autoridades sul-africanas registavam diariamente cerca de mil novos casos, mas, esta quarta-feira, quase que se ultrapassaram os nove mil. 

O país foi inicialmente elogiado pela sua rápida resposta à pandemia, ao decretar um duro confinamento (a venda de álcool foi proibida e penas de prisão a quem difundir notícias falsas, por exemplo) e ter delineado um esquema de rastreamento dos contágios, mas a falta de material de testes e equipamento médico tem prejudicado a sua resposta ao longo das últimas semanas, diz o Guardian. O confinamento permitiu às autoridades ganharem tempo e, com os custos económicos e sociais a ganharem dimensão, as autoridades foram forçadas a aliviá-lo. 

É que uma parte significativa da população vive em bairros de barracas, sem quaisquer condições sanitárias e sobrelotados, e o confinamento retirou a muitos sul-africanos o pouco rendimento que tinham para sobreviver. Milhões viram-se forçados a arriscar o contágio para sobreviver, e os serviços de saúde sul-africanos são insuficientes para dar resposta a todos os pacientes. 

“O que podemos fazer? Uso máscara, mas estamos todos juntos aqui. Tenho de viajar em táxis [comunitários] e aí fazemos o nosso melhor, mas estamos todos muito próximos”, disse ao Guardian Lucy Ndlovu, residente no município de Alexandra, em Joanesburgo. 

O continente africano é uma das principais preocupações com a pandemia e o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças de África registou um aumento de 24% de novos casos em apenas uma semana. “A pandemia está a ganhar grande velocidade”, disse numa conferência de imprensa John Nkengasong, responsável máximo da organização. 

África identificou até esta quinta-feira mais de 512 mil casos e registou 11,915 mortes, de acordo com dados dos governos e da Organização Mundial de Saúde compilados pelo Guardian. Mais de 70% das infecções estão concentradas no Egipto, Nigéria, África do Sul, Gana e Argélia. E teme-se que haja muitos mais casos fora das estatísticas oficiais. 

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