Lesados do dieselgate podem processar Volkswagen em Portugal
Grupo alemão contestava jurisdição estrangeira e exigia que queixas fossem julgadas na Alemanha, mas o Tribunal de Justiça da União Europeia contrariou essa interpretação.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) decidiu que os consumidores prejudicados pela Volkswagen no caso dieselgate não têm de depender da Justiça alemã e podem processar o fabricante germânico de carros no país onde adquiriram o carro defeituoso.
O veredicto contraria assim a regra geral de que as disputas judiciais no espaço da União Europeia devem ser dirimidas no país em que está sediada a entidade que é processada. Como a sede da Volkswagen está em Wolfsburgo, na Alemanha, os advogados do fabricante alemão contestavam a jurisdição de tribunais de outros países para decidirem sobre queixas de consumidores que adquiriram carros daquela marca com motores equipados com um mecanismo que falseava as leituras das emissões gasosas.
Porém, para a mais alta instância judicial da UE, sediada no Luxemburgo, em caso de dolo, nestes processos cíveis que visam ressarcir consumidores que saíram financeiramente lesados, é admissível que sejam os tribunais nos países de residência dos referidos consumidores a decidir.
Isto significa que lesados em Portugal poderiam, de forma isolada ou em grupo, recorrer à Justiça portuguesa. Porém, o sucesso desse recurso dependeria sempre do desfecho que tenha sido dado a cada caso. Sabe-se que em Portugal foram identificados cerca de 125 mil veículos com motores equipados com o mecanismo fraudulento no motor, segundo contas feitas em Novembro de 2015. Até ao final de 2017, cerca de 80% receberam uma actualização de software.
Seja como for, a decisão do TJUE abre, no fundo, a porta a uma miríade processos nacionais, que poderão assim ser decididos em diferentes jurisdições, como já sucedeu no caso dos EUA, onde a marca acabaria por concluir um acordo multimilionário.
O caso dieselgate, descoberto em 2015, custou à Volkswagen 30 mil milhões de dólares (cerca de 26,54 mil milhões de euros) em multas, reparações, acordos e provisões. A decisão do TJUE tem por base um pedido de um tribunal austríaco, que foi chamado a pronunciar-se sobre uma queixa que envolve 574 consumidores, representados no processo pela associação de consumidores VKI, e que compraram um carro da marca equipado com um dos motores que usavam o tal mecanismo fraudulento.
Estes queixosos alegavam que não teriam adquirido tais veículos, ou que teriam direito a um preço 30% mais barato, se soubessem da existência desse mecanismo, que era do conhecimento da cadeia de comando da VW, conforme a marca já admitiu.
O fabricante alemão contestava a jurisdição do tribunal austríaco, que, assim, pediu ao TJUE que interpretasse e aclarasse a regulação da jurisdição neste caso.
O TJUE confirma que, “em princípio”, o recurso à Justiça deve ser feito no país em que o acusado está sediado. Contudo, “em caso de dano doloso também é possível haver acções no território onde ocorreu o dano”. Cabe aos queixosos decidir onde pretendem que o caso seja julgado, lê-se no sumário da decisão, já disponível na Internet.
Na opinião do TJUE, o dano ocorreu quando tais veículos foram comprados a um preço superior ao valor real. A VKI quer que a marca compense os consumidores com a diferença entre o preço pago e o valor de um carro manipulado.
O grupo alemão, que é o maior fabricante do mundo, não comentou até ao momento esta decisão, diz a Reuters.
Nos EUA, escreve a mesma agência, “praticamente todos os donos de carros afectados entraram num acordo geral que custou 25 mil milhões de dólares à VW, que continua em conversações na Alemanha no âmbito de um processo que envolve múltiplos consumidores”.