Anticorpos “desapareceram” em 14% dos participantes com testes positivos do estudo serológico de Espanha
Especialistas dizem que estes resultados não significam que as pessoas tenham perdido imunidade e que essa percentagem pode estar relacionada com a sensibilidade dos testes.
Esta semana foram publicados os resultados da terceira e última fase de um estudo de seroprevalência feito em Espanha. Tal como já se tinha divulgado nas outras fases, esses resultados mostram que 5% das pessoas que participaram no estudo têm anticorpos contra o vírus. Também se indica que 14% dos participantes que tinham certos anticorpos na primeira fase do estudo agora já não os têm. Especialistas dizem que isto pode não querer dizer que essas pessoas perderam imunidade ao coronavírus e que esse resultado pode estar relacionado com a falta de sensibilidade dos testes.
Denominado ENE-Covid, o estudo de seroprevalência em Espanha foi liderado pelo Instituto de Saúde Carlos III e teve a colaboração do Instituto Nacional de Estatística espanhol. Com uma representação nacional, este estudo foi dividido em três fases separadas por 21 dias e envolveu mais de 68 mil pessoas e cerca de 36 mil habitações.
Nas outras duas fases já se tinha verificado que 5% dos participantes tinham anticorpos contra o vírus. Publicados na revista científica The Lancet, chegam-nos agora os resultados da terceira fase e mostram que 5,2% dos espanhóis mostram terem anticorpos. “Isto mostra que, se um país tão fustigado como Espanha tem estes números, a imunidade de grupo é muito difícil de conseguir”, afirmou Marina Pollán, directora do Centro Nacional de Epidemiologia de Espanha, na apresentação nos resultados, citada pelo jornal espanhol El Mundo.
Outra das informações a destacar é que 14% dos participantes que tinham testes positivos na primeira fase para os anticorpos IgG tiveram testes negativos nesta fase. Os anticorpos IgG aparecem normalmente na segunda semana após a infecção e mantêm-se durante mais tempo, que poderá ser de meses ou anos, dependendo do tipo de vírus que provoca a infecção.
Também já entre a primeira e a segunda fase do estudo 7,1% das pessoas que tinham tido testes positivos passaram a ter testes negativos, de acordo com o El Mundo. Acrescenta-se ainda que, segundo o estudo, a perda de anticorpos é mais comum em pessoas que não tiveram sintomas. Já num estudo publicado na revista científica Nature Medicine em Junho se referia que os infectados assintomáticos podem perder anticorpos de forma mais rápida.
Marina Pollán esclareceu que o “desaparecimento” destes anticorpos não significa que as pessoas tenham perdido a imunidade ao coronavírus e indicou que pode ter existido uma possível falta de detecção dos anticorpos nos próprios testes. “Temos de pensar as ferramentas que usamos para detectar os anticorpos são as melhores que há, mas não são perfeitas. Os testes rápidos não são capazes de detectar a 100% os anticorpos e, o facto de não os termos detectado, não significa que não estejam presentes”, afirmou, acrescentando que pode existir memória imunitária nas células. “A imunidade celular também parece ter um papel importante nesta doença.”
Mesmo assim, Raquel Yotti, directora do Instituto de Saúde Carlos III, pediu cautela à população que já foi infectada. “Ao longo de todo este estudo temos repetido que ter anticorpos não implica ter imunidade total e, embora se possa ter imunidade, não sabemos durante quanto tempo dura. Isso é algo que ainda não sabemos”, notou. “Contudo, sabemos que a imunidade pode ser incompleta e, por isso, peço também prudência aos cidadãos que já tiveram a doença e que acham que não devem usar máscaras ou não devem respeitar o distanciamento social.”
Também no artigo publicado na The Lancet se pode ler: “Estes resultados enfatizam a necessidade de manter medidas de saúde públicas para se evitar uma nova onda epidémica.”