Saúde mental LGBT+: pode o arco-íris entrar nos consultórios?
Muitas pessoas LGBT+ enfrentam alguma forma de mal-estar psicológico acentuado. É importante que, procurando ajuda em saúde mental junto de profissionais e serviços clínicos, encontrem cuidados profissionais adequados e inclusivos.
As culturas e as comunidades queer constituem-se desde há muito como espaços de acolhimento e apoio, cuidado mútuo, valorização identitária e presença política. Dos seus esforços, juntamente com a transposição dos princípios de defesa dos direitos humanos para a legislação e as políticas na sociedade portuguesa, decorreu o ainda recente percurso de evolução social positiva. Esta maior inclusividade reflecte-se nas relações familiares e de amizade, na comunicação social, nas expressões artísticas, nos valores comuns e no mundo do trabalho. Nesta ecologia do bem-estar psicológico das pessoas LGBT+, não podem ficar de fora profissionais e serviços de saúde mental. Mais ainda quando, perante primeiros dados sobre o impacto da pandemia de covid-19, percebemos que estas pessoas se deparam com obstáculos adicionais no acesso a suporte social, apoio de vizinhança e cuidados de saúde.
Nos cursos de saúde pré-graduados e na instrução contínua de profissionais, são recentes e restritas as oportunidades formativas sobre questões LGBT+, habitualmente proporcionadas por docentes com investigação na área, núcleos de estudantes LGBT+ e organizações de base comunitária. O acesso a estes conteúdos possibilita que se tome consciência das próprias crenças e atitudes relativamente ao género e à sexualidade, que se adquira conhecimentos sobre este campo da saúde e se treinem práticas para adequação dos cuidados prestados. Importa também reconhecer a intersecção de outras dimensões culturais, sociais e económicas — como a pobreza e a racialização — como determinantes de saúde.
Em saúde mental, são necessárias duas aptidões adicionais: por um lado, reconhecer os efeitos da discriminação, da hostilidade e da violência tanto para o bem-estar psicológico, como para as relações interpessoais e institucionais, incluindo a interacção com profissionais e serviços de saúde mental; por outro, afirmar a inexistência de carácter patológico na diversidade sexual e de género, reflectindo a construção científica. As intervenções que reforcem o auto-estigma, pretensamente visando uma modificação da orientação sexual ou da identidade de género (nunca demonstrada), são reconhecidamente lesivas para a saúde mental e, portanto, como reafirmado pela Ordem dos Psicólogos Portugueses relativamente à orientação sexual, não têm validade científica nem ética.
A inclusão da diversidade sexual e de género nos espaços da saúde depende não só da atitude e da capacitação de cada profissional, mas também da adaptação das instituições e das políticas em saúde. São de sublinhar os esforços governamentais de implementação de práticas antidiscriminação e boas práticas clínicas, em diálogo com as comunidades, com a academia e com profissionais de campos fundamentais, como o da saúde. É premente uma saúde declaradamente afirmativa da diversidade e atenta às necessidades particulares, que possa ser reconhecida pelas pessoas LGBT+ como espaço confortável e qualificado. Em tempos de pandemia, é mais nítido o valor da cooperação, da interajuda e da solidariedade — e, em mês de Orgulho, a luta pela equidade é de e para toda a gente.