Segurança Social rejeita apoios a recibos verdes, precários contestam razões

Alguns pedidos que estiveram semanas “em análise” tiveram resposta negativa. Precários Inflexíveis insurgem-se: perante a “vida suspensa” dos trabalhadores, a Segurança Social apresenta justificações “lacónicas”.

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A ministra do Trabalho recebeu recomendações da Provedora de Justiça para alargar os apoios LUSA/ANTÓNIO COTRIM

trabalhadores independentes que estiveram mais de dois meses à espera que a Segurança Social decidisse se teriam, ou não, acesso ao apoio por quebra ou paragem da actividade.

Durante semanas, o requerimento aparecia na página Segurança Social Directa como estando “em análise” e, nos últimos dias, algumas pessoas começaram a ser notificadas do indeferimento, com justificações que a Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis considera “lacónicas” e pouco claras. Tanto mais, lembram, “perante quem tem a vida suspensa pela ausência de qualquer protecção”.

Num comunicado enviado às redacções nesta sexta-feira, o movimento de Precários afirma que o Instituto da Segurança Social está a recusar os pedidos sem fundamentar a decisão devidamente, apresentando justificações genéricas. “Os indeferimentos agora comunicados são, em muitos casos, apenas justificados com frases como ‘trabalhador independente não exclusivo’, ‘qualificação não cumpre os requisitos da medida’ ou ‘trabalhador não cumpre a condição de acesso ao apoio’”.

A “falta de informação rigorosa e clara”, por não haver “referências explícitas à situação concreta e às respectivas normas legais que justificam os indeferimentos”, diz a associação, “impede a compreensão e dificulta a eventual contestação” das decisões. “Não cumprir os “requisitos” ou a “condição de acesso” ao apoio é uma justificação simplesmente inaceitável e que não permite identificar o motivo para a exclusão”, afirma.

O apoio aplica-se aos trabalhadores abrangidos exclusivamente pelo regime dos trabalhadores independentes, deixando de fora, por exemplo, quem tem um trabalho por conta de outrem a tempo parcial e acumula com a prestação de serviços, um facto que já mereceu reparo da Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral.

E a informação que tem chegado à Associação de Combate à Precariedade é a de que os casos mais frequentes de indeferimento são justificados “com o facto de o trabalhador ou a trabalhadora ter outras fontes de rendimento para além do trabalho independente”. E alega: “O Governo nunca esclareceu, nem mesmo na portaria que foi tardiamente publicada e que deveria regulamentar o apoio (portaria n.º 94-A/2020, de 16 de Abril), em que termos a acumulação de fontes de rendimento (nomeadamente, com trabalho por conta de outrem) é impeditiva de receber o apoio, sobretudo qual o horizonte temporal que é tido em conta. Não faz sentido excluir do apoio quem esteve e está abrangido pelo regime dos trabalhadores independentes e, nessa condição, teve uma forte ou total quebra de rendimentos, apenas por terem ocorrido rendimentos por trabalho por conta de outrem com um peso relativo muito pequeno quando comparado com os de trabalho independente”.

Relatos idênticos foram também chegando à Provedora de Justiça, que, em Abril, confrontada com um “crescente o número de queixas”, escreveu ao Governo afirmando “não ser justo” que “estes trabalhadores, que se esforçam no exercício de duas actividades e duplamente contribuem para o sistema de segurança social”, vejam “agora negado, no actual contexto, o acesso aos apoios relativamente à sua principal actividade e fonte de rendimento”.

Foi o que sucedeu com vários trabalhadores que deram a conhecer o seu caso à associação. “Entre os vários relatos que nos chegaram, há situações em que a exclusão parece ter-se baseado no facto de uma pequena fracção dos rendimentos ter origem em trabalho por conta de outrem. Em alguns casos, a simples existência de um contrato de trabalho, de curta duração e há vários meses atrás, muito antes de a medida vigorar, parece ter sido suficiente para negar um apoio essencial para quem ficou sem qualquer rendimento.” Esta realidade leva o Precários Inflexíveis a considerem que “não é aceitável que, depois de meses de espera, perante a ausência de referências concretas nos diplomas legais, seja seguida uma interpretação restritiva pelos serviços.” E defende: “A situação em que se encontram estas pessoas, há meses com pouco ou nenhum rendimento e sem qualquer apoio, exige uma solução imediata.”

É um apelo que faz ao Governo. Em Julho, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, prevê implementar um apoio de 438,81 euros, (que durará no máximo seis meses, até Dezembro) para abranger os trabalhadores independentes e informais em situação de desprotecção social, faltando ainda saber que situações concretas abrangerá — e se apanha casos como estes, porque a informação conhecida até agora sobre a filosofia da medida parece centrar-se no apoio a trabalhadores que não estão neste momento vinculados ao regime da Segurança Social, o que não é o caso daqueles cidadãos excluídos.

Entretanto, no Parlamento, está para discussão na especialidade — já aprovado na generalidade — uma iniciativa do Bloco de Esquerda que, com o mesmo valor mensal (438,81 euros), abrange as várias situações que estão a descoberto, pois abrange os trabalhadores por conta de outrem e trabalhadores independentes e trabalhadores informais excluídos de outros apoios (incluindo os advogados e solicitadores inscritos na Caixa de Previdência).

A Associação de Combate à Precariedade alerta igualmente para o facto de haver cidadãos que ainda continuam à espera de resposta da Segurança Social para receberem o primeiro apoio mensal, e pede responsabilidade ao Governo sobre os atrasos. “Continuamos a receber diariamente relatos de trabalhadores e de trabalhadoras que continuam à espera de uma resposta, estando já a entrar no quarto mês com poucos ou nenhuns rendimentos. Três meses para dar sequência a um pedido urgente, num procedimento que deveria ser expedito, é uma demora injustificável e que tem impactos brutais”, escreve.

O regime dos trabalhadores independentes abrange não só quem trabalha para uma empresa a recibos verdes pelos serviços prestados, mas também, por exemplo, os empresários em nome individual com rendimentos da actividade comercial e industrial, os donos de estabelecimento individual de responsabilidade limitada ou os produtores agrícolas que realizem exploração agrícola.

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