Inquérito da CIP: 53% das empresas continuam à espera do crédito

Uma em cada quatro empresas lançou novos produtos ou serviços, poucas procuraram novos mercados, mas o comércio digital subiu em flecha. E 96% voltou ao trabalho.

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Diversificação de produtos e serviços na saúde e no software foram algumas das saídas mais importantes para 19% das empresas Nelson Garrido/Arquivo

A proporção de empresas que continuam fechadas é agora pouco mais do que residual. A fazer fé no mais recente inquérito às empresas promovido pela Confederação Empresarial de Portugal (CIP) e o Future Cast Lab do ISCTE, apenas 4% dos gestores inquiridos disseram que a empresa continua fechada. O resto já reabriu, total ou parcialmente, mas o impacto da pandemia continua a fazer-se se sentir. Umas vezes pela positiva, noutros casos pela negativa.

Com base numa amostra de 652 empresas, não aleatória e portanto não representativa do tecido empresarial português, o inquérito mostra que o número de empresas que já receberam os apoios bancários a que se tinham candidatado cresceu oito pontos percentuais, para 47%, mas como salienta o vice-presidente da CIP, Óscar Gaspar, este dado também pode ser lido ao contrário. “Apesar de se notar aqui uma grande evolução, podemos dizer que ainda há 53% das empresas que continuam à espera do financiamento e não nos podemos esquecer que os pedidos começaram a ser entregues em Abril”, salienta.

Pelos dados, o regresso ao trabalho parece ser uma realidade transversal (a percentagem de empresas em layoff é de 24%, a mais baixa desde o início destes inquéritos periódicos, a 4 de Maio), até porque para muitos dos gestores inquiridos, não havia outra solução. Mais de três quartos dos respondentes dizem que não se poderia viver à custa do Estado, porque os apoios que este concede ficam aquém (61%) ou muito aquém (17%) do que é preciso.

Pelo contrário, os apoios da União Europeia já merecem nota positiva da maioria: 66% consideram o pacote proposto entretanto pela Comissão Europeia razoavelmente adequado (50%), adequado (15%) ou muito adequado (1%). Não foi sempre assim: há duas semanas, antes de ser conhecida a proposta da Comissão Europeia, que destina 15,5 mil milhões de subvenções (dinheiro a fundo perdido) a Portugal e mais 10,8 mil milhões em empréstimos, somente 49% dos gestores inquiridos davam nota positiva à UE.

É uma notória “evolução” na opinião dos empresários, constata Pedro Dionísio, do Future Cast Lab do ISCTE, que estará relacionada com o conteúdo desse pacote de ajuda, que agora terá o teste de fogo, quando estiver em cima da mesa do Conselho Europeu, que se reunirá no final desta semana. “Esta pode ser uma semana decisiva. É um bom plano e agora esperamos que passe para uma boa implementação”, comenta Óscar Gaspar.

Ainda do lado positivo, diz a CIP, há a registar as marcas de “inovação” e de “empreendedorismo” que a pandemia também deixou numa parte (pequena) do tecido empresarial. Este inquérito pretendia avaliar se tinha havido um esforço de diversificação das empresas em termos de produtos ou serviços, mercados e canais e o retrato que emerge a partir desta amostra resume-se em três ideias: apenas 9% das empresas procuraram diversificar mercados nos últimos três meses; somente 19% dos respondentes dizem ter apostado na diversificação com novos produtos ou serviços; e o número de empresas que passou a vender digitalmente cresceu 43,2%.

“Três meses parecem anos, atendendo à transformação que tem estado a acontecer”, comenta Óscar Gaspar, olhando para estes dados e destacando o acréscimo de 19 pontos percentuais no comércio digital. Antes da pandemia, 44% vendia online. Agora, segundo o inquérito, são 63%, uma variação de 19 p.p., ou 43,2%. É um resultado ainda mais importante no quadro das apostas do programa de ajuda da UE, insiste o vice-presidente da CIP. O comércio digital é uma das apostas da Comissão Europeia e este cenário significa que as empresas portuguesas “se posicionaram de uma forma mais forte”.

Tão importante quanto essa ideia de aquisição de um novo canal é o impacto estimado da abertura de novas formas de vender. Entre as empresas que recorrem ao comércio online, este representa agora 23% das vendas.

Porém, não dá para embandeirar em arco, porque esta realidade ainda está demasiado circunscrita - e segundo Bruxelas, Portugal tem ainda muito que fazer para evoluir no desempenho digital. Mais de um terço desta amostra não tem vendas digitais. E a procura de novos mercados foi praticamente residual: apenas 9% se esforçaram nessa tarefa, sendo que as conquistas foram maiores no mercado interno do que na exportação.

Os autores desta série de inquéritos, a que deram o nome Sinais Vitais, realçam, mesmo assim, que houve muita gente a tentar reagir à adversidade. Prova disso, afirmam, é que 19% (uma em cada cinco empresas) arriscaram diversificar produtos e serviços. E o que é igualmente relevante, dois terços (65%) afirmam que essas novidades no portefólio vieram para ficar.

Houve mais produção e comercialização ligada à saúde (máscaras, viseiras, equipamentos de protecção) mas também houve mais produção e comercialização de outros produtos e serviços, com destaque para o software.

Estes esforços de inovação foram por vezes feitos em parcerias, mas na maior parte dos casos, foram decisões executadas de forma autónoma. Com resultados assinaláveis, sobretudo nas empresas industriais, diz a CIP: os produtos e serviços novos lançados nestes últimos três meses são agora uma parte significativa do negócio dessas empresas, representando entre 11% e 24% da facturação.

Fosse na diversificação de produtos, de mercados ou de canais de venda ou formas de vender, tratou-se de um esforço maioritariamente empresarial. De acordo com os dados, o número de empresas que recorreram a apoios públicos para financiarem essas actividades foi geralmente baixo, entre 8%, 11% e 13%.

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