Em Covelas, Trofa, começa a desenhar-se oposição a aterro da Resinorte

Empresa que trata os resíduos de 35 municípios da região iniciou o licenciamento de uma nova infra-estrutura. Câmara e Junta não estão contra, mas Santo Tirso opõe-se.

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O novo aterro da Resinorte poderá acomodar 149 mil toneladas de resíduos LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO

A Resinorte, uma empresa do grupo EGF que gere os resíduos urbanos de 35 municípios da Região Norte, iniciou em Janeiro deste ano os procedimentos para licenciamento de um novo aterro sanitário na freguesia de Covelas, Trofa. A Comissão de Coordenação da Região Norte (CCDRN) ainda aguarda vários pareceres para decisão final mas, numa fase em que populações de outras zonas do país como Valongo, Lousada e Azambuja se levantam contra os impactos de infra-estruturas deste género, também em Covelas começam a levantar-se algumas vozes, apesar de o projecto ter a concordância da câmara e não merecer reparos ao presidente da Junta. 

O autarca de Covelas, Feliciano Castro, admitiu ao PÚBLICO que gostaria muito de poder organizar uma sessão pública com os seus fregueses, cerca de 1600 pessoas que moram numa freguesia rural na fronteira com o vizinho concelho de Santo Tirso. Depois de ter participado, com o restante executivo e assembleia de freguesia, numa reunião com a Resinorte, o presidente da Junta admite que não antevê, para a localidade, o mesmo tipo de problemas que têm levado as populações de outros concelhos a manifestarem-se, mas lamenta que, com as actuais limitações a reuniões com muitas pessoas por causa da covid-19, não se possa esclarecer, presencialmente, as dúvidas e receios que já levaram, inclusivamente, à criação de um grupo no Facebook, no qual está a ser convocada uma manifestação para o final do mês. 

Conhecida na região pelos maus cheiros e outros problemas ambientais provocados durante anos e anos pela Sociedade Avícola do Norte, a Savinor, Covelas livrou-se dessa situação, explicou, com os investimentos feitos nos últimos anos pelo grupo Soja de Portugal, que comprou esta empresa. Mas os odores desagradáveis - que num ou outro dia ainda se sentem, segundo o autarca - entranharam-se na memória dos habitantes que, agora, temem pelos efeitos da instalação de uma “lixeira”, como já vão designando o investimento da Resinorte. “As pessoas estão mal informadas e dizem estas coisas nas redes sociais”, lamenta o presidente de junta, que perante a localização do empreendimento, “bastante afastado de casas”, o tipo de resíduos que lá entrarão e as condições de acondicionamento, não vê motivo para alarme.

Aterro para 20 anos

Segundo a CCDRN, o novo aterro está enquadrado nas obrigações vigentes no contrato de concessão desta empresa e vai receber “refugos” de triagem para Tratamento Mecânico e Biológico e “triagem de embalagens leves existentes no CITVRU - Centro Integrado de Tratamento e Valorização de Resíduos de Riba de Ave [Famalicão] e os resíduos indiferenciados que não apresentem potencial de valorização, provenientes dos municípios”. Terá duas fases ao longo de 20 anos de vida útil e duas células, com capacidade para 1,34 milhões de metros cúbicos cada uma, o que dá para algo como 149.000 toneladas de lixo urbano. 

Situado numa área de Reserva Ecológica Nacional, o novo aterro da Resinorte é um prolongamento no terreno, e no lado da Trofa, do antigo aterro de Santo Tirso, já selado, e segundo informação prestada pela CCDRN é totalmente independente desta infra-estrutura. Da qual aproveitará apenas uma conduta da Tratave, entidade que trata as águas residuais da bacia do Ave, para escoamento dos lixiviados que venham a ser gerados pelos resíduos que ali serão depositados. No entanto, esta semana, perante o anúncio desta localização, a Câmara de Santo Tirso já veio dizer que se opõe ao licenciamento por temer a reactivação da infra-estrutura situada no seu território e os impactos do novo aterro do concelho vizinho.

Já o presidente da Câmara da Trofa, Sérgio Humberto, enfatizou em declarações à Lusa esta semana que a instalação do aterro “cumpre uma legislação muito exigente”. “As indicações técnicas que tenho é que é um aterro sanitário que cumpre todos os requisitos e que não provoca qualquer tipo de constrangimento”, disse ainda o autarca da Trofa, reiterando que “o impacto para o município e para a população é zero. Não há cheiro, nem contaminação das linhas de água”. 

A deposição de resíduos em aterro é, na hierarquia dos processos de gestão do lixo, a última opção, e a União Europeia já avisou os Estados Membros que em 2035 cada país só poderá enterrar, no máximo, dez por cento dos desperdícios que produz, aumentando, desta forma, as exigências quanto ao reaproveitamento destes materiais. Portugal continua muito longe destas metas, falhou inclusivamente os objectivos para 2020, que foram empurrados para 2022, e terá forçosamente de investir muito mais na recolha selectiva para alcançar as metas. 

Esta semana, perante os protestos de populações em vários concelhos, e na ressaca do fim das autorizações de importação de resíduos, a Associação das Empresas Portuguesas do Sector do Ambiente (AEPSA) defendeu um debate “sério” sobre a deposição de resíduos em aterros, sublinhando que se trata de infra-estruturas “fiáveis” e “fundamentais para uma política ambiental sustentada”. Qualquer comparação de aterro com “lixeira revela um total desconhecimento técnico que importa esclarecer e combater”, ressalva a AEPSA.

 
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