Ministro da Educação não tem dúvidas de uma segunda vaga, mas espera começar ano lectivo em Setembro
No dia em que os alunos do 11.º e 12.º anos regressaram às salas de aula, o ministro da Educação comentou em entrevista à RTP3 este desconfinamento e o que poderemos esperar para o futuro.
O ministro da Educação revelou esta segunda-feira à noite, em entrevista ao programa 360º da RTP3, que o Governo espera que o próximo ano lectivo comece ainda em Setembro, embora admite que vão ser necessários alguns ajustes. “Existe um calendário que necessariamente terá de ser ajustado, porque nós tivemos que ajustar a primeira e segunda fase de exames deste ano”, afirmou Tiago Brandão Rodrigues, salientando, porém, que o próximo ano lectivo “começará ainda em Setembro”. “É isso que desejamos”, disse.
O governante destacou que são as autoridades de saúde que dão “as orientações relativamente a todas as decisões” que o Ministério da Educação toma e que, caso o próximo ano lectivo comece efectivamente em Setembro, “teremos que ter adaptabilidade ao próximo calendário e, de certa forma, a todos os momentos que são naturais num ano escolar e irmo-nos adaptando àquilo que será eventualmente a existência de um nova onda do surto epidemiológico”.
Quanto à possibilidade de haver uma segunda vaga do surto causado pelo novo coronavírus, Tiago Brandão Rodrigues não revelou ter dúvidas: “Ela existirá certamente. Agora aquilo que temos de entender é que dimensão terá”, notou o ministro, que é licenciado em bioquímica.
Alunos mais velhos “têm outra maturidade"
A entrevista começou com o ministro da Educação a admitir que “é importante aprender, da mesma forma que as comunidades educativas, coadjuvadas pelo Ministério da Educação, têm tentado fazer”. “Temos tentado, entre todos, ser humildes, cautelosos e providentes e acho que é o que continuaremos a fazer. Hoje entendemos que, como sociedade portuguesa, podemos ter um enorme orgulho dos nossos professores, que uma vez mais deram um passo que era necessário dar e das famílias que confiaram nas escolas”.
Tiago Brandão Rodrigues salientou também que o regresso dos “alunos mais velhos” às escolas aconteceu “com segurança e confiança”, admitindo que os jovens “têm outra maturidade”. “Por muito que sejam irreverentes, eles entendem a extensão e as consequências dos seus actos e, por isso, é mais fácil eles entenderem as regras”, afirmou.
Além disso, o responsável pela pasta da Educação notou que “era mais fácil preparar” as escolas secundárias, pela sua dimensão, e “ter todos os circuitos” para que o regresso aconteça com as devidas precauções. Tiago Brandão Rodrigues admite que será necessário trabalhar, em todos os níveis de escolaridade, no próximo ano “para recuperar aquilo que aparentemente pode ser irrecuperável, mas temos que lutar para que assim não seja”.
Desigualdades agudizam-se
O ministro destaca que as estatísticas revelam que “os alunos do 11.º e 12.º anos são aqueles onde a taxa de retenção, isto é, os chumbos, e as taxas de abandono [escolar] são maiores”. “Sabemos que muitos destes alunos nestas idades em concreto são naturais candidatos ao abandono escolar e, por isso, temos que trabalhar e sabemos que o sítio onde conseguimos, ainda assim, ter maior cuidado e um sistema de ensino mais igualitário é no ensino presencial, dentro de sala de aula, onde se esbatem todas essas diferenças de partida socioeconómicas e familiares que conhecemos”, nota.
“Numa situação como a que vivemos agora”, é essencial garantir uma “diminuição dessa diferença, num trabalho feito pelas escolas, pelas autarquias e pela sociedade civil”. “Mas não podemos não dizer que, de certa forma, o que acontece é que numa situação em que cada um dos alunos está em casa com a sua família e no seu meio socioeconómico, as diferenças e desigualdades se agudizam. Não há rodeios, é mesmo assim”, sublinha.
Aprendizagens com o ensino à distância
O ministro da Educação não tem dúvidas de que as aprendizagens que foram retiradas do ensino à distância não serão desperdiçadas. “Obviamente que todos temos muito que aprender e, por isso, foram tão complexas aquelas duas primeiras semanas antes da interrupção lectiva da Páscoa”, altura em que os pais que estavam em casa “viram a quantidade de trabalho a chegar por parte de professores que também não estavam habituados ao ensino à distância”. Foi então que “paulatinamente fomos entendendo como a sociedade portuguesa se ia adaptando”. “Todas essas aprendizagens vão ser valiosas. Eu não sou daqueles que acredita que esta pandemia pode ser uma oportunidade, não é. É uma calamidade. Mas há muitas aprendizagens a saírem daqui e o que nós sabemos é que o salto em termos tecnológicos e digitais do ensino à distancia, do que é a avaliação e interacção à distância, pode ser uma mais-valia obviamente para o próximo ano lectivo porque sabemos que vamos ter que conviver com este novo coronavírus durante pelo menos mais um Inverno”, afirma.
Tiago Brandão Rodrigues nota que as autoridades não sabem ainda “qual vai ser o nível de penetração do surto epidemiológico na sociedade portuguesa”, mas salienta que “o Ministério da Educação está a trabalhar em vários cenários”, considerando a hipótese de este novo coronavírus existir “de forma incipiente na sociedade portuguesa” e de “poderemos viver [com ele] como vivemos habitualmente com o vírus da gripe” ou outros cenários que exijam alguns “compromissos no ensino presencial” e a conjugação do ensino presencial com o ensino não-presencial.
Papel social da escola
Tiago Brandão Rodrigues salienta ainda “o papel social da escola”, nomeadamente “na monitorização das crianças em risco”, garantindo que o Ministério da Educação tem trabalhado em colaboração com as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ). “Não podemos deixar de entender que a escola é um serviço público de proximidade que está praticamente em todo o território. Não temos, nos dias de hoje, uma escola em cada freguesia do país, mas temos muitas escolas em cada um dos nosso concelhos e basicamente a escola tem também uma resposta social e essa resposta social foi mantida durante este surto epidemiológico. Quando tínhamos o país praticamente fechado, não tínhamos praticamente nenhum serviço público a funcionar, a não ser obviamente os serviços de saúde e poucos mais, as escolas mantiveram-se abertas”, reiterou o ministro, salientando que, por um lado, as escolas permaneceram abertas “para receberem os filhos dos chamados trabalhadores essenciais — das forças de segurança e trabalhadores dos serviços de saúde e agora, por exemplo, dos professores que voltaram à escola” — e, por outro, para fornecerem refeições. “Começámos devagar, com 3000 ou 4000 refeições por dia e agora já temos, a cada dia, cerca de 24 ou 25 mil refeições para os alunos da acção social escolar e sabemos bem que, para muitos destes alunos, a refeição diária em ambiente escolar é a melhor refeição que eles têm”, afirmou, notando que “muito deste trabalho foi feito em articulação com as autarquias e Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) de muitos concelhos”.
"Amanhã faremos melhor do que hoje"
Questionado sobre as declarações da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), que acusou hoje o Ministério da Educação de “alguma imprudência” na preparação da reabertura das escolas, Tiago Brandão Rodrigues afirma que o Governo conversa com a estrutura sindical “sempre que é necessário”. “Neste caso, os trabalhadores das nossas autoridades de saúde ainda não são as nossas organizações sindicais. As autoridades de saúde disseram-nos que era importante preencher um conjunto de requisitos que chegaram às escolas e as escolas fizeram aquilo que nós pedimos, aquilo que a Direcção-Geral de Saúde pedia e fizeram ainda mais. Tiveram as cautelas [necessárias], prepararam-se e, com muita humildade, os directores de escolas e os corpos docentes dizem ‘amanhã faremos melhor do que hoje e depois de amanhã faremos melhor do que amanhã’. No fundo, nós continuaremos a criar todas as condições para que o tal binómio segurança e confiança possa existir nas nossas escolas”, respondeu.
Um ministro da Educação “muito orgulhoso"
A entrevista terminou com Tiago Brandão Rodrigues a assumir-se como “um ministro da Educação muito orgulhoso”. Referindo que “existem questões relacionadas com a saúde mental dos jovens em situações muito complexas” e que muitos deles sofrem de ansiedade “porque sabem que vão ter também exames com tudo o que isso implica”, o governante garante que “era tempo, com todas as cautelas e coadjuvados pelas autoridades de saúde, de dar este passo”.
“Acho que temos que estar muito orgulhosos do nosso sistema educativo, em especial da escola pública, pela resposta de todos estes profissionais, pela resposta dos mais jovens da nossa sociedade que, de forma tão reiterada dizemos que são incautos, irresponsáveis e muitas vezes incapazes de levar a sua vida, e que hoje, mais uma vez, demonstraram que têm que ter a nossa confiança, o nosso apoio e que estão de parabéns.”