iLoF: usar a inteligência artificial para ter uma biblioteca de biomarcadores — e detectar células cancerosas
É como um arquivo de impressões digitais, mas de várias doenças. Depois de se focar no Alzheimer, a iLoF avançou para outras áreas e agora distingue e detecta células cancerosas, o que é fulcral para determinar qual o melhor tratamento.
A iLoF - Intelligent Lab on Fiber é uma base de dados virtual, albergando biomarcadores de diversas doenças. Semelhante a um arquivo de impressões digitais, a tecnologia permite “ter o perfil biológico do paciente com base numa simples amostra de sangue”, explica Luís Valente, director executivo da start-up que está a desenvolver o sistema.
Por trás do projecto está uma equipa de investigadores portugueses que tem despertado a curiosidade da comunidade científica: em Novembro, conseguiram cerca de 2 milhões de euros de capital de risco de um dos maiores grupos de saúde mundiais, o EIT Health; em Fevereiro, publicaram um artigo na Scientific Reports, uma revista científica da Nature; e, em Março, Luís e Joana Paiva, dois dos fundadores da empresa tecnológica, entraram para a lista 30 Under 30 Europe da revista Forbes, na categoria de Science and Healthcare. Mas em que consiste, então, esta tecnologia?
Na prática, faz uma “estratificação de pacientes, usando métodos não invasivos, baratos e acessíveis”, explica Luís Valente. “O que nós estamos a fazer é usar a inteligência artificial, uma técnica baseada em luz chamada fotónica, que nos permite criar uma biblioteca virtual dos tecidos biológicos dos pacientes.” Tal possibilita fazer testes rápidos a várias doenças e, posteriormente, “apoiar e acelerar a pesquisa de novos tratamentos para o Alzheimer”, bem como tornar essa investigação “muito mais conveniente e humana para o paciente”.
“Nós somos uma tecnologia de plataforma”, explica Luís. "Uma das coisas que fazemos é exactamente na área do Alzheimer, mas não só. Na área do cancro, inicialmente, começámos a fazer estratificação para diferentes tipos de cancro gástrico, cancro do estômago e do pâncreas e, no fundo, essa diferenciação das células cancerosas permite ao médico definir qual é o tratamento mais apropriado.” No artigo publicado na Scientific Reports, é dado o exemplo de “um tipo de cancro de estômago muito agressivo — que cria metástases rapidamente — e um tipo de cancro mais moderado” e da necessidade de se “conseguir diferenciar entre os dois” para determinar qual o melhor tratamento. A iLoF permite, “com 94% de precisão e de sensibilidade”, distinguir entre tipos de cancro e “garantir uma abordagem mais personalizada”.
De um doutoramento para uma start-up
Tudo isto surgiu de um projecto de investigação que envolveu o Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (Inesc Tec), o Instituto de Investigação e Inovação da Universidade do Porto (i3S), o Instituto de Biologia Molecular e Celular (IMBC) e a Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Este projecto, integrado no doutoramento da Joana Paiva, actual directora técnica da iLoF, acabou por evoluir para uma start-up, com origem no Inesc Tec (onde Luís trabalhava) e incubada na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Entretanto, juntaram-se à equipa Mehak Mumtaz, especialista em medicina personalizada da Universidade de Oxford, e Paula Sampaio, “cientista de carreira, coordenadora da infra-estrutura nacional de pesquisa de tecnologias baseadas em luz e investigadora sénior do IBMC e do i3S”.
Neste momento, a equipa tem dez pessoas a trabalhar a tempo inteiro. Luís Valente conta que estão “a trabalhar com alguns hospitais e grupos farmacêuticos de nível mundial para levar esta tecnologia para o mercado”. O objectivo é, claro, que a iLoF possa estar ao serviço de todos os doentes. “Ficamos muito contentes porque todo o trabalho que estamos a fazer já começa a ser reconhecido. E isso significa que há alguma validação no impacto que esta tecnologia está a ter nos pacientes.” Apesar do sucesso, o director executivo diz que querem ir “muito mais longe” — esperam “ter esta tecnologia ao serviço de milhares de pacientes nos próximos anos”.