Avistamento de águia-imperial-ibérica aumenta esperança de regresso da espécie a Trás-os-Montes
Câmaras da associação Palombar registaram a presença de um elemento jovem em Mogadouro a 30 de Abril. Registo anterior na região tinha sido feito em 2018. É uma das aves de rapina mais ameaçadas da Europa, estando igualmente entre as mais raras a nível mundial.
É uma espécie rara, ameaçada, e desde o início dos anos 1980 que deixou de ser vista em território nacional. Entretanto, regressou, de forma tímida, à região da Beira Baixa, na área do Tejo Internacional, mas não ao Norte do país. Agora, dois avistamentos nos anos mais recentes aumentam a esperança de que, a médio prazo, a águia-imperial-ibérica regresse a Trás-os-Montes.
Foi no dia 30 de Abril que a Palombar - Conservação da Natureza e do Património Rural conseguiu o registo mais recente de uma águia-imperial-ibérica. O animal, ainda jovem, foi captado pelas câmaras de foto-armadilhagem montadas num dos campos de alimentação para aves necrófagas (CAAN) que a organização gere em Mogadouro. O registo anterior tinha sido feito a 4 de Setembro de 2018, também de um juvenil e também num CAAN, mas em Miranda do Douro.
Os dois registos levam alguma esperança aos elementos da associação, como refere José Pereira, presidente da Palombar. “É normal haver dispersão de indivíduos imaturos para vários pontos da região. O que nos leva a crer que possa estar a regressar a Trás-os-Montes, a médio prazo, é o facto de esta ser uma área com presença histórica da espécie - há 100, 50 anos - e de começar a haver alguns registos. A população tem vindo a expandir-se na sua área de distribuição mais marginal e já perto de Zamora, em Espanha, há um casal nidificante”, diz.
Para que o regresso fosse efectivamente uma realidade, explica, teria de existir na região pelo menos um casal nidificante e, por enquanto, não há qualquer registo dessa presença. Mas o facto de já haver registo de alguns desses casais em Portugal - a espécie apenas nidifica em território nacional e em Espanha, sendo endémica da Península Ibérica - e de, aparentemente, haver uma maior dispersão da espécie dos dois lados da fronteira, deixa algum optimismo entre os ambientalistas.
Mas muito cauteloso, já que esta continua a ser “uma das aves de rapina mais ameaçadas da Europa, estando igualmente entre as mais raras a nível mundial”, refere a Palombar em comunicado. Por cá, o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal regista a espécie como estando “criticamente em perigo”, enquanto o indicador similar em Espanha a coloca “em perigo”. Na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza, a águia-imperial-ibérica é classificada como “vulnerável”.
Depois de desaparecer do território nacional no final da década de 1970, início dos anos 1980, a presença da espécie só voltou a ser confirmada em Portugal em 2003. Em 2018, havia registo de 17 casais nidificantes nas regiões da Beira Baixa, Alto Alentejo e Baixo Alentejo. Em Espanha, dados do ano passado apontam para a existência, entre outros, de três casais reprodutores na província de Salamanca e um na de Zamora, zonas muito próximas de Trás-os-Montes.
Nenhum destes dados indica que a continuidade da espécie esteja fora de perigo, alerta a Palombar no seu comunicado desta quarta-feira: “O tamanho da população reprodutora é tão reduzido que existe um elevado risco de extinção da espécie face ao aparecimento, por exemplo, de uma doença, por redução significativa da população devido a alta mortalidade e períodos consecutivos de baixa produtividade e/ou por deterioração genética”.
Vários factores contribuíram para o desaparecimento temporário da espécie - o declínio da população do coelho-bravo, a sua fonte principal de alimento, a utilização de venenos, electrocussão causada pelas linhas eléctricas e a degradação generalizada do seu habitat, entre outras - e outros tantos estão a contribuir para que a situação tenha vindo a melhorar aos poucos. “Há todo um conjunto abrangente de acção que se vão fazendo e que acabam por beneficiar a espécie e, se calhar, é por isso que está a acontecer um caso como este”, diz José Pereira.
E há muito mais para fazer. “É preciso ir melhorando o que são as espécies presas, como o coelho-bravo, que tem assistido a um declínio da população ao longo dos anos, sobretudo fruto de doenças. E este é um trabalho que tem de ser desenvolvido por várias entidades. Há também que aumentar outros recursos, porque estas aves também têm hábitos necrófagos, alimentam-se muito de cadáveres e carcaças mortas e desde a crise das vacas loucas que houve uma redução muito grande de carcaças de gado que ficam nos campos”, exemplifica. Não será, assim, por acaso, que os dois registos da águia-imperial-ibérica em Trás-os-Montes tenham sido precisamente em campos de alimentação, onde o alimento está garantido.
A águia-imperial-ibérica nidifica em árvores de grande porte, como pinheiros, sobreiros ou eucaliptos. Os casais costumam manter-se no seu território ao longo de todo o ano, mas os elementos mais jovens da espécie movimentam-se por áreas mais vastas, onde houver alimento, até se fixarem no local onde se irão reproduzir. Em Trás-os-Montes espera-se que, um dia destes, a escolha recaia naquela região.