Quatro WhatsApp, cinco emails, três SMS… assim começa mais um dia
Testemunho de Lincoln Justo da Silva, pediatra. “Não há meios técnicos de comunicação que substituam a força da presença silenciosa e solidária, a palavra oportuna, a serenidade transmitida pelo calor das mãos e pelo aconchego do abraço.”
A covid-19 toma quase tudo e todos. No entanto, para lá do coronavírus, existe um rio de vida que continua a correr… alegrias, tristezas, inquietações, partilhas. A vida lá fora pulsa e flui, exigindo de nós o compromisso que assumimos perante a profissão que escolhemos. Porém, o vírus obriga a que encerremos portas impedindo a proximidade com crianças e pais em necessidade.
Se muitas das solicitações se resumem a dias mais ou menos caóticos, mas de histórias felizes com crianças e pais confinados em pequenos espaços e dificuldades de convívio, casos existem onde a impossibilidade do encontro confronta-nos com a vulnerabilidade e impotência perante a ameaça de uma minúscula partícula de RNA envolvida numa camada de gordura…
Como fazer, perante o apelo de pais ansiosos com a dificuldade de lidar com crianças pequenas em espaços muito limitados? Como fazer para responder ao grito de pais assolados pela notícia de uma doença inesperada e grave, uma anomalia num bebé que todos aguardavam, são e escorreito?
As famílias em sofrimento, em especial aquelas que se confrontam com o final de vida de um ente querido, encontram-se entre as mais vulneráveis e às quais se deve todo o cuidado nos mais diversos aspectos. Tudo a acontecer no meio da obrigação do confinamento e distância social.
Os profissionais de saúde têm um papel determinante não apenas no alívio dos sintomas, mas também na presença, na escuta, na partilha dos silêncios. Não há meios técnicos de comunicação que substituam a força da presença silenciosa e solidária, a palavra oportuna, a serenidade transmitida pelo calor das mãos e pelo aconchego do abraço. Mas nada disso é possível e tudo isto é tão premente, nestes tempos de incerteza, solidão e dor.
A covid-19 e toda a dinâmica em seu redor escondeu um mar de situações que, como um incêndio, continuou a evoluir impondo um regime de quase terror pela ameaça de morte para crianças e adultos.
Esperemos que “a rampa descendente”, de que nos fala a senhora diretora-geral da Saúde, nos permita, em breve, retomar a atividade junto de quem necessita da nossa voz, da nossa sabedoria, da nossa mão.