O meu problema com Bernard Lazare
Esta é a quarta conversa da nossa quinta memória, dedicada ao ódio.
O meu problema com Bernard Lazare é que não consigo fazê-lo caber num episódio, nem provavelmente numa memória inteira, nem sequer num livro. Para isso, devo confessá-lo já, o melhor é lerem uma das biografias que lhe foram consagradas, ou por Jean-Cristophe Bredin — que vamos aqui seguir em traços largos — ou por Phillippe Oriol. Mas mesmo depois de tirar uns dias para poder esquecer-me do excesso de leituras sobre ele, para poder resumi-lo ao essencial aqui, eu não consigo pôr Bernard Lazare num só episódio, agora que começamos a aproximar-nos do fim, não tenho outra hipótese senão enfiá-lo mais ou menos à força num episódio apenas.
Em princípio isto não deveria acontecer. Bernard Lazare é o mais lado B de todos os meus lados B. Mais lado B do que isto, e passa-se ao lado A dos lados Bs. Bernard Lazare não é o mais conhecido dos defensores de Alfred Dreyfus — esse lugar será ocupado eternamente por Émile Zola, que foi posto no Panteão também por isso. Não é o mais importante dos sionistas — esse é Theodor Herzl. Não é sequer o mais conhecido dos anarquistas, onde é difícil encontrá-lo sob uma floresta de gente mais relevante, de Proudhon a Bakunine e de Kropotkine a Réclus. Não é o simboliza mais importante — isso poderia ser Mallarmé ou Apollinaire. Não é sequer o judeu anarquista mais importante, ou o anarquista judeu, e aqui a escolha é grande, de Emma Goldman a Noam Chomsky.
Mas Bernard Lazare foi o primeiro a defender Alfred Dreyfus, num manuscrito para uma brochura que terminava como uma praga por uma litania de “acuso”! Sim, foi Bernard Lazare e não Zola a inventar aquele encantamento acusatório, mas foi Zola a ficar famoso por isso. Bernard Lazare foi o primeiro em várias coisas, mas em geral não ficou conhecido por elas. Em polémica com Edouard Drumont, 70 anos do inimaginável assassinato em massa dos judeus europeus no Holocausto, Bernard Lazare parece ser dos primeiros a pressentir a que levará o anti-semitismo francês do fim do século XIX.
Esta é a quarta conversa da nossa quinta memória, dedicada ao ódio.
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