Bruxelas prolonga namoro com os Balcãs, ainda sem falar em casamento
Por causa da pandemia de coronavírus, a cimeira entre a UE e os seis países balcânicos candidatos à adesão servirá mais para marcar calendário do que para fazer avançar o processo de alargamento.
Pode dizer-se que qualquer semelhança entre a segunda cimeira entre a União Europeia e os países dos Balcãs Ocidentais que foi planeada antes da crise do coronavírus, e o encontro informal por video-conferência que vai realizar-se esta quarta-feira, será uma mera coincidência. Com os líderes forçados a permanecer nas respectivas capitais, e o combate à pandemia a sobrepor-se a todos os outros temas na agenda política europeia, não se esperam decisões nem novidades, para além da repetição dos habituais compromissos de que o futuro da região passa por Bruxelas.
Vai haver na mesma um documento conjunto, que ficará nos registos como a “declaração de Zagreb”, onde os 27 chefes de Estado e governo da UE, e os líderes dos seis países balcânicos candidatos à entrada no clube (Albânia, Bósnia-Herzegovina, Kosovo, Macedónia do Norte, Montenegro e Sérvia), referem a “importância da nova fase de cooperação estratégica”, não só para “responder ao significativo impacto sócio-económico da crise da covid-19”, mas também para lidar com os desafios regionais e globais, em termos de alinhamento estratégico e política de segurança.
Mas ao contrário do que aconteceu na primeira cimeira em Sófia, na Bulgária, em Maio de 2018, não haverá um jantar de gala, para contactos mais descontraídos entre os líderes, nem a tradicional foto de família, para assinalar oficialmente a ocasião — que além de ser o ponto alto da presidência croata do Conselho da União Europeia, pretendia ser também uma oportunidade para dar um novo impulso ao processo de alargamento, depois do trauma do “Brexit” e do difícil acordo para o arranque das negociações para a adesão da Macedónia do Norte e da Albânia (que podem prolongar-se durante anos).
Mais uma vez, as expectativas da região ficarão frustradas: a palavra alargamento nem sequer aparece mencionada em nenhum dos documentos oficiais, “uma vez que o processo de estabilização não faz parte da agenda desta cimeira”, como justificou fonte europeia. Segundo um veterano correspondente da região, a omissão é inexplicável. “É como dois namorados não quererem falar de sexo ou casamento”, comparava.
Na véspera do encontro, vários responsáveis apontavam para calendário normal de trabalho, e particularmente para as reuniões do Conselho de Assuntos Gerais, para argumentar que “o processo não está parado” e que o debate político com vista ao alargamento, “agora com uma nova metodologia”, segue o seu curso dentro das instituições.
E mais veementemente, chamavam a atenção para a aprovação por Bruxelas de um pacote de assistência financeira de 3,3 mil milhões de euros para o combate ao coronavírus nos países parceiros do alargamento, como uma “materialização do espírito e da essência da sua ligação aos Balcãs Ocidentais”. “Trata-se de uma realização concreta, que confirma um inequívoco apoio à perspectiva europeia da região e à sua escolha estratégica”, apontavam, num contraponto à pressão que tem vindo a ser exercida pela Rússia e a China para alargar a sua área de influência.
“O facto é que este nível de apoio e cooperação vai muito mais além do que qualquer outro parceiro forneceu à região, o que é digno de reconhecimento público”, traduz o rascunho do comunicado final. A mensagem de Bruxelas que a cimeira pretende reforçar é que apesar dos investimentos e promessas vindas de Moscovo e Pequim (ou ainda de Ancara e até de Ryad) , “a UE é e continuará a ser o parceiro número um para a região e para cada país”, assinalava fonte diplomática.
“A ligação geográfica e o valor acrescentado da UE são elementos objectivos e poderosos. Pode discutir-se muito sobre o que Bruxelas pode fazer mais, mas a verdade é que não há nenhum parceiro mais sólido e previsível. A UE é a única alternativa credível”, considerava.
De acordo com fontes ligadas à preparação da cimeira, no actual contexto de pandemia de coronavírus, os problemas de comunicação com os países dos Balcãs têm-se acentuado, e a UE tem detectado novas tentativas de interferência política, sob a forma de “campanhas maciças de desinformação” e disseminação de informações falsas. Por isso, também se espera que os diferentes responsáveis políticos acertem entre si um novo tom para a mensagem a passar às respectivas opiniões públicas. “Existe uma forte necessidade de contrariar publicamente as tentativas para representar negativamente as acções e a amizade de Bruxelas”, consideram no Conselho.