Portugal sem casos de crianças com reacção inflamatória rara

Graças Freitas afirmou que os pediatras portugueses têm conhecimento dos alertas e estão a acompanhar a situação de crianças que têm reacções inflamatórias raras que podem estar associadas à covid-19. Há casos diagnosticados em Itália, Reino Unido, França, Espanha e EUA.

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Graça Freitas garantiu que as autoridades portuguesas têm conhecimento da situação LUSA/JOÃO RELVAS

As autoridades de saúde portuguesas não identificaram, até à data, nenhum caso de reacções inflamatórias raras em crianças, possivelmente relacionadas com a covid-19, garantiu esta quarta-feira a directora-geral da Saúde, Graça Freitas. 

Casos deste tipo têm sido identificados em países como o Reino Unido, Itália e Espanha. Graça Freitas garantiu, na conferência de imprensa diária da Direcção-Geral da Saúde, que os pediatras portugueses estão atentos e que “têm estado a acompanhar essa situação”.

“As crianças que têm sido acompanhadas na pediatria até à data têm tido uma evolução muito favorável da sua condição clínica. Os pediatras acompanham, estamos atentos, mas até à data não houve reporte em Portugal”, explicou.

Nas últimas semanas, associações de pediatria do Reino Unido, da Itália e de Espanha pediram aos médicos para estarem atentos a crianças que apresentem uma condição inflamatória rara porque a doença pode estar ligada ao novo coronavírus, que causa a doença covid-19.

O primeiro alerta para esta situação partiu, no início da semana, da Associação de Pediatras de Cuidados Intensivos do Reino Unido, mas foi, entretanto, secundado pela Associação Espanhola de Pediatria e pela Sociedade Italiana de Pediatras. Médicos dos Estados Unidos e França dizem também estar a investigar casos da doença.

Segundo as autoridades do Reino Unido, “nas últimas três semanas houve um aumento aparente, em Londres e também em outras regiões do Reino Unido, do número de crianças de todas as idades com um estado inflamatório multissistémico que requer cuidados intensivos”.

Os hospitais ingleses relataram alguns casos que apresentavam características da Síndrome do Choque Tóxico ou da Doença de Kawasaki, um distúrbio raro dos vasos sanguíneos. Destes casos, apenas algumas crianças tiveram resultado positivo para covid-19, portanto, os cientistas não têm certeza se esses sintomas raros são causados pelo novo coronavírus ou por outra coisa.

Entretanto, a Associação Espanhola de Pediatria emitiu um aviso semelhante, alertando os pediatras de que, nas últimas semanas, houve várias crianças em idade escolar que apresentaram “um quadro invulgar de dores abdominais, acompanhadas de problemas gastrointestinais” que podem levar, em poucas horas, a um choque, com queda da pressão arterial e problemas cardíacos.

Também os pediatras italianos foram avisados da mesma preocupação pela Sociedade Italiana de Pediatria. Os sintomas da Doença de Kawasaki incluem febre alta que dura cinco dias ou mais, erupções cutâneas e glândulas inchadas no pescoço.

Casos nos Estados Unidos e em França

Esta quarta-feira, em conferência de imprensa, Maria Van Kerkhove, epidemiologista da Organização Mundial de Saúde, disse que existem algumas descrições destes casos na Europa, mas realçou que “parecem ser muito raros” e detectados apenas em “um ou dois países”.

“Sabemos que até agora, e no que diz respeito a esta doença [covid-19] nas crianças, é que elas tendem a ter sintomas muito moderados, mas há registo de crianças que têm sintomas fortes e até de algumas mortes nesta faixa etária. Existem algumas descrições raras recentes em alguns países europeus que tiveram essa síndrome inflamatória, que é semelhante à Doença de Kawasaki, mas é muito raro. O que pedimos é que a rede global de médicos esteja alerta e garanta que recolhe informações para que possamos entender melhor o que está a acontecer com estas crianças, para que possamos melhorar também os nossos tratamentos”, referiu Van Kerkhove, garantindo que existem profissionais a analisar esta questão em particular.

O director executivo do programa de emergência da OMS, Michael Ryan, afirmou que os clínicos têm registado em crianças com covid-19 “uma forma atípica de síndrome de Kawasaki”, uma doença rara que se manifesta num “processo inflamatório nos vasos sanguíneos”. Michael Ryan indicou que poderá ser, tal como se tem assistido em casos de covid-19 em adultos, o novo coronavírus a “atacar outros tecidos além do pulmonar”.

“Estamos numa fase em que os médicos estão a estudar quais são os outros efeitos desta infecção. É algo que vimos em muitas doenças emergentes, que atacam mais do que um tipo de tecidos e podem afectar vários órgãos”, indicou.

O epidemiologista irlandês afirmou que é muito importante que os pediatras e outros médicos continuem a registar e a comunicar estes sintomas, quando acontecem, e recomendou aos pais que “vigiem sempre o agravamento de sintomas em crianças com doenças infecciosas”.

Também esta quarta-feira, e segundo o The Guardian, o ministro da Saúde francês, Olivier Veran, disse que o país tem mais de doze casos confirmados de crianças com inflamações no coração. Embora não existam evidências suficientes para provar a ligação com o novo coronavírus, Veran disse que os casos estão a ser levados “muito a sério”.

De acordo com a Reuters, três crianças norte-americanas infectadas com o novo coronavírus também estão a ser tratadas por uma síndrome inflamatória rara que parece semelhante à que está a preocupar os médicos britânicos, franceses, italianos e espanhóis. Todas as crianças — com idades compreendidas entre seis meses e os oito anos — estão a ser tratadas no Centro Médico da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, e apresentam febre e inflamações no coração e no intestino.

Os três casos registados em Nova Iorque somam-se a um registado no Estado da Califórnia: uma criança de seis meses foi internada com a doença de Kawasaki e, mais tarde, foi diagnosticada com covid-19.

Até agora, as crianças estão entre o grupo menos afectado pelo coronavírus. Dados de mais de 75 mil casos na China mostraram que os mais novos representavam 2,4% de todos os casos e apresentavam apenas sintomas leves. Em Portugal, os casos confirmados em menores de 19 anos representam apenas 4,6% do total e não há registo de vítimas mortais. “A quantidade de crianças que precisa de internamento é pequena. Todas, até aqui, tiveram alta”, revelou ao PÚBLICO Maria João Brito, coordenadora do serviço de infecciologia do Hospital Dona Estefânia, em Lisboa, numa entrevista publicada na segunda-feira.

Portugal regista 973 mortos associados à covid-19, mais 25 do que na terça-feira, e 24.505 infectados (mais 183), segundo a DGS.