Administradores hospitalares estimam quebra de 60% a 70% nas cirurgias programadas
Impacto estimado pelo presidente da Associação dos Administradores Hospitalares de 16 de Março até agora. Hospitais preparam regresso faseado das operações e consultas não urgentes que ficaram suspensas por causa da pandemia.
O presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH) estima que tenha havido, de 16 de Março até agora, na “grande maioria dos hospitais, uma quebra da actividade programada nas cirurgias na ordem dos 60% a 70%, já que foram praticamente todas canceladas ou reagendadas, à excepção das urgentes e muito urgentes”. Alexandre Lourenço estima ainda que, no mesmo período, se tenha registado “uma quebra nas consultas externas entre os 50% e os 60%” pela mesma razão.
Esta quinta-feira, na conferência de imprensa, o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, afirmou que o Ministério da Saúde está “a fazer um plano de recuperação” da actividade suspensa. E repetiu o balanço do impacto feito no sábado, comparando dados do primeiro trimestre deste ano com o mesmo período de 2019: menos 6,6% de consultas nos centros de saúde, menos 5,7% de consultas nos hospitais e uma redução de 5,3% nas cirurgias. Em suma: cerca de 500 mil consultas e 9 mil cirurgias não urgentes a menos.
Alexandre Lourenço faz uma outra estimativa: a realização de cerca de menos 20 mil cirurgias comparando a actividade de Março deste ano com a do mesmo mês de 2019. “É necessária uma coordenação muito efectiva da rede e planear com muito cuidado a próxima etapa no sector hospitalar”, afirma o presidente da APAH. A começar por garantir que todos os hospitais têm meios para retomar a actividade não urgente. “Temos de fazer uma utilização universal de meios de protecção individual e também de ter capacidade de fazer testes aos doentes de forma regular”, defende.
Fundamental, insiste Alexandre Lourenço, é também definir o que é a rede covid-19 em Portugal. “É evidente que em todas as urgências temos de continuar a ter áreas de triagem e em todos os hospitais áreas tampão para testar doentes. Mas não precisam todos de ter internamento”, sugere, permitindo assim libertar hospitais para a restante actividade. Sugere igualmente que este reinício faseado possa “começar por áreas menos afectadas pela pandemia, como a pediatria”.
Outra solução, é “acelerar a constituição de centros de responsabilidade integrados, que podem promover maior actividade e vir a resolver as listas de espera que se começaram a avolumar”. Assim como, continuar a apostar na telemedicina, que permitiu a muitos hospitais manter uma parte das consultas que estavam programadas. Já quanto aos profissionais, considera que poderão não ser suficientes para garantir uma resposta simultânea ao covid-19 e recuperar a actividade. Esta semana, António Lacerda Sales disse que foram contratados “mais de 1800 profissionais” no âmbito da covid-19, mas não esclareceu se estes contratos serão renovados.
Primeiros passos
No Centro Hospitalar Lisboa Norte, que inclui os hospitais Santa Maria e Pulido Valente, “a primeira fase da retoma começou esta semana”. Todo o processo será feito de forma muito faseada. “Vamos começar a agendar e a intervir nos doentes que identificámos que tinham uma situação clínica cuja evolução, se continuasse a ser adiada, iria tornar-se urgente ou pôr em risco a vida ou o estado global do doente”, explica o director clínico Luís Pinheiro.
“Fizemos o levantamento de todos os planos cirúrgicos que existiam e temos cerca de 200 doentes que idealmente até fim do mês, início de Maio, irão ser intervencionados”, diz. O centro hospitalar, que tem “capacidade para realizar cerca de 400 testes diários”, definiu que todos os doentes internados e todos os que venham a ser operados ou a fazer intervenções invasivas serão testados.
Apesar das limitações que a pandemia impôs, “estamos a fazer cerca de 600 consultas presenciais e mil consultas não presenciais por dia”. “Um volume significativo”, mas menos que o habitual. “Estamos a fazer cerca de metade a dois terços do volume habitual das consultas”, disse Luís Pinheiro, referindo que vão retomar as consultas presenciais, reorganizando espaços e dando maior intervalo entre marcações. “Iremos distribuí-las por todos os espaços de consulta no Santa Maria e no Pulido Valente”, para onde já deslocalizaram consultas e hospitais de dia.
Também no Centro Hospitalar Lisboa Central (CHLC), onde se inclui o Hospital São José, prepara-se a nova fase. “Já foram dadas orientações aos responsáveis das áreas, que estão a avaliar e planear de forma cuidadosa e gradual o reinício das actividades assistenciais à globalidade dos nossos doentes”. “A manutenção da teleconsulta, sempre que aplicável, o aumento do agendamento de consultas presenciais respeitando as cargas máximas permitidas e recomendadas nas salas de espera e consultórios”, e uma “rigorosa separação” de circuitos “são alguns dos princípios que estão a nortear o plano de retoma da actividade”.
Durante esta fase, garantiram resposta às situações urgentes, prioritárias e muito prioritárias e privilegiaram a telemedicina. “Entre 9 de Março e 11 de Abril realizaram-se cerca de 2000 cirurgias” e desde o dia 9 do mês passado “foram realizadas mais de 32.290 consultas sem a presença física do doente”, perto de 7 mil das quais na semana passada. Por outro lado, muitos utentes “faltaram aos exames e às consultas presenciais mantidas em agenda”. Entre 9 de Março e 11 de Abril, cardiologia, estomatologia e cirurgia maxilo-facial “tiveram uma taxa de absentismo acima dos 30%”, exemplifica o CHLC.
No Centro Hospitalar Lisboa Ocidental (a que pertence o Hospital São Francisco Xavier), realizaram-se primeiras consultas muito prioritárias e para “grande parte” das consultas de seguimento, a opção foi a teleconsulta. “A cirurgia programada foi, de um modo geral, diminuída fortemente”, diz o centro hospitalar, que salienta que “cirurgias oncológicas e muito prioritárias foram realizadas”. A actividade programada “será retomada com os necessários cuidados”, diz o centro hospitalar, que espera recuperar em breve as consultas adiadas e “até ao fim do Verão” as cirurgias.