Autoridade de Saúde diz que Lar do Comércio não cumpria normas e vai fazer nova vistoria

Se autoridade de saúde identificar necessidade de retirar alguns idosos do Lar do Comércio, Câmara de Matosinhos está disponível para os receber no hospital de campanha. Nova vistoria acontece esta quinta-feira.

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Lar do Comércio tem 240 residentes Paulo Pimenta

O Lar do Comércio, em Matosinhos, onde já morreram pelo menos três pessoas e há 26 infectados confirmados com o novo coronavírus, vai ter nova vistoria já esta quinta-feira para avaliar se as normas de segurança e mitigação da doença estão a ser cumpridas.

A informação foi dada à agência Lusa pelo delegado de saúde de Matosinhos, Jaime Baptista, que já antes visitou o lar onde residem cerca de 240 idosos. Os testes ao SARS-CoV-2 estão a ser feitos a todos os residentes e trabalhadores e, segundo informava a Câmara de Matosinhos esta terça-feira, esse rastreio deveria estar concluído durante o dia de quarta-feira. Os resultados finais, no entanto, continuam a não ser revelados.

Se a Autoridade de Saúde local concluir ser necessário transferir alguns dos utentes para o hospital de campanha criado pela Câmara de Matosinhos, a autarquia estará disponível para ceder o espaço, garantiu ao PÚBLICO o executivo de Luísa Salgueiro. O hospital foi criado em articulação com a Unidade Local de Saúde, numa unidade de alojamento arrendada para esse efeito.

Vários familiares dos utentes juntaram-se em frente ao lar esta terça-feira, acusando a instituição de sonegar informação e impedir contactos com os idosos. Há quem não consiga contactar os familiares há várias semanas e não saiba sequer se estão infectados com covid-19 ou não. As acusações de negligência multiplicaram-se. Num comunicado publicado no Facebook, o Lar do Comércio recusou todas as acusações, atribuindo a dificuldade de comunicação ao excesso de trabalho e falta de pessoal.

A Administração Regional de Saúde do Norte (ARS-N) confirma a realização destes testes e sublinhou que o lar de Matosinhos tem “instalações que permitem a separação em segurança de residentes positivos e/ou sintomáticos dos restantes assintomáticos ou negativos”.

No entanto, esta terça-feira, uma trabalhadora do lar garantia ao PÚBLICO que essa separação não estava a ser cumprida, havendo doentes com testes positivos e utentes saudáveis a partilhar os mesmos espaços. Além disso, relatou, os trabalhadores circulavam entre quartos e enfermaria, sem nunca trocar de equipamento de protecção. Esse equipamento, aliás, começou por nem ser usado por auxiliares, enfermeiros e outros trabalhadores – alguns levavam as suas próprias máscaras, mas a instituição não as fornecia, apesar de a Câmara de Matosinhos ter feito uma doação ao lar, garantiu uma trabalhadora que pediu para não ser identificado por temer represálias.

A ARS-N confirma que a anterior vistoria da Autoridade de Saúde verificou a “existência de insuficiência e inadequação de alguns procedimentos e práticas relativamente ao controlo de infecção”. Em consequência, foram “recomendadas propostas correctivas”, acrescenta, estando a “Autoridade de Saúde em articulação com a referida instituição”.

Jaime Baptista admitiu que as normas da Autoridade de Saúde não estavam a ser cumpridas pela instituição. Ao Jornal de Notícias, o delegado de saúde divulgou que no passado sábado a enfermeira que realizou testes dentro do lar observar não haver separação de utentes com e sem sintomas nos quartos, acontecendo o mesmo na sala de convívio, tal como a trabalhadora do lar havia relatado ao PÚBLICO.

A mesma enfermeira terá confirmado ao delegado de saúde que os equipamentos de protecção individual não estavam a ser correctamente utilizados, não havendo mudança de luvas pelos profissionais de utente para utente.

A instituição, criada em 1936, é presidida por José Costa Moura e tem como presidente da assembleia-geral Artur Penedos, ex-assessor de José Sócrates, militante socialista de longa data e candidato à Câmara de Paredes por duas vezes. Neste momento, estão abertas três acções judiciais particulares contra o Lar do Comércio. Mas as suspeitas à volta da instituição são inúmeras.

Em 2019, uma queixa da Ordem dos Enfermeiros, relatando as condições precárias do lar, levaram a Segurança Social a visitar o espaço. O relatório confirmava problemas e as queixas acabaram no Ministério Público. O Instituto de Segurança Social investigava o lar, no final do ano transacto, por suspeitas de “pagamento como critério de admissão de utentes” e de “vantagem patrimonial indevida”, noticiou, na altura, o Jornal de Notícias. O PÚBLICO questionou a Segurança Social sobre estes processos e os actuais problemas, mas não obteve informação.

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